O tricampeão mundial São Paulo se apequenou. Aprendeu a perder
Dirigentes como Leco transformaram o São Paulo num clube submisso. Acostumado a passar vexames. Convive com naturalidade com os fracassos
Cosme Rímoli|Cosme Rímoli
3 de dezembro de 2017.
O inseguro presidente Carlos Augusto de Barros e Silva decidiu. Faria uma festa na última rodada do Brasileiro de 2017. Na partida contra o Bahia, ele colocou ingressos a R$ 1,00. Foram distribuídas 60 mil bandeiras de plástico, com a frase "2017, o ano em que a torcida bateu recordes". Deu 2.500 ingressos para o parque de diversões Hopi Hari. Do lado de fora do Morumbi, um Fan Fest das 10 da manhã às 16 horas.
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O ponto alto foi o desfile das escolas de samba das torcidas organizadas Independente e Dragões da Real, ao lado do gramado. Leco circulava com desenvoltura pelos torcedores. Os abraçava, sorria, dançava. Tudo muito estranho.
De maneira absurda, Leco comemorava a terceira vez que o São Paulo escapava do rebaixamento.
A medíocre frase 'time grande não cai' era uma vergonhosa compensação.
No campo, a equipe fraquejou, de novo. Estragou a festa. Empatou em 1 a 1.
E acabou o Brasileiro na vexatória 13° posição.
No Paulista deste ano, o campeonato que o inseguro Leco, Raí, Lugano e Ricardo Rocha apostavam ser o mais fácil, clube não chega nem à final. Caí, diante do Corinthians.
21h05 de 19 de abril de 2018.
O clube acaba de ser eliminado, em pleno Morumbi, da quarta fase da Copa do Brasil. Caiu de joelhos diante do Atlético Paranaense. Estava vencendo a partida por 2 a 0. Toma o empate. Não consegue chegar nem entre os 16 melhores times do país.
Nas arquibancadas, alguns palavrões, muitas cabeças baixas. Mais de 27 mil são paulinos faziam fila para ir embora, envergonhados, conformados.
Afinal, aprenderam a perder.
Com o vexame de ontem já são 18 eliminações desde o último título, a Sul-Americana de 2012. Desde então, só vergonha.
Bragantino e Juventude já despacharam o clube nas Copas do Brasil. Penapolense e Audax já fizeram farra, tirando o São Paulo do Campeonato Paulista. No ano passado, o humilde Defensa y Justicia, clube minúsculo da Argentina, ficou com a vaga na Copa Sul-Americana.
Desde o falecido Juvenal Juvêncio foi campeão da Sul-Americana de 2012, os presidentes do São Paulo fazem milhões de torcedores passarem por decepções. Foi assim com Carlos Miguel Aidar, que ficou de abril de 2014 até ser obrigado a renunciar, em outubro de 2015, fuzilado de denúncias de corrupção.
Leco cumpriu apenas duas promessas, ao assumir o poder, no dia 13 de outubro de 2015, foi de resolver as denúncias de corrupção contra Aidar no Morumbi. Elas simplesmente desapareceram. O São Paulo arcou com os erros de Aidar.
E a segunda promessa foi a de extreitar os laços com as organizadas.
"Isso é histórico de dar uma verba para no Carnaval. Você tem que dar ingressos para eles e eles vão nos jogos. Não nos submetemos a nada, mas tem de fazer algumas concessões. Não tem como cortar. O jogador faz gol e faz o sinal da Independente (maior torcida do clube). Não faz para ser agradável, faz porque tem medo de tomar dura", assumiu ao jornal Folha de São Paulo
Segundo a assessoria de imprensa do São Paulo, o clube dá R$ 150 mil de verba para o carnaval, que são divididos entre as principais torcidas.
Além disso, disponibiliza 1.500 ingressos para jogos no Morumbi e 500 quando a partida é fora.
Carlos Miguel Aidar já pagava ônibus às organizadas.
Leco conseguiu a cumplicidade organizados de uma maneira que os atletas odeiam. Ele obrigou que o time fizesse uma reunião com os torcedores. E jurasse que iria se desdobrar em campo. Os jogadores tiveram de prometer raça, vibração. Deram satisfação, imploraram apoio. Outro gesto vergonhoso que não combina com a grandeza de um tricampeão mundial.
E também segue livre do questionamento da oposição. Como é minoria no clube, os conselheiros seguem omissos, diante dos inúmeros erros atual gestão.
Aos 80 anos, ele pode se inseguro em relação ao futebol. Mas internamente exerce seu pleno poder como presidente. Cala revoltosos como o ex-executivo de futebol, o milionário Vinícius Pinotti. Passou por cima de suas opiniões, passou a contratar e dispensar jogadores sem sequer avisá-lo. Pinotti, que foi apresentado por ele, com o grande executivo de futebol das próximas décadas. Durou um ano no cargo, até ser obrigado a se demitir.
Leco não tem a menor ideia da filosofia do futebol que deseja ver o São Paulo jogando. Já teve como treinadores Doriva, Milton Cruz, Edgardo Bauza, André Jardine, Ricardo Gomes, Pintado, Rogério Ceni, Dorival Júnior e Diego Aguirre. Cada um deles orientando, treinando, organizando o time, de maneira completamente diferente.
Decapitando técnicos para se preservar, sem se importar em fazer o clube pagar multas, não é por acaso que a insegurança domina o Morumbi. Não há como confiar nas promessas do presidente, que o contrato será cumprido. Com ele, técnicos já chegam ameaçados.
