Logo R7.com
Logo do PlayPlus
Cosme Rímoli - Blogs

Esqueça Edson. Reverencie Pelé. Ele é o rei eterno do futebol. Messi, Maradona, Cristiano Ronaldo, ninguém chegou aos seus pés

O único jogador a ganhar três Copas do Mundo. Ele acabou com o 'complexo de vira-lata' que dominava o futebol brasileiro. 1.283 gols. Ninguém mostrou tanto talento para o futebol como ele. Esqueça os erros de Edson

Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli


Pelé com a coroa e o cetro. Merecidos. Ninguém mais mereceu ser chamado de rei como ele
Pelé com a coroa e o cetro. Merecidos. Ninguém mais mereceu ser chamado de rei como ele

São Paulo, Brasil

"O Hospital Israelita Albert Einstein confirma, com pesar, o falecimento de Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, no dia de hoje, 29 de dezembro de 2022, às 15h27, em decorrência da falência de múltiplos órgãos, resultado da progressão do câncer de cólon associado à sua condição clínica prévia.

"O Hospital Israelita Albert Einstein se solidariza com a família e todos que sofrem com a perda do nosso querido Rei do Futebol."

Acabou o sofrimento, a agonia.


Às 15h30 deste dia 29 de dezembro de 2022, chegou às mãos dos dezenas de jornalistas que faziam plantão no Hospital Albert Einsten a notícia que todos temiam.

Aos 82 anos, morreu Edson Arantes do Nascimento, cercado da família.


Mas, como ele mesmo dizia, Edson era um, e Pelé, outro.

E Pelé, o melhor jogador de futebol de todos os tempos, não morrerá jamais, repetem portais, televisões, rádios, as redes sociais.


Mas, muito além do clichê, o mito Pelé é muito maior.

Porque seu talento extraordinário como jogador fez com que o Brasil fosse conhecido e respeitado no mundo. Tornou este país, longe da Europa e dos Estados Unidos, reino de um esporte nascido na Inglaterra.

E ele, mineiro da pequena Três Corações, majestade.

Pelé reverteu a geografia do futebol do planeta.

O Brasil colecionava fracassos desde 1930, quando a Copa do Mundo passou a ser disputada. O mais doloroso, para os brasileiros, foi em 1950. O Brasil perdeu a Copa do Mundo em pleno Maracanã, por 2 a 1.

Menino, ouvindo a partida no rádio, o menino Edson viu uma cena inédita na sua vida. Seu pai, Dondinho, chorando.

Ele jurou ao pai que compensaria suas lágrimas. E conquistaria a Copa do Mundo para o Brasil. Dondinho pensou que fosse "coisa de criança". Abraçou Dico, que era o apelido do filho Edson, e acreditou que a vida seguiria.

Mas nem o pai sabia a criatura que havia colocado no mundo.

A criatura nasceu para jogar futebol.

1m73, ambidestro, excelente cabeceador, driblador, visão única da movimentação do ataque, gelado diante dos zagueiros e goleiros adversários. Insaciável no prazer de estufar os gols. 1.283 ainda foram poucos.

A biomecânica e a fisiologia explicam que seu potencial muscular e o centro de gravidade do seu corpo foram moldados para o esporte, que exige velocidade, arranques, mudanças de direção para os dribles, impulsão, força, talento para antever as jogadas e para bater na bola com precisão, misturando força, direção e efeito.

"Pelé foi fabuloso. Sorte 'de vocês' que ele escolheu o Brasil para nascer", me disse Diego Maradona, durante a Copa de 1994.

Seu talento impressionante o levou ao Santos, com 15 anos. Bastaram sete partidas no time de base do Santos, e sete gols, para ser levado ao profissional.

A pedido do embasbacado treinador Lula.

Ele foi o dínamo que impulsionou uma geração incrível e que mudou o patamar do clube do litoral. A ponto de conquistar dois Mundiais. Se os dirigentes da década de 60 não pensassem só no dinheiro das excursões com Pelé, o Santos teria acumulado muito mais Libertadores e Mundiais. O que foi um enorme desperdício.

"Nós tínhamos uma excelente geração. Mas chegou um extraterrestre chamado Pelé que transformou nosso time em uma máquina de conquistas. Ele conseguiu fazer com que cada um de nós, Zito, Mengálvio, Coutinho, eu, todos os jogadores que estavam no Santos, fosse além do que poderíamos jogar. Pelé tinha um nível que era fora do comum. Mudou a história do Santos e da seleção brasileira", me resumiu Pepe, em 2014.

