Tite poderá até perder a Copa. E seguir como técnico da Seleção
Modernidade, comando da equipe, trabalho sério do treinador desviam o foco dos problemas da CBF. Dirigentes o querem no Brasil até 2022
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
Teresópolis
Ricardo Teixeira abandonou a presidência da CBF às vésperas da Copa de 2014. Mundial que ele mesmo trouxe ao Brasil. Havia contra ele fortes acusações da Fifa, ligadas à extinta agência de marketing, ISL. E também investigações da Polícia Federal envolvendo superfaturamento de um amistoso contra Portugal.
José Maria Marin está preso nos Estados Unidos, condenado por corrupção.
Marco Polo del Nero foi banido do futebol, acusado de corrupção.
O coronel Antônio Nunes é um mero interino, sem voz ativa.
Rogério Caboclo é um desconhecido burocrata, que nunca exerceu cargo executivo no futebol. Foi eleito como novo presidente da CBF, a partir de 2019, porque foi indicado por Del Nero. Qualquer pessoa que Marco Polo escolhesse teria o cargo. Até por conta da manobra eleitoreira que o ex-presidente promoveu, acabando com a democracia na eleição da entidade. O poder decisório é todo das Federações. Clubes se tornaram meros fantoches.
Diante desse quadro, a CBF precisava de um escudo.
E ele surgiu.
Tite.
Primeiro, ele salvou a Seleção Brasileira, seriamente ameaçada de ficar de fora da Copa da Rússia, com a falta de rumo de Dunga. Depois, resgatou uma geração de jogadores que estava condenada de maneira prematura.
Conseguiu fazer com que Neymar percebesse a importância do futebol coletivo. De maneira mais do que inteligente. Aceitou que deixasse de ser o capitão permanente da Seleção. E valorizou os atributos de sua personalidade, além do futebol. Isso fez com que ganhassse um aliado fundamental.
Os jogadores são fascinados por seu trabalho e por sua franqueza. Também querem que siga na Seleção Brasileira depois de julho.
Tite revolucionou a maneira de trabalhar na CBF, criando departamento de análise de desempenho de atletas espalhados pelo mundo. Há centenas de atletas com todos seus dados catalogados e renovados constantemente. Acabou o amadorismo.
Tite criou uma rede de informações essencial que garante cada convocação.
Sua mais recente ideia foi fazer com que analistas de desempenhos dos clubes examinassem cada detalhe de 27 seleções que disputarão o Mundial. As sul-americanas já foram vistas e revistas nas Eliminatórias. Fez o pedido para os 20 clubes que estavam na Série A em 2017.
O Atlético Goianienes cuidou da França, o Atlético Mineiro, da Rússia, o Avaí, da Costa Rica, o Bahia, do Irã, o Botafogo, do Japão e Suécia, a Chapecoense, da Inglaterra, o Corinthians, da Arábia Saudita e Panamá, o Coritiba, da Bélgica, o Cruzeiro, da Polônia e Grécia, o Fluminense, do Méxiico, o Grêmio, do Marrocos e Suíça, o Palmeiras, da Tunísia e Dinamarca, a Ponte Preta, da Espanha, Santos, de Portugal, o São Paulo, da Alemanha e Austrália, o Sport, da Sérvia, o Vasco, do Egito e Nigéria e o Vitória, do Senegal.
Só o Flamengo se recusou a participar.
Além do trabalho detalhado e inédto, Tite conseguiu aproximar os clubes da CBF, em um momento delicadíssimo. Além dos relatórios que a Seleção levará para a Rússia, os observadores do Avaí, do Grêmio e do Sport tiveram de organizar uma exposição dos pontos fortes e fracos dos rivais Costa Rica, Suíça e Sérvia, na primeira fase. As palestras para o próprio Tite e sua Comissão Técnica, já começaram, aqui na Granja Comary, o que tem deixado os funcionários dos clubes extremamente orgulhosos pela valorização.
Em janeiro e fevereiro, Tite fez várias seções de entrevistas com os principais órgãos de comunicação do país, como o portal R7. Ele expôs sem medo suas convicções de futebol, da Seleção e da vida.
Ele trouxe uma aura de respeito impressionante à CBF.
E a entidade quer que o treinador siga comandando o Brasil, depois do Mundial. Mesmo se o Brasil não conseguir o título.
A ideia nasceu com o próprio Del Nero, depois da classificação para a Copa do Mundo. Ele percebeu que não há no mercado alguém com o currículo, liderança, personalidade conciliatória e inteligência. O treinador sabe, por exemplo, que a Granja Comary é uma concentração que não serve mais para a preparação da Seleção para uma Copa.
Por mais que melhore a sua infraestrutura, o essencial está envenenado. Os campos são cercados de montanhas. Mansões e favelas, como a de Santa Cecília, são excelentes lugares para observação. Treinos secretos são impossíveis. Além da neblina que costuma interromper coletivos. E do frio desnecessário, como no caso da Rússia, onde a Copa será disputada em pleno verão.
Mas Tite fez questão de passar uma semana por aqui. Agrada cúpula da CBF e seus patrocinadores, que são mostrados à exaustão nas imensas placas espalhadas pela concentração. Isso é proíbido no Mundial.
Se o técnico sair, por qualquer motivo depois da Copa da Rússia, o cenário é escasso. Renato Gaúcho e Fábio Carille são os candidatos naturais por seus trabalhos vitoriosos no Grêmio e Corinthians. Mas estão longe de ser unanimidade na CBF. Renato por sua personalidade forte. E Carille por sua inexperiência.
Mano Menezes fracassou quando teve o comando da Seleção.
A Seleção continua vetada para técnico estrangeiro.
Por tudo isso, Tite terá a chance de seguir até 2022, no Catar.
Nenhum treinador seguiu na Seleção depois da derrota em um Mundial. Telê Santana perdeu a Copa de 1982. Mas Parreira, Edu Coimbra e Evaristo de Macedo passaram até que voltasse em 1986. Zagallo foi o único que ficou em dois Mundiais seguidos. Tinha o apoio da Ditadura Militar. Venceu em 1970 e fracassou em 1974.
Tite tem o sonho de assumir uma equipe europeia. Mas seus 19 jogos na Seleção Brasileira não foram suficientes para impressionar os grandes clubes do mundo. E a temporada de 2018/2019 já está alinhada para Real Madrid, Barcelona, Bayern, PSG, Manchester United, Juventus.
O treinador e Edu já reafirmaram várias vezes que seria excelente ter um ciclo de quatro anos na Seleção. Para montar não só um time para o Mundial do Catar, mas para impor a filosofia na base. Que garantiria equipes fortes para as próximas Copas.
Tite ganha cerca de R$ 900 mil. Dinheiro não é problema para a CBF. O patrimônio da entidade não para de crescer. Já passa dos R$ 700 milhões.
A princípio, o treinador não quer falar sobre renovação. Sabe que toda a aura atual pode ruir, diante de um desastre na Rússia. Como aconteceu com Luiz Felipe Scolari. Ele era unamidade depois da conquista da Copa das Confederações. E quase foi enxotado da CBF após os 7 a 1 para a Alemanha e a derrota por 3 a 0 para a Holanda, na disputa do terceiro lugar da Copa de 2014.
Caboclo e o coronel Antônio Nunes querem Tite após o Mundial.
Seguem religiosamente o que desejava Del Nero.
O treinador sabe dessa intenção.
Mas só vai definir seu futuro depois da última partida do Brasil na Copa.
Tem a visão que tudo pode mudar.
Principalmente partindo do comando do futebol neste país...