Simulações, uso de 'desafios' e lances interpretativos: Simon avalia o VAR
Ex-árbitro conversou com o LANCE! e deu a sua opinião sobre o uso do VAR na Copa do Mundo. Nova tecnologia estreou em Mundias e teve números de acertos expressivos
Lance|Do R7
Além dos milhões de torcedores que compareceram à Russia ou que acompanharam de longe a Copa do Mundo, a principal competição de futebol do planeta ganhou novos olhares neste ano. Em cada estádio, 33 câmeras deram subsídio para a análise de árbitros de vídeo pela primeira vez na história do torneio. O VAR foi novidade, e o LANCE! conversou com Carlos Eugênio Simon, ex-árbitro que atualmente é comentarista de arbitragem dos canais Fox Sports, que fez um balanço positivo da implementação da tecnologia.
- O árbitro de vídeo é o melhor amigo dos árbitros, mas é evidente que ainda é preciso fazer alguns ajustes no protocolo da Fifa. Em lances factuais não teremos mais erros, por exemplo. O gol do Tévez, contra o México em 2010, onde ele estava cinco metros adiantado, ou o lance do Lampard contra a Alemanha, onde a bola entrou um metro e meio e não deram o gol. Esses lances não terão erros. Na Copa, vimos o pênalti no Salah onde o árbitro deu falta e viu na revisão que era pênalti.
Em um balanço já na reta final da Copa, o presidente da Fifa, Gianni Infantino, analisou o uso do VAR e apontou para bons números percebidos pela entidade quanto ao índice de acerto do árbitro de vídeo no Mundial. De acordo com o presidente da Fifa, o VAR checou mais de 400 lances nesta Copa. Destes, 19 foram submetidos a uma revisão da arbitragem, sendo que 16 decisões acabaram modificadas. Ponto também destacado por Simon.
- O VAR não está mudando o futebol, está tornando o futebol mais honesto, mais transparente. 95% das checagens já estavam corretas. Graças ao VAR passamos a 99,32%. Claro que batemos na madeira para os próximos jogos. Não é 100%, claro. Mas é 99,3%. Há algumas coisas que precisamos saber. O futebol é um esporte de contato. E nem todo contato é uma falta. E isso é uma interpretação do juiz. Ele viu no campo, ele vai olhar na tela se for preciso.
Por mais que o VAR apresente bons índices por possibilitar que o árbitro reveja lances por ângulos diferentes, uma questão citada por Infantino e ