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Pacaembu faz 80 anos com sorriso do 'seu, do meu, do nosso' locutor

Criador do famoso bordão, Edson Sorriso presta homenagem ao estádio privatizado e que hoje serve como hospital de campanha para tratar covid-19

Especiais|Eugenio Goussinsky, do R7

Pacaembu serve hoje como hospital de campanha no combate ao coronavírus
Pacaembu serve hoje como hospital de campanha no combate ao coronavírus Pacaembu serve hoje como hospital de campanha no combate ao coronavírus

Ao longo dos seus 80 anos, completados nesta segunda-feira (27), o Pacaembu (que em tupi-guarani significa "terras alagadas") passou a ser conhecido por ter uma "voz própria". Em termos de tradição. Mas também literalmente. Seus locutores, desde os anos 70, acabaram, por trás de frases aparentemente formais, se tornando interlocutores. Do poder público com a massa.

Tudo por causa da entonação, feita de uma forma a trazer uma mensagem de empatia por trás das palavras. O mais recente deles já marcou época com o bordão "O seu, o meu, o nosso Paaacaaaaaembuuu", entoado em meio ao murmúrio da multidão no estádio.

Um toque de arte está presente nessa frase, de autoria do atual locutor do estádio, Edson Tadeu da Silva, o Edson Sorriso. Compositor e sambista, ele se encaixou à nova profissão de forma natural. Futebol e gente, afinal, sempre fizeram parte de sua vida.

Craques festejaram conquistas
Craques festejaram conquistas Craques festejaram conquistas

"A vocação na realidade não descobri, aconteceu, na realidade, sou compositor, arranho cantar alguma coisa e o diretor do Pacaembu já me conhecia, trabalhamos juntos na subprefeitura do Butantã e quando surgiu a necessidade de fazer um jogo ele me falou: vai e sobe lá'", conta Edson, ao R7.

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Grandes eventos

A impressão é a de que essa frase nasceu com o estádio, em 27 de abril de 1940, em inauguração, em pleno "Estado Novo", que contou com a presença até do então presidente do Brasil, Getúlio Vargas (vaiado em função da Revolução Constitucionalista de 1932), do interventor Ademar de Barros e do prefeito Prestes Maia. No jogo inaugural, realizado no dia seguinte, o então Palestra Itália venceu o Coritiba por 6 a 2.

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Edson é locutor do Pacaembu
Edson é locutor do Pacaembu Edson é locutor do Pacaembu

A construção de um estádio para abrigar grandes eventos e incentivar a prática esportiva era uma ideia vigente desde os anos 20. Mas só nos anos 30, com a industrialização e a popularizxação do futebol, o poder público viu na construção do estádio uma estratégia política de manter o brasileiro saudável, por meio do incentivo à prática esportiva.

O estádio foi idealizado pelo prefeito Fábio Prado e construído pelo seu sucessor, Prestes Maia. O local escolhido foi o vale do Pacaembu, antes pertencente a Cia. City, pelas condições topográficas do terreno, que facilitavam a construção das arquibancadas e outros setores.

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Mas ao contrário do que parece, o bordão "Nosso Pacaembu" tem menos de 10 anos, e, neste momento no qual o Municipal Paulo Machado de Carvalho, agora privatizado, teve diminuído seu número de jogos, ajuda o estádio a cativar o público, mantendo o glamour que sempre lhe foi peculiar. Edson, neste sentido, tem exercido um importante papel de porta-voz e garoto-progapanda do velho estádio.

Estádio é importante também para o São Paulo
Estádio é importante também para o São Paulo Estádio é importante também para o São Paulo

"Comecei no início de 2010, trabalhava na subprefeitura do Butantã e um coronel cismou que eu tinha de coordenar outro departamento, já nos conhecímaos desde que trabalhamos na Saúde, me encaminhou para secretaria de Esportes e fiquei lotado pelo Pacaembu, até pela viabilidade, já que na época eu tinha entrado na faculdade lá perto. Foi quando comecei na realidade a trabalhar no Pacaembu, trabalhava na parte administrativa", destaca.

Palmeiras conquistou Brasileiro em 1994
Palmeiras conquistou Brasileiro em 1994 Palmeiras conquistou Brasileiro em 1994

De cima de sua misteriosa cabine, ele via o campo como uma espécie de espelho de sua infância. Futebol para ele sempre foi um grande companheiro, desde os tempos do Itaim-Bibi, bairro paulistano, onde nasceu e cresceu, criado pelos avós. Seu pai morreu quando ele tinha 1 ano.

"Futebol era uma coisa prática, na frente de casa tinha campo, se jogava na rua, era a diversão da molecada, não tinha esse vislumbre hoje por causa do dinheiro, havia a atração por conta da brincadeira, era o dia inteiro em um campinho na frente de casa (o do Canto do Rio, na Avenida Cidade Jardim). Nunca fui um ás, mas cheguei a jogar futsal. Mas eu gostava mesmo do campo, encher de terra era uma loucura, esse meu relacionamento meu com o futebol era isso, a brincadeira da época, mais coletiva que a gente tinha", lembra.

Santos, de Neymar, levou a Libertadores de 2011
Santos, de Neymar, levou a Libertadores de 2011 Santos, de Neymar, levou a Libertadores de 2011

Origem da frase

Como funcionário da administração e paulistano, Edson fala com orgulho do estádio. Criou o famoso bordão, inclusive, em defesa do mesmo, quando estudantes de um curso de comunicação foram entrevistá-lo para um trabalho denominado "Gigante Adormecido", no qual defendiam a tese de que o Pacaembu iria praticamente acabar após o Corinthians construir o Itaquerão.