A carreira de Pelé parece um conto de fadas. Aos 15 anos, ele desembarcou na Vila Belmiro e logo se impôs. Seu talento era tanto que Paulo Machado de Carvalho, chefe da delegação que levou o Brasil à Copa do Mundo da Suécia, em 1958, fez com que Vicente Feola tivesse coragem. E convocasse o menino de 17 anos.

O jogador havia se destacado na disputa da Copa Roca, como era chamado o enfrentamento com os argentinos em duas partidas. Pelé só foi convocado porque clubes importantes excursionavam e o treinador Silvio Pirillo decidiu chamar os atletas que estavam no Brasil.

E Pelé brilhou na Suécia. Imortalizou o número 10 por puro acaso. O país não havia mandado à Fifa os números que corresponderiam aos seus jogadores durante a Copa. E a Fifa se encarregou disso. E, aleatoriamente, ele ganhou a 10.

Pelé chora de alegria, campeão do mundo, aos 17 anos. Protagonista. Nunca houve ninguém igual
Pelé chora de alegria, campeão do mundo, aos 17 anos. Protagonista. Nunca houve ninguém igual

Depois de duas partidas na reserva, mesmo arrasando nos treinos, só foi titular por conta de um motim. Bellini, Nilton Santos e Didi trataram de exigir que Feola o escalasse, até porque o Brasil precisava ganhar para seguir jogando a Copa. Pelé entrou para só deixar a seleção quando ele quis, em 1970. 

Pelé foi fundamental para que o Brasil perdesse o "complexo de vira-lata", batizado por Nelson Rodrigues. O teatrólogo adorava escrever sobre futebol e comentar o esporte. E dizia que o Brasil jamais ganharia uma Copa porque os jogadores tinham complexo de inferioridade quando enfrentavam os europeus, os "imperialistas", os "conquistadores do mundo", como se referia.

Mas Pelé não só calou Nelson Rodrigues mas ganhou a coroa de Rei do Futebol, dada pelos franceses.

O camisa 10 da seleção marcou três gols na semifinal contra os franceses, na vitória por 5 a 2. O jogador de 17 anos ganhou o apelido de Rei pela revista France Football. A consagração do título, contra a Suécia, dona da casa, provocou pranto de alegria.

O Brasil passou a ser levado a sério no cenário mundial do futebol. 

Pelé incensado, com justiça, a melhor jogador do planeta.

Pelé, alucinado para fazer gols, encontrou no maior driblador de todos os tempos, Garrincha, seu parceiro perfeito. Com os dois no time, o Brasil jamais perdeu uma partida.

O Santos foi atormentado por propostas para vender o fabuloso jogador que possuía.

O mais insistente foi o Real Madrid, que fez três propostas, desde o fim dos anos 50 até o início dos anos 60. Milan, Inter de Milão, que dominavam a Europa. Nos anos 70, a Juventus fez de tudo para contratá-lo após a Copa do México.

Mas há duas explicações para que Pelé não saísse do Brasil até sua aposentadoria do Santos.

A primeira é que ganhava o que considerava um salário altíssimo e parte do dinheiro dos amistosos do Santos pelo mundo. A segunda é que o governo militar queria que ele seguisse no país. Era uma questão de patriotismo que os dirigentes santistas não o vendessem.

Pelé tricampeão do mundo. Aos 29 anos. Quando muitos o chamavam de 'velho', deu a resposta
Pelé tricampeão do mundo. Aos 29 anos. Quando muitos o chamavam de 'velho', deu a resposta

Pelé não se satisfez com a primeira Copa do Mundo. Seguiu jogando cada vez melhor. Acumulando prêmios de artilheiro e títulos com o Santos. No Chile, não pôde colaborar como sonhava, já que se contundiu. Garrincha assumiu o protagonismo e levou o Brasil ao bicampeonato.

Mas Pelé se recuperou e ganhou duas Libertadores e dois Mundiais para o Santos.

E o Brasil ficou aos pés do jogador.

Virou garoto-propaganda de inúmeros produtos, era figura constante na televisão. Sua vida pessoal era exposta. Seus casamentos, filhos, namoros. O inacreditável é que ele não cedia à pressão da mídia. Seguia jogando cada vez melhor.

A péssima preparação da seleção brasileira, que chegou a ter 44 jogadores treinando juntos, mais a violência, do batizado "futebol força", acabaram sendo responsáveis diretas pelo fracasso no Mundial de 66, na Inglaterra. Pelé foi caçado em campo.

