Vinicius Junior se cansou do 'Campeonato Espanhol dos racistas'. Pela omissão do Real e da Liga Espanhola, pensa em ir embora
O atacante, pela sexta vez só neste Espanhol, ouviu uma torcida adversária xingá-lo de 'macaco'. E ainda acabou expulso. Diante da omissão da Federação Espanhola e do Real, ele pensa em 'jogar longe' dos racistas
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
"Macaco, macaco, macaco."
Essa foi a arma suja, racista, nojenta que as torcidas de Barcelona, Betis, Osasuna, Mallorca, Valladollid e Valença decidiram usar contra Vinícius Júnior.
Milhares de torcedores compararam o brasileiro a um símio por ter a pele negra.
Com a complacência inacreditável da liga espanhola.
E também do Real Madrid.
Porque bastaria Florentino Pérez, o presidente do mais importante clube do mundo, autorizar sua equipe a deixar o campo no primeiro coro racista contra seu melhor jogador, e a situação estaria resolvida.
Mas Pérez é ligado umbilicalmente com o presidente da liga, Javier Tebas Medrano. Sabe quanto é importante ter o apoio de Medrano em várias questões. Principalmente as ligadas a dinheiro, envolvendo transmissão, publicidade, amistosos, negociações.
Então, o resultado é o brasileiro exposto a atos absurdos racistas, que teriam paralisado qualquer campeonato sério no mundo.
E por que Vinícius Jr. foi o escolhido para ter um boneco o representando enforcado embaixo de uma ponte? Lembrando o que acontecia com os negros no auge do grupo racista Ku Klux Klan?
Por que ele tem de ouvir das torcidas adversárias o coro de "macaco puto" antes mesmo de a delegação do Real Madrid entrar nos estádios?
Um jovem de 22 anos ter de acompanhar torcedores imitando macacos cada vez que fica perto da linha de fundo?
São vários motivos. O principal é que Vinícius Jr. é o mais talentoso driblador e o jogador mais perigoso do clube mais forte da Espanha. O segundo é que os torcedores descobriram que a liga e o Real Madrid não dão a menor retaguarda ao brasileiro. E que eles podem ficar à vontade usando a ofensa mais abjeta. A racista.
Carlo Ancelotti e os companheiros de time tentaram ao máximo insistir que a melhor resposta de Vinícius Jr. é continuar a jogar seu melhor futebol.
Só que os atletas adversários, inferiores tecnicamente, perceberam o óbvio abalo psicológico do brasileiro. Justo o atleta capaz de provocar a derrota, que pode custar o rebaixamento, a classificação ou não para a Champions, a Liga Europa ou até o título espanhol.
Daí começaram a se aproveitar dos nervos à flor da pele de Vinícius e passaram a provocá-lo com faltas, xingamentos. Como ontem. Quando o jogador ia apontar os racistas infiltrados na torcida do Valencia, os atletas do time da casa não aceitaram. E passaram a empurrá-lo, xingá-lo, deixá-lo mais nervoso. Não por acaso. Uma situação previsível e combinada com antecedência. E que acabou com o pior dos resultados.
O atleta, humilhado por racistas, sendo expulso pelo árbitro Ricardo de Burgos Bengoetxea por ter empurrado o rosto de Hugo Duro, que o havia agarrado.
Vinícius Jr. estava completamente desequilibrado emocionalmente.
Tudo isso acontece por conta da omissão da Liga Espanhola, que acoberta os racistas, ao não punir os clubes.
A solução é a interdição de setores dos estádios onde ficam as organizadas, geralmente as responsáveis pelos cantos racistas.
Simples assim.
A Uefa já interditou arenas de Hungria, Bélgica, Sérvia. E também Lazio, Zenit, Chikhura Sachkhere, da Geórgia, Debreceni Vasutas Sport Club, da Hungria, Steaua Bucarest, da Romênia, e Maribor, da Eslovênia.
