Tite sabotou Vinicius Junior. E desprezou Danilo. Vitória decepcionante contra o fraco Japão
Gol de pênalti de Neymar garantiu 1 a 0 contra o Japão. Mas o futebol foi decepcionante. Tite colocou Vinicius Junior em campo. Mas o 'matou' taticamente. E não colocou Danilo sequer um minuto em campo. Inaceitável
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
29 minutos do segundo tempo.
Um lance esporádico.
Endo chegou atrasado na dividida dentro da área. Ao perceber que Richarlison já armava o chute de esquerda, não houve saída a não ser colocar seu pé direito, provocando o pênalti.
Neymar, dono de todas as cobranças de penalidades no time de Tite, cobrou e marcou.
Brasil 1 a 0.
Marcou 415 gols na carreira.
São 73 gols pela Seleção. Nada menos do que 19 de pênalti.
Vitória sofrida, tensa, de futebol fraco, contra o Japão, em Tóquio.
Com futebol confuso, instável.
Experiências frustradas pelo próprio treinador.
Primeiro, Tite sabotou Vinicius Junior.
De maneira inacreditável, o treinador da seleção o colocou para atuar centralizado, para que Guilherme Arana tivesse todo o lado esquerdo para atacar.
Depois, Neymar teve toda a cumplicidade de Tite para prender a bola, tentar toques desnecessários de calcanhar, dribles para trás, atrapalhando vários contragolpes.
O treinador, de maneira inexplicável, fez cinco substituições, e negou sequer um minuto para Danilo em campo. Deixando claro o quanto o treinador não quer abrir espaço para atletas que não sejam "seus". Contra a Coreia do Sul já não tinha colocado o melhor jogador do Brasil nem no banco de reservas. Absurda proteção aos "seus escolhidos".
A escolha, sem propósito, de Tite de colocar Vinicius Junior no meio, diante de uma seleção fraca, mas absolutamente obediente taticamente, que atuou no rígido 4-5-1, foi sabotagem. Ele não tinha espaço para dar suas arrancadas, mostrar seu futebol exuberante do Real Madrid.
Tite tem essa cruel disposição. Quando ele é muito pressionado para convocar jogadores que não se encaixam no seu sistema tático, o treinador os coloca em outras funções, que não fazem nos clubes. E acaba fazendo com que não consigam render. O que o deixa à vontade para não chamá-los mais ou torná-los figuras decorativas. É uma atitude inaceitável.
Foi assim com Bruno Henrique, que vivia sua melhor fase da carreira. Tite sabia que ele é especialista na ponta esquerda. E o fez jogar na direita. Gabigol só rende quando tem espaço para "flutuar" pelo ataque. Tite o deixa preso, enfiado entre os zagueiros. Everton Ribeiro virou um excelente meio-campista pela direita. Onde o técnico brasileiro o colocou para atuar? Na esquerda.
E assim, seguiu durante a preparação, queimando jogadores.
O que fez hoje com Vinicius Junior foi revoltante. Ele fez com que atuasse ao lado de Neymar, com os dois correndo pelo mesmo setor. O jogador do Real Madrid ficou encaixotado na marcação japonesa e sem oxigênio para correr pela ponta esquerda, por onde foi fundamental para o seu time espanhol ganhar a Champions League. Não. Porque o setor tinha "dono". O lateral Guilherme Arana. Beira o inacreditável.
Quanto a Danilo, volante do Palmeiras, não há cabimento. Ele desfalcou o Palmeiras de jogos importantíssimos no Brasileiro, contra o Santos e diante do Atlético Mineiro. Fez o melhor jogador atuando no país ir para o outro lado do mundo. Para não figurar nem no banco de reservas contra a Coreia e hoje não entrar um minuto sequer diante do Japão. Não, porque o jogador de confiança de Tite para a posição é o intocável Fred.
Detalhe: o Brasil fez seis substituições. Seis! E Danilo não foi testado.
A partida foi exatamente como se esperava. Com o Japão, muito mais fraco tecnicamente, respeitando demais o Brasil. Com Hajime Moriyasu montando seu time de maneira obcecada na marcação. A aposta era clara e previsível: travar o toque de bola da seleção de Tite na intermediária. As linhas de quatro e cinco atletas eram muito baixas. Próximas da grande área. Confiando na grande falha dos brasileiros, que é não chutar de longe. E forçar tabelas e dribles até perto do gol adversário.
E a seleção mostrou a confusa articulação definida por Tite e seus auxiliares Cesar Sampaio, Cleber Xavier e seu filho Matheus Bachi, cada vez mais influente.
A começar pela difícil arte de poupar Daniel Alves, no auge dos seus 39 anos. Ele não tem força física para ser presente no ataque e na defesa, como é exigido de um lateral de um grande time. Por isso, ele disfarçava como meio-campista no São Paulo. Daniel Alves atua como volante pela direita. A desculpa é deixar todo o setor para o habilidoso Raphinha. Só que, contra times fechados como o Japão, é fundamental a presença do lateral para fazer triangulações com o jogador que atua aberto pelo lado do campo, com a chegada de um meia.
Mas Daniel Alves não tem mais essa energia. O máximo que ele fez, como sempre, foi levantar bolas para a área da intermediária. O que facilitou o trabalho dos zagueiros japoneses.
