Até onde vale colocar tudo em jogo por um quarterback?
Recuperação da carreira de veteranos, como Baker Mayfield e Sam Darnold, reacende discussão sobre sacrificar futuro por calouros
O quarterback é o principal jogador de um time de futebol americano. Quando você encontra um bom passador, fica mais fácil montar um elenco estruturado e capaz de construir um caminho em direção aos títulos e à glória.
Começo esse texto pedindo desculpas aos chefes das 32 franquias da NFL. Não é possível prever o futuro, por mais que sejamos capazes de fazer prognósticos — que muitas vezes são ignorados pelos próprios general managers da liga ao selecionar um quarterback recém-saído da universidade.
Por falar em universitários, o Draft da NFL... Um evento de três dias que pode mudar os rumos da franquia. Não é mesmo, New England Patriots? Vocês selecionaram Tom Brady com a escolha 199. Todas as equipes — incluindo vocês — acharam que outros 198 jogadores eram melhores do que o cara tido como o maior de todos os tempos.
Acontece de um craque ser renegado e selecionado mais tarde no Draft, porém, é mais provável o contrário, que uma aposta que brilhou no universitário seja escolhida cedo e não dê os resultados esperados. Os exemplos são diversos: Johnny Manziel, Ryan Leaf, Tim Tebow... Verdadeiras estrelas que não vingaram no nível profissional. É do jogo, acontece.
O grande problema é o quanto você se sacrifica para selecionar alguém que você não sabe se realmente dará certo. Para quem não está habituado ao Draft da NFL, a ordem de seleção dos atletas universitários é feita conforme o resultado da temporada anterior. Ou seja, o pior time vai ter a chance de escolher primeiro, e assim por diante.
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Entretanto, se você quiser muito selecionar alguém que pode ser escolhido cedo no Draft, você pode tentar negociar uma escalada na ordem de seleção. E é exatamente aí que mora o problema. Muitos times entregam escolhas de primeira rodada de dois, três anos, para selecionar um jogador que sequer deu um passe na NFL.
Vamos ao exemplo mais recente: Bryce Young. O Carolina Panthers comprometeu parcialmente três anos de seleção para escolher o então calouro, vindo da Universidade de Alabama. Para conseguir a escolha número um do Draft de 2023, os Panthers enviaram para o Chicago Bears o wide receiver D.J. Moore, as escolhas de primeira e segunda rodada (9ª e 61ª) de 2023, a escolha de primeira rodada (1ª) de 2024 e a escolha de segunda rodada de 2025.
Dentro de campo, Young foi uma grande decepção. A franquia de Carolina, liderada pelo quarterback, venceu apenas dois jogos em 2023. Durante a temporada, ele lançou para apenas 2.877 jardas, 11 touchdowns e dez interceptações. Obviamente, o time dos Panthers não era o suprassumo do talento, mas Young sequer conseguiu dar esperança aos torcedores da franquia.
Nesta temporada, Young foi titular nas duas primeiras semanas, nas quais não lançou nem um touchdown e três interceptações. Na Semana 3, os Panthers colocaram o veterano Andy Dalton, de 36 anos, em campo, e viram o experiente quarterback liderar o time a uma vitória de 36 a 22 contra o Las Vegas Raiders fora de casa. Na partida, Dalton lançou para 319 jardas e três touchdowns.
Apelidado de Red Rifle (Rifle Vermelho, em tradução livre, cabelo ruivo), Dalton entrou na NFL em 2011, selecionado pelo Cincinnati Bengals na segunda rodada daquele Draft. Por lá, ele foi eleito três vezes ao Pro Bowl e levou a franquia preta e laranja aos playoffs por seis temporadas seguidas. Entretanto, ganhou o título de amarelão após não conseguir vencer nenhum jogo de pós-temporada. Como consequência, se tornou um andarilho da NFL e passou por quatro franquias nos últimos cinco anos: Dallas Cowboys, Chicago Bears, New Orelans Saints e, finalmente, Panthers.
Situação parecida a de Dalton viveu Baker Mayfield. Selecionado como escolha número 1 do Draft de 2018 pelo Cleveland Browns, o quarterback levou a equipe, em 2021, à primeira vitória nos playoffs desde 1995. Apesar de ser consistente e ter bons números pela franquia, Mayfield foi trocado com os Panthers — mais uma vez eles — em 2022. Por lá, o jogador ficou apenas sete jogos e foi enviado para o Los Angeles Rams, onde foi titular em quatro jogos.
A carreira de Mayfield parecia ter chegado ao fim, mas um convite para liderar o Tampa Bay Buccaneers após a aposentadoria de Tom Brady deu um refresco ao futebol americano do atleta de 29 anos. Em 2023, o quarterback foi eleito ao Pro Bowl, em ano que conseguiu levar os Bucs aos playoffs. Agora, em 2024, ele também tem feito boas atuações, sendo um dos destaques da temporada.
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Mas nenhuma história deste ano se compara a de Sam Darnold. Renegado por onde passou, o quarterback, que foi selecionado pelo New York Jets em 2018, nunca conseguiu ter números que justificassem sua titularidade. Em 2021, Darnold foi parar nos Panthers — de novo eles —, onde ficou apenas dois anos e repetiu as mesmas atuações da época dos Jets. Em 2023, Darnold foi parar no San Francisco 49ers e viu o time chegar ao Super Bowl, porém só atuou como titular em uma partida, na qual saiu derrotado.
O renascimento da carreira do quarterback veio este ano, no Minnesota Vikings. Darnold chegou por lá para ocupar o lugar do outrora titular Kirk Cousins. Entretanto, viu a franquia selecionar poucas semanas depois J.J. McCarthy no Draft. O azar do calouro, que precisou operar o joelho em agosto, foi a sorte de Darnold, que aos 27 anos tem o seu melhor início de temporada: 657 jardas, oito touchdowns e duas interceptações.
Dalton, Darnold e Mayfield estiveram antes ou durante a passagem de Young nos Panthers. Mesmo assim, a franquia decidiu colocar todas as fichas em uma aposta, que até o momento não surtiu efeito. É óbvio que Young é jovem, ainda pode achar o seu caminho, e os três citados anteriormente não são necessariamente uma resposta a longo prazo. Entretanto, esses três QBs experientes não colocaram o futuro de Carolina em jogo para estar lá.
E assim como Panthers, outros times também subiram no Draft por quarterbacks que nunca corresponderam: Chicago Bears por Mitchell Trubisky, em 2017, 49ers por Trey Lance, em 2021, e por aí vai.
No fim, o ponto é: por que dar a vida no Draft (que muitas vezes é loteria) por uma promessa de quarterback enquanto existem outros talentos na liga para a posição? Até onde é realmente válido “vender o futuro” por uma aventura? Por que não abastecer outras posições com talentos pelos quais você não precisa se arriscar tanto?
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