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Cosme Rímoli - Blogs

Brasil e Ucrânia. Unidos pela hipocrisia e racismo

Os atos racistas em Kiev e em Belo Horizonte já viraram rotina. Tanto na Ucrânia como no Brasil. A impunidade é vergonhosamente igual

Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli

A Polícia não divulgará o nome de quem agiu com racismo e cuspiu no segurança
A Polícia não divulgará o nome de quem agiu com racismo e cuspiu no segurança

São Paulo, Brasil

Domingo, Belo Horizonte.

"Sua mãe está na zona.

"Seu filho de pu...


"Seu filho de pu...

"Olhe a sua cor."


Depois, a cusparada no rosto.

O segurança Fábio Coutinho, do Arena Minas, limpou o rosto do nojento cuspe que escorria na sua face.


E teve o sangue frio de perguntar, ao algoz, torcedor que vestia a camisa 7 do Clube Atlético Mineiro, e estava em pé em uma área nobre, cara do Mineirão.

"Você é racista?", perguntou o segurança.

Domingo, Donetsk, Ucrânia

30 minutos do segundo tempo do jogo entre Shakhtar Donestk e Dínamo Kiev. Durante a partida, torcedores do Dínamo xingavam de 'macaco' Taison e Dentinho. Cada vez o coro foi aumentando.

Até que Taison não suportou mais. 

Resolveu reagir.

Mostrou o dedo médio para os torcedores.

E chutou a bola em direção dos racistas.

Foi expulso, chorando, nervoso, revoltado.

Dentinho também saiu indignado.

Taison deu sua resposta no Instagram.

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“ Amo minha raça, luto pela cor, o que quer que eu faça é por nós, por amor... “

Jamais irei me calar diante de um ato tão desumano e desprezível ! Minhas lágrimas foram de indignação, de repúdio e de impotência, impotência por não poder fazer nada naquele momento !

"Mas somos ensinados desde muito cedo a sermos fortes e a lutar ! Lutar pelos nossos direitos e por igualdade !

"O meu papel é lutar , bater no peito , erguer a cabeça e seguir lutando sempre !

"Em uma sociedade racista, não basta não ser racista, precisamos ser antirracista !

"O futebol precisa de mais respeito.

"O mundo precisa de mais respeito !"

Taison ganhou apoio na Ucrânia, no Brasil, no mundo.

Taison, revoltado, com as imitações de macaco. Vergonha em Kiev
Taison, revoltado, com as imitações de macaco. Vergonha em Kiev

Dentinho, também.

"Eu não queria comentar sobre o que aconteceu ontem, mas acho que não posso me calar diante de algo tão grave. Eu estava fazendo uma das coisas que mais amo na minha vida, que é jogar futebol e, infelizmente, acabou sendo o pior dia da minha vida.

"Durante o jogo, por três vezes, a torcida adversária fez sons que lembravam macacos, sendo duas vezes direcionadas a mim. Essas cenas não saem da minha cabeça. Não consegui dormir e já chorei muito.

"Sabe o que eu senti naquele momento? Revolta, tristeza e nojo de saber que ainda existem pessoas tão preconceituosas nos dias de hoje. Agradeço a todos pelas mensagens de apoio e manifestações de carinho."

"Passei a noite em claro, minha esposa não foi trabalhar hoje. Ela está comigo aqui. Só tenho ela aqui, sou do Rio de Janeiro. Meus filhos moram no Rio, são adolescentes. Quando a ficha caiu, fiquei muito chateado. Meus filhos fizeram contato e disseram que viram na rede social: 'Ele cuspiu na sua cara'. Aí eu disse não foi bem assim, disfarcei.

"Não revidei porque poderia piorar a situação. Tinha que ter tranquilidade, porque hoje a imprensa poderia estar noticiando que segurança agride torcedor. Poderia perder o emprego se não tivesse sangue frio.

"A gente estava impedindo que os torcedores passassem por aquele corredor para não se confrontarem com a torcida do Cruzeiro. Só passavam idosos e pais com as crianças. E aquele torcedor se exaltou. Começou a apontar o dedo na minha cara, depois falou 'olha a sua cor' e cuspiu em mim. Os vídeos mostram tudo.

"Não quero me vitimizar, mas foi uma agressão injusta, ato racista, recebi vídeos que comprovam que ele cuspiu na minha face, me agrediu falando da minha cor. Foi uma agressão gratuita a um profissional e a um atleticano", disse Fabio Coutinho.

Inesquecível a cena de Patricia Moreira gritando 'macaco' para Aranha
Inesquecível a cena de Patricia Moreira gritando 'macaco' para Aranha

O segurança só foi registrar um Boletim de Ocorrência depois que teve a certeza que não seria despedido. 

A Federação Ucraniana não se posicionou.

Lá, o racismo está presente nos estádios de futebol. 

As penas são brandas.

Como no Brasil.

Nem a palavra racismo é citada na lei.

É usada a expressão 'injúria racial'.

Teoricamente, a pena vai de um a três anos.

Só que no emaranhado de leis que existe neste país, a punição costuma ser tão ou até mais branda do que na Ucrânia.

No máximo, como aconteceu no infelizmente célebre caso de racismo na partida Grêmio e Santos, na Copa do Brasil, em 2014, quando a torcedora Patricia Moreira gritou a plenos pulmões "Macaco" para o então goleiro santista, Aranha.

Em um acordo proposto pelo juiz Marco Aurélio Xavier, ela apenas teria de se apresentar em um posto policial no horário dos jogos do Grêmio. Por dez meses.

E assim acabou esta situação.

Antônio Carlos mostrando a cor negra de Jeovânio. Ato racista lastimável
Antônio Carlos mostrando a cor negra de Jeovânio. Ato racista lastimável

Mas houve várias antes e irão acontecer outras.

Como o do então zagueiro Antônio Carlos. Jogando pelo Juventude, ele ironizou mostrando a cor da pele negra ao volante Jeovânio. A suspensão, branda, dois meses.

Brasil e Ucrânia se igualam na proteção ao racista.

Com uma grande diferença.

Os ucranianos assumem.

Aqui impera a hipocrisia.

Com o grande apoio da legislação.

O caso de Fabio Coutinho será esquecido em uma semana.

A Polícia Civil mineira identificou o autor da cusparada e do ato da 'injúria racial'. Descobriu que outras pessoas também mostraram seu racismo, ofendendo Coutinho.

Avisou que os nomes serão mantidos em sigilo.

Por quê?

Por aqui é o Brasil.

A exposição de Fábio, um homem tomando uma cusparada no rosto e que tem a sua cor questionada, não tem nada demais.

Já quem teve a atitude nojenta, do ataque covarde, é preservado.

O Atlético Mineiro tomou providências.

Divulgou 'nota de repúdio'.

O STJD teria de punir o clube.

Como a Federação Ucraniana, o Dínamo.

Mas nada sério acontecerá.

Kiev é aqui...

Dentinho e Taison desabafam na web: 'Precisamos ser antirracistas!'

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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