Diamantino. Cruel retrato dos alienados ídolos do futebol
Alienados, egocêntricos, perdidos. Com suas vidas controladas pela família. Diamantino dá um tapa na hipocrisia, na adoração aos jogadores de futebol
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
A geração de jogadores celebridades, egocêntricas, bilionárias e desconectadas com a realidade incomoda o mundo. E ao longo da história da civilização, as artes foram uma maneira de a sociedade dar sua resposta aos disparates, aos exageros.
Foi assim nos livros, no teatro, na pintura.
E, desde o século passado, no cinema.
O festival de Cannes premiou, na semana da crítica, Diamantino.
Foi como se todos esperassem uma obra ridicularizando os atuais ídolos do esporte mais popular do planeta.
O filme é uma corrosiva sátira ao mundo atual do futebol.
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Com direção agressiva, o português Gabriel Abrantes e do norte-americano Daniel Schmidt, partem de maneira grosseira para cima de Cristiano Ronaldo.
O protagonista o ator português Carloto Cotta tem uma atuação impressionante.
O futebol é ironizado até o talo.
(Atenção: a partir de agora, vários spoliers. Ou seja, detalhes do filme que só entrará em cartaz no Brasil, em janeiro de 2019. Se quiser esperar, não leia...)
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O 'esporte bretão' é comparado às grandes religiões, como o ato que faz as populações acreditarem no divino. Como as pinturas de Michelangelo. Aliás, para corromper a mente, a personalidade, a alma de Diamantino, seu próprio pai repete inúmeras vezes que ele é o 'Michelangelo' dos tempos atuais. Até que o jogador acredita.
Até porque, as tevês pagam bilhões para mostrá-lo em campo. Diamantino, acreditam ser um enviado dos céus. E por isso não aceita qualquer crítica. Crê que está acima do bem e do mal.
E que veio à Terra para provar que o Divino exite.
Os torcedores são mostrados como exércitos bovinos, sem raciocínio, que se deixam enganar pelas jogadas espetaculares. E adoram pessoas vazias, alienadas, que vivem em bolhas.
Diamantino é assim.
Bilionário, mas cuja fortuna é adminstrada por sua família.
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Sua vida é aceitar uma sucessão de decisões de parentes.
A preocupação é outra.
Como um menino carente, só se sente vivo quando é elogiado.
Quem o critica é inimigo mortal, como os jornalistas.
Ele cultua seu hedonismo e alienação.
Adora passar pelas estradas e encontrar painéis com sua propaganda de cuecas, mostrando o quanto a musculação o tornou parecido com uma estátua grega.
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Narcisista ao extremo, não perde uma oportunidade para olhar o seu corpo malhado, ajeitar o topete cheio de gel. Mesmo durante os jogos. Tem certeza que nasceu para ser admirado pela humanidade. Nas orelhas seus brincos de diamantes caríssimos. É cercado de todo o luxo que o dinheiro pode proporcionar.
Mostra todo seu despreparo intelectual nos programas de televisão. Quando decide falar o que pensa é um desastre. Por isso é instruído por assessores a repetir como um papagaio respostas que não dizem nada. Não o comprometem.
Sua mansão é um capítulo à parte. Repleta de fotos do próprio Diamantino. Até mesmo os travesseiros que dorme. Se pudesse, a única imagem que veria seria a sua.
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Durante os jogos, não vê adversários humanos tentando tomar a bola. Não. Imagina estar cercado de filhotes de cachorros gigantes. E que não está pisando no gramado. Mas em uma nuvem cor de rosa.
Enquanto dribla os filhotes, olha a própria imagem nos telões. Ajeita o topete, se admira. Enquanto ouve os aplausos da multidão, grata por ele existir.
Ele joga com a camisa 00, para deixar claro que ninguém é igual a ele.
A Copa do Mundo, porém, provoca uma profunda e inesperada crise existencial.
Ele busca os milhões de fãs nas redes sociais para se consolar.
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Mas não consegue.
Olha a coincidência com certo alguém...
Ele não se conforma por ter sido o responsável pela derrota do seu país.
Ele errou o pênalti decisivo na disputa do título.
Como é que foi abandonado pelos deuses?
Justo ele, o que fez de mal?
Como uma maneira de buscar sentindo à existência e o perdão de pensar só em si, decide que chegou a hora de repartir um pouquinho da sua imensa fortuna que acumulou, junto aos clubes e aos contratos de publicidade.
Ele decide adotar um "refugiadinho". É a visão hipócrita e mais superficial possível dos migrantes que fogem desesperados de seus arrasados países e buscam sobreviver na Europa. "Essa gente que vem em barquinhos pelo mar." Pensa em adotar um para criar com carinho e 'crepes de Nutella e chantili'.
E, lógico, ensinar a melhor pose para as selfies.
Diamantino encontra um, mas sua família se posiciona contra.
Não quer dividir a fortuna que vem dos pés do jogador.
O final do filme, que está longe de ser perfeito, não será contado.
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A produção é luso-brasileira.
Mas o que vale destacar é que os cineastas estão acordando.
A hipocrisia, a alienação, a ostentação da geral atual de 'ídolos' no futebol passaram do limite.
E começa a ser rejeitada.
Para decepção de milhões de internautas.
Não são exemplos de vida para ninguém.
Apenas atletas talentos, egocêntricos, oportunistas.
Que preenchem o vazio de muitas vidas sem rumo.
Quem puder, não perca...
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