O próprio Real Madrid teve parte do seu estádio interditado por racismo em 2014.
Diante da omissão cúmplice da liga espanhola, Vinícius Jr. ameaça ir embora, deixar o Real Madrid. Consagrar a vitória dos racistas.
Seu desabafo avisa que não suporta mais.
"Não foi a primeira vez, nem a segunda, nem a terceira. O racismo é o normal na LaLiga. A competição acha normal, a Federação também, e os adversários incentivam. Lamento muito. O campeonato que já foi de Ronaldinho, Ronaldo, Cristiano e Messi hoje é dos racistas. Uma nação linda, que me acolheu e que amo, mas que aceitou exportar a imagem para o mundo de um país racista. Lamento pelos espanhóis que não concordam, mas hoje, no Brasil, a Espanha é conhecida como um país de racistas. E, infelizmente, por tudo o que acontece a cada semana, não tenho como defender. Eu concordo. Mas eu sou forte e vou até o fim contra os racistas. Mesmo que longe daqui."
A resposta do presidente da Liga veio rápida.
"Já que aqueles que deveriam não explicam a você o que a LaLiga pode fazer nos casos de racismo, tentamos nós explicar, mas você não se apresentou em nenhuma das datas acordadas que você mesmo solicitou. Antes de criticar e injuriar a LaLiga, é necessário se informar adequadamente, Vini Jr.
"Não se deixe manipular, e tenha certeza de entender bem as competências de cada um e o trabalho que estamos fazendo juntos."
O brasileiro retrucou à altura.
"Mais uma vez, em vez de criticar racistas, o presidente da LaLiga aparece nas redes sociais para me atacar.
"Por mais que você fale e finja não ler, a imagem do seu campeonato está abalada.
"Veja as respostas do seus posts e tenha uma surpresa...
"Omitir-se só faz com que você se iguale a racistas.
"Não sou seu amigo para conversar sobre racismo.
"Quero ações e punições.
"Hashtag não me comove."
O Real Madrid, finalmente, se posicionou de forma fime.
"O Real Madrid CF manifesta a sua mais forte repulsa e condena os acontecimentos ocorridos ontem contra o nosso jogador Vinícius Jr.
"Esses fatos constituem um ataque direto ao modelo de convivência de nosso Estado social e democrático de Direito.
"O Real Madrid considera que tais ataques também constituem um crime de ódio, razão pela qual apresentou a denúncia correspondente à Procuradoria-Geral do Estado, especificamente à Procuradoria contra crimes de ódio e discriminação, para que os fatos sejam investigados e apuradas as responsabilidades.
"O artigo 124 da Constituição espanhola estabelece as funções do Ministério Público para promover a ação da Justiça em defesa da legalidade e dos direitos dos cidadãos e do interesse público.
"Por este motivo, e dada a gravidade dos fatos ocorridos, o Real Madrid recorreu à Procuradoria-Geral do Estado, sem prejuízo do seu caráter privado no processo que está a ser instaurado."
E, depois, o clube divulgou fotos e vídeo de uma reunião entre Florentino Pérez e Vinícius Jr.
Para tranquilizar os torcedores do Real, garantindo a permanência do brasileiro.
Só que ele tem contrato até junho de 2024, apenas.
A expectativa era que ele assinasse com a equipe até 2027, nas próximas semanas.
Só que os atos racistas podem fazer com que tudo mude.
E, em dezembro, ele ficaria livre para assinar um pré-contrato com qualquer equipe do mundo.
Há vários clubes bilionários da Champions League com interesse no atacante.
A situação é gravíssima.
E mereceria uma resposta firme, definitiva, da liga espanhola.
Da Uefa.
Da Fifa.
Se ela não vier, Vinícius Jr. pode tomar uma atitude marcante.
E procurar trabalhar em um país no qual os racistas não sejam tolerados.
O que não é o caso, infelizmente, do futebol espanhol...
Jornais esportivos na Espanha culpam Vinícius Jr. por caso de racismo
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