Irritado com as críticas no Brasil, ele declarou que não disputaria mais Copas do Mundo.

Mas, pressionado pela ditadura militar, voltou atrás e jogou o inesquecível torneio de 1970, com o melhor time de todos os tempos. Aos 29 anos, Pelé calou muitos jornalistas e até o ex-treinador da seleção João Saldanha, que o considerava "velho" e "cego" para jogar a Copa.

Pelé foi o grande maestro do time que conquistou o troféu Jules Rimet definitivamente. Se tornou o primeiro, e único, jogador a ganhar três Mundiais.

Apesar de protestos, Pelé fez sua última partida pela seleção aos 30 anos, em 1971. Ele se despediu em São Paulo, contra a Áustria, no empate em 1 a 1, e marcou pelo Brasil. E no Maracanã, contra a Iugoslávia.

O regime militar o queria na Copa da Alemanha, mas ele foi firme e não cedeu. Não se achava em condições físicas. E avisou que não aceitaria ser convocado.

No Santos, seguiu fazendo história.

Antes da Copa do Mundo de 1970, marcou seu milésimo gol, em 19 de novembro de 1969, contra o Vasco da Gama.

Ele se aposentou do Santos em 1974.

Mas financeiramente percebeu que não ficaria como sonhara.

E cedeu à proposta, dizem que de 4 milhões de dólares por três anos de contrato, do New York Cosmos. A quantia era uma fortuna. Ele passou a ser o jogador de futebol mais bem pago no mundo. E, como a equipe pertencia à Warner, Pelé também virou relações-públicas da empresa. Com direito a outro salário.

Muito acima de Maradona, Messi, Cristiano Ronaldo. Não há comparação com a genialidade de Pelé
Muito acima de Maradona, Messi, Cristiano Ronaldo. Não há comparação com a genialidade de Pelé

Foi o então secretário de Estado dos Estados Unidos, Henry Kissinger, quem interferiu para que Pelé fosse atuar no Cosmos. Ele mandou um telegrama ao chanceler Antônio Azeredo da Silveira para que insistisse com o jogador. Para ajudar a desenvolver o futebol no país norte-americano.

A coleção de títulos de Pelé é absurda.

Três Copas do Mundo, dois Mundiais de Clubes, duas Libertadores, seis vezes campeão brasileiro, dez vezes campeão paulista, campeão norte-americano. Fora as inúmeras Copas.

Pelé se tornou uma figura controversa depois do futebol.

Foi quando Edson assumiu.

Sempre com a vida exposta.

Com vários casamentos, o não reconhecimento da filha Sandra.

Namorou modelos, atrizes.

Foi ministro extraordinário dos Esportes, no governo Fernando Henrique Cardoso.

Seguiu ligado a patrocinadores da Fifa e da Conmebol.

Compensou o início da carreira, quando foi enganado por seu primeiro empresário, Pepe Gordo.

E terminou a vida, que acabou hoje, com muito dinheiro.

Mas com um patrimônio que não chega a 10% do que tem Neymar.

Infelizmente, a carreira de Pelé não foi tão bem documentada, por conta de o seu auge ter sido nas décadas de 60 e 70, quando atuava no futebol brasileiro. 

Mas o mundo não parou hoje para cultuar Pelé por acaso.

O que ele fez e está documentado já é mais do que suficiente para acabar com qualquer dúvida.

Nem Maradona, Messi, Cristiano Ronaldo chegaram perto do seu talento.

Ele foi fabuloso.

Tem três vitórias em Copas no seu currículo.

1.283 gols, em uma época que o futebol era selvagem. As faltas violentas, permitidas. A bola encharcava. Todo o uniforme era de algodão, que também encharcava quando chovia. As chuteiras tinham travas de pregos. Os campos viravam lamaçais.

Não há nem houve jogador que merecesse o apelido de Rei. Pelé seguirá único, eterno
Não há nem houve jogador que merecesse o apelido de Rei. Pelé seguirá único, eterno

Os 21 anos de Pelé se sobrepõem.

Fazem os 61 anos de Edson Arantes do Nascimento, com seus erros e acertos, muito menores.

O mundo, não só do futebol, está em luto.

Edson morreu.

Pelé ganhou a eternidade.

"Pelé não vai morrer nunca", previu, e acertou, Edson...

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

Últimas


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.