Para Edson, seria impossível relegar para segundo plano todas as emoções do público, vivida naquele espaço. E sua voz então, dá lugar às lembranças aborvidas pela concha acústica do estádio, de estilo Art Déco.

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Atualmente com capacidade para 37,3 mil torcedores, já contou com a presença de 72.018 pessoas, recorde de público, em 25 de maio de 1942, quando, no empate por 3 a 3 entre Corinthians e São Paulo, o atacante Leônidas fez um histórico gol de bicicleta.

"O Pacaembu é história, é um marco, não tinha como ser elefante branco, a história é uma sequência, e eles (estudantes) insistiam e eu falei, poxa, vamos combinar uma coisa, o Pacaembu é seu, é meu, é nosso. Após isso, eu criei a frase e comecei a falar no microfone do estádio", conta.

Entre milhares de jogos (1690 do Corinthians), vários títulos foram conquistados pelos chamados grandes paulistas no Pacaembu, como o Paulista de 1946, conquistado pelo São Paulo de forma invicta; o 4º Centenário conquistado pelo Corinthians em 1954; o Brasileiro de 1994 conquistado pelo Palmeiras e a Libertadores de 2011 vencida pelo Santos.

Diante da relevância cultural do estádio, em um consórcio entre a Prefeitura de São Paulo e o governo estadual, foi criado, em 29 de setembro de 2008, o Museu do Futebol, na parte de baixo do Pacaembu. O local, interativo, conta, por meio de imagens, toda a história do Esporte e traz passagens da vida de craques brasileiros, assim como dos maiores eventos futebolísticos.

O Pacaembu é história%2C é um marco%2C não tinha como ser elefante branco%2C a história é uma sequência

(Edson Sorriso, locutor do Pacaembu)

Casa da seleção

Dois jogos de Copa do Mundo ocorreram lá, em 1950. Num deles, a Suécia venceu a Itália por 3 a 2 e, no outro, o Brasil, escalado com um time mais paulista pelo técnico Flávio Costa, empatou com a Suíça por 2 a 2, gols do são-paulino Alfredo e do corintiano Baltazar. 

No total, a seleção brasileira realizou 23 jogos no estádio, com 16 vitórias, 4 empates e 3 derrotas e 75,3% de aproveitamento, superior ao do Morumbi, com 73,5%. Entre as partidas está a despedida de Ronaldo, em 2011, quando, na vitória por 1 a 0 sobre a Romênia, Neymar e Ronaldo puderam jogar pela única vez juntos pela seleção.

Em setembro de 2019, o novo contexto político e econômico levou o Pacaembu a ser privatizado. O poder público já não se via em condições financeiras de arcar com o estádio que construiu.

A concessionária Allegra Pacaembu, com isso, assinou um contrato de concessão com a Prefeitura e assumiu por 35 anos a gestão do complexo, que inclui, além do campo de futebol, uma piscina, duas quadras de tênis e um ginásio poliesportivo.

Grito contra a violência

Na sua atividade, Edson, que é pai de Júnior (33 anos), Vítor (32), Ana Cláudia (23) e de Erik (7), já presenciou diversos casos de violência no futebol, testemunhando da cabine algumas brigas que o deixaram desconsolado.

"Era degradante ver aquilo, ver a rapaziada se matando por causa de um time, e torcer é vibrar é mandar energia boa para o time, é tirar sarro do amigo amanhã, pelo menos na minha época era assim", lamenta.

Mas, em sua função, descobriu que poderia fazer algo. Um novo bordão.

"Como mensagem, criei a seguinte fala: 'Torça, vibre, respeite o seu oponente, veja-o como seu semelhante, afinal o objetivo é o mesmo: a alegria de torcer. E na racionalidade da vida, a paixão é pelo futebol, o amor é pela vida", descreve, com a conhecida entonação utilizada durante os jogos.

Estádio e hospital

Estádio se tornou hospital de campanha provisório
Estádio se tornou hospital de campanha provisório Estádio se tornou hospital de campanha provisório

Para ele, ver o estádio se tornar um hospital neste momento de pandemia, é mais uma mostra da importância do Pacaembu para São Paulo. Edson considera que, aos 80 anos, o estádio já se incorporou à vida na capital.

"Estava acostumado a ver eventos esportivos, culturais e de repente ver o Pacaembu como hospital meio que choca a princípio. Mas, logo em seguida, se vê que é mais uma parte da história do Pacaembu para São Paulo. Temos de encarar como mais um marco histórico para ele, está servindo em um momento de dificuldade e tendo uma utilidade para a vida, para salvar vidas e isso é bacana. Nesses 80 anos o estádio tem uma diferenciação, e esse é mais um ponto para dizer que ele faz parte da história do povo", afirma.

Na linguagem e com o estilo alegre do brasileiro, Edson tem o riso fácil e comunicativo. Daí o seu apelido. Já compôs até samba-enredo para a Vai-Vai, além do samba temático do Pacaembu, muito ouvido no estádio.

E a mesma ginga do samba e do drible ele usa para falar sobre qual seria o seu time do coração, aquele capaz de fazê-lo gritar gol de lá da cabine.

"Sou sambista (risos), canto em qualquer pavilhão, não tenho tempo ruim não", diz, bem-humorado, como se sua voz pertencesse também a todas as torcidas.

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