O segundo erro, que Tite insiste em fingir não ver, é a saída de bola com Casemiro e Fred. Os dois não têm a habilidade, a perfeição nos passes, nos toques curtos capazes de quebrar a primeira linha de marcação adversária. Ambos defendem, fecham o espaço de times que atacam. Contra o Japão não havia necessidade da dupla. Era a partida perfeita para testar Danilo. Ao menos colocar Bruno Guimarães desde o início. Mas Tite quis prestigiar outra vez o seu protegido Fred.
A pior decisão foi montar o ataque com Raphinha aberto na direita, Neymar "flutuando" e Vinicius Junior centralizado, para dar espaço a Guilherme Arana.
Era óbvio que Casemiro, Fred e Paquetá buscariam o ataque pelo meio, forçando tabelas diante das "paredes japonesas".
Neymar, para variar, sem a mesma agilidade e velocidade de anos atrás, buscava compensar na técnica, com dribles e toques de calcanhar. Com a omissão de Tite, o camisa 10 da seleção atrapalhou várias possibilidades de contragolpes.
Foi angustiante ver Vinicius Junior, o melhor brasileiro no exterior, sem o menor espaço para mostrar seu futebol. Ele foi sabotado por Tite, que prefere atuar com Richarlison como centroavante centralizado.
O Japão permitia ao Brasil ter posse de bola. Mas ao chegar perto da área, as linhas de marcação se preenchiam. Chegando até a ficar com dez jogadores, sem ser bola parada. A saída para o Brasil estava nas bolas paradas, com frágil posicionamento dos zagueiros japoneses. Ou forçar chutes ao gol de Gonda.
A seleção até começou dando uma falsa impressão. Aos dois minutos, Vinicius Junior pegou a bola, três japoneses foram marcá-lo, ele tocou para Neymar. O camisa 10 de Tite tentou o toque de calcanhar para Raphinha, mas a bola foi parar em Paquetá. Ele acertou a trave.
Depois desse lance, a seleção nipônica tratou de encostar ainda mais suas linhas, ficar mais compacta no seu sistema defensivo.
O Brasil tentou 14 finalizações no primeiro tempo. A grande maioria com os jogadores marcados, desequilibrados. Faltou consciência e amplitude, com o time centralizado. O Japão deu apenas um arremate.
No segundo tempo, o mesmo cenário. E, lógico, o primeiro a ser sacrificado por Tite foi Vinicius Junior. Atuando fora da posição onde rende, tinha mesmo de sair. Se a intenção do técnico da seleção era provar que não há lugar para o melhor jogador do Brasil na Europa, no seu time, ele conseguiu. Bastou colocar onde ele não rende.
Vale a pena detalhar a estatística. Das 14 partidas de Vinicius Junior nas mãos de Tite, ele só atuou os 90 minutos uma vez. Só uma vez. Nada é por acaso.
Entrou o atacante Gabriel Martinelli. A busca era para definição do jogo. Tite sabia que se o Brasil empatasse em 0 a 0 contra o fraco Japão seria pressionado. Tinha de vencer.
Aos 24 minutos, Tite deixou o Brasil com três zagueiros. Colocou Thiago Silva no lugar de Daniel Alves, completamente esgotado e improdutivo. E também, milagre, tirou Fred. Mas colocou Richarlison, mais um atacante para brigar dentro da grande área japonesa.
A partida já caminhava para o seus últimos 15 minutos, quando veio o pênalti precipitado, afobado de Endo em Richarlison.
Especialista e "dono" de todos os pênaltis e faltas da seleção, Neymar não desperdiçou. Gol do Brasil. Dancinha para os seus milhões de fãs na internet se divertirem.
A partida seguiu no mesmo ritmo, com o Brasil atacando, sem consciência, com o time já cansado. O Japão seguindo ao pé da letra as ordens de submissão do seu treinador. Respeito exagerado diante do time de Tite.
No final, 1 a 0, Brasil.
Os amistosos da data-Fifa importantíssima, cinco meses antes da Copa, terminaram. Com duas vitórias contra times fraquíssimos. 5 a 1 contra a Coreia do Sul e 1 a 0 diante do Japão. Ambas escolas asiáticas, que o Brasil não enfrentará na fase de grupos e talvez não enfrente no Catar.
A incompetência da CBF também não permitiu que o país conseguisse adversário para o dia 11. Mais um amistoso seria fundamental para a preparação. A Argentina desistiu do jogo em 11 de maio. Não houve como encontrar qualquer outra seleção no mundo para que o time de Tite fizesse outro jogo. A preparação para a Copa segue amadora, vergonhosa.
Mas o que a CBF quer exaltar é a estatística.
Outras duas vitórias da seleção.
Mais uma dancinha de Neymar, que se aproxima da artilharia da seleção, vai alcançar Pelé. Está a três gols do melhor jogador de todos os tempos. É isso que importa.
Não outras duas atuações inconsistentes do Brasil.
Nem que o time só tenha enfrentado uma seleção europeia, depois do fracasso na Copa da Rússia. Não. O que vale é estar em primeiro no falso ranking da Fifa, graças a vitórias diante dos times sul-americanos e outros frágeis rivais.
A seleção de Tite segue se enganando.
E fechando as portas para os novos talentos.
O que o treinador fez com Vinicius Junior foi absurdo.
E, com Danilo, indecente...
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