'Sou negro, filho de negro, neto e bisneto de negro.' Neymar desperta
Neymar deve ser suspenso entre quatro e sete partidas pela confusão com Álvaro González. Valeu, por até que enfim, declarar seu orgulho por ser negro
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
Levaram dez anos.
Mas Neymar finalmente assumiu algo que deveria ter feito há muito tempo.
A sua raça.
Ele é negro.
E tem de ter orgulho.
Como se fosse branco, amarelo, índio.
A sua declaração de dez anos atrás sempre ecoou no coração e mentes de quem acompanha sua trajetória no futebol.
"Nunca (fui vítima de racismo). Nem dentro e nem fora de campo. Até porque eu não sou preto, né?"
Leia também
Acusado de racismo por Neymar, zagueiro já ofendeu Messi
Neto pede para Neymar assumir briga contra racismo
PSG "apoia fortemente" Neymar em queixa de ofensa racial
'A pressão faz parte dos grandes treinadores, jogadores e equipes', diz Jesus antes de duelo contra o PAOK
Súmula relata xingamentos de Vilson após derrota do Corinthians
Foi há dez anos.
Ele seguiu a carreira, sem se envolver na séria questão do racismo.
Nem em outra questão social importante.
Neymar tem sua fundação, que ajuda centenas de crianças no litoral paulista. Ela é administrada pelo pai. O máximo que se envolve é participar de torneios de futebol nas férias e de leilões.
Tudo seguia tranquilamente até ontem.
Quando encontrou o espanhol Álvaro González, do Olympique de Marselha. Na partida pelo Campeonato Francês, o brasileiro do PSG passou a trocar ofensas e provações com o adversário.
Até que deu um soco na nuca de Àlvaro González. O VAR chamou o árbitro Jérôme Brisard e o atacante foi expulso.
E denunciou o rival como racista.
No Instagram colocou com todas as letras que foi chamado de 'mono hijo de pu...', macaco filho da pu...
Por ser negro.
E hoje, ele assume sua raça.
"Eu sou negro, filho de negro, neto e bisneto de negro."
"Tenho orgulho e não me vejo diferente de ninguém."
Era essa postura que se esperava de um ídolo.
Neymar caminha para os 29 anos.
Não pode mais ser aceito seu comportamento infantilizado.
Se foi ele mesmo quem escreveu o desabafo no Instagram, e não nenhum dos dezenas de funcionários que cuidam de sua carreira, o progresso é admirável.
Neymar sabe que tem mais de 230 milhões de seguidores nas redes sociais.
É exemplo para muita criança.
E se posicionar em relação à sua raça é algo imprescindível.
Neymar será suspenso.
Ficará entre 4 e 7 partidas sem entrar em campo.
O espanhol corre até risco maior.
De ficar até dez jogos longe do futebol.
Desta vez é por um motivo compreensível a ausência de Neymar dos gramados.
No meio de mais esta confusão na sua carreira, há algo fundamental.
Muito positivo.
A afirmação pública do orgulho de sua raça.
Como tem de ser.
Abaixo, o desabafo completo de Neymar...
"Ontem me revoltei, fui punido com vermelho porque quis dar um cascudo em quem me ofendeu. Achei que não poderia sair sem fazer nada porque percebi que os responsáveis não fariam nada, não percebiam ou ignoravam. Durante o jogo, queria dar a resposta como sempre, jogando futebol. Os fatos mostram que não consegui, me revoltei."
"No nosso esporte, as agressões, insultos, palavrões são do jogo, da disputa. Não dá para ser carinhoso. Entendo esse cara em parte. Faz parte do jogo. Mas o preconceito e a intolerância são inaceitáveis. Eu sou negro, filho de negro, neto e bisneto de negro. Tenho orgulho e não me vejo diferente de ninguém. Ontem eu queria que os responsáveis pelo jogo (árbitro, auxiliares) se posicionassem de modo imparcial e entendessem que não cabe tal atitude preconceituosa."
"Refletindo e vendo tanta manifestação quanto ao que ocorreu, fico triste pelo sentimento de ódio que podemos provocar quando no calor do momento nos revoltamos. Deveria ter ignorado? Não sei ainda... Hoje com a cabeça fria respondo que sim, mas oportunamente eu e meus companheiros pedimos ajuda aos árbitros e fomos ignorados. Esse é o ponto!"
"Nós que estamos envolvidos no entretenimento precisamos refletir. Uma ação levou a uma reação e chegou onde chegou. Aceito minha punição porque deveria ter seguido no caminho da disputa limpa do futebol. Espero, por outro lado, que o defensor também seja punido."
"O racismo existe, mas temos que dar um basta. Não cabe mais, chega! O cara foi um tolo, eu também fui por me deixar ser atingido... Eu ainda hoje tenho o privilégio de me manter com a cabeça levantada, mas todos nós precisamos refletir que nem todos os pretos e brancos podem estar na mesma condição."
"O dano do confronto pode ser desastroso para ambos os lados, quer seja preto ou branco. Não quero e não podemos misturar assuntos. Cor de pele não há escolha. Perante Deus somos todos iguais."
"Agora... Ontem perdi no jogo e me faltou sabedoria... Estar no centro dessa situação ou ignorar um ato racista não vai ajudar, eu sei. Mas pacificar esse movimento "antirracismo" é obrigação nossa para que o menos privilegiado receba naturalmente sua defesa."
"Vamos nos encontrar novamente e vai ser do meu jeito, jogando futebol... Fica na paz! Fica em paz! Você sabe o que falou... Eu sei o que fiz! Mais amor ao mundo!"
Neymar e muitos outros: relembre episódios de racismo no futebol
Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.