Torcedores e imprensa se acostumaram a ver o São Paulo como vanguardista, clube poderoso. Único tricampeão mundial neste país. E, de repente, seis anos de vexames seguidos. A sensação de falta de rumo chega a ser maior do que a de estagnação.
Os cardeais, dirigentes antigos, milionários de famílias quatrocentonas paulistas, que ditavam a política do São Paulo na década de 90, ou estão muito envelhecidos ou morreram. Leco era um dos mais jovens deles. Hoje, tem 80 anos.
Desde que assumiu, Leco transformou o clube em um balcão de negócios. Age como se o São Paulo fosse uma fábrica de sapatos, sem moldes. Sem o menor constrangimento vai comprando e vendendo jogadores. Desprezando a lógica, o bom senso, que indicam que um time de futebol precisa ter entrosamento. Os atletas precisam se conhecer. Seguir uma filosofia.
A utilização dos jovens jogadores formados em Cotia é aleatória. Meninos são despejados ao lado de atleta calejados. E,com o clube acumulando fracasso, são obrigados a demonstrar seu futebol sob uma pressão que beira o insuportável.
Os que conseguem o milagre de se destacar, são logo vendidos para o exterior.
O que aconteceu em 2017 foi absurdo. O planejamento do clube traçado para a temporada não deixava dúvidas. A meta de venda de atletas era de R$ 60 milhões. Mas Leco se empolgou com a procura dos empresários. Mesmo não tendo a totalidade dos percentuais dos jogadores, o dirigente os despachava, sem dó. O clube levantou R$ 181 milhões, mas sabotou o trabalho do iniciante Rogério Ceni e do titubeante Dorival Júnior.
Vale recordar a lista.
Thiago Mendes – € 9 milhões (R$ 34 milhões) – percentual – 80%, Luiz Araújo – € 10 milhões (R$ 37,7 milhões) – percentual – 70%, David Neres – € 12 milhões (R$ 45 milhões) – percentual 100 %, Maicon – € 7 milhões (R$ 26,4 milhões) – Pode receber € 1 milhão em bônus por jogos, Lyanco – € 6 milhões (R$ 22,6 milhões) – Pode receber lucro por negociação futura, Luisão – € 3 milhões (R$ 11,3 milhões) – Foi usado como parte do pagamento de Maicon ao Porto. Galván – € 1 milhão (R$ 3,8 milhões) – Pode receber mais € 2 milhões por participações no Real Madrid.
Tudo isso sem a permissão de Ceni ou Dorival, dois meros expectadores do desmanche.
Leco ficou orgulhoso com o dinheiro levantado. O reflexo veio na queda no Paulista, na Copa do Brasil, na Sul-Americana, na 13ª colocação no Brasileiro e fora da disputa da Libertadores de 2018.
Depois de o clube passar vergonha sob seu comando em 2015, 2016 e 2017, a insegurança voltou. Com a boa relação com as organizadas, não vieram protestos violentos. Apenas a vergonha da reprovação silenciosa dos conselheiros. Foi quando o dirigente teve a ideia de ir mais à fundo no projeto que falhou com Rogério Ceni.
Buscou três ídolos do clube para assumirem publicamente o futebol. Raí, Lugano e Ricardo Rocha. Excelente nomes para entrevistas, distrair jornalistas e torcedores. Internamente, seguiria fazendo o que bem entende.
Leco ouve muito seu contemporâneo, o empresário uruguaio Juan Figer. Aos 84 anos, foi ele quem insistiu para Leco bancar Lugano. E trocar a apatia de Dorival Júnior pela garra dos times dirigidos por Diego Aguirre. Era o sangue 'celeste' que dominaria o São Paulo.
Aguirre chegou com o elenco montado. Com vários erros cometidos por pura precipitação de Raí, com a bênção de Leco. Como gastar R$ 10 milhões com o imaturo goleiro Jean e outros R$ 10 milhões com o desgastado Diego Souza. Manter no elenco Cueva, que várias vezes deixou claro que deseja ir embora.
O treinador uruguaio quer montar uma equipe rápida, vibrante. Mas precisa conviver com a saída de bola mais lenta do Brasil, com os caros Jucilei e Petros. Não pode tocar em Rodrigo Caio, que vive a pior fase de sua carreira, mas é o único atleta que tem uma mínima chance de ir para a Copa da Rússia com o Brasil de Tite. Voltar valorizado para ser vendido.
Com Leco também morreu o plano de modernização do Morumbi. Transformá-lo em uma lucrativa arena multiuso. As derrotas, a péssima administração, dirigentes banidos por suspeita de corrupção, afastam patrocinadores dispostos a propor sociedade que envolvam centenas de milhões de reais.
Aguirre conseguiu fazer o time mais vibrante. Mas os erros são tantos na formação do elenco, que os jogadores não têm estrutura psicológica para a forte cobrança, depois seis anos de fracassos. Por isso, bastaram quatro meses e já vieram duas eliminações. No Paulista e na Copa do Brasil.
As organizadas, aliadas de Leco, se calam.
Os torcedores comuns se cansaram.
São decepções seguidas de decepções.
Nada aconteceu nestes seis anos por acaso.
A realidade é cruel.
Não há mais o direito sequer de sonhar.
O tricampeão mundial está pior do que estagnado.
Com o inseguro Leco, o clube está sem rumo.
Ele ficará no poder até o final de 2020.
Até os 83 anos...
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Se acostumou a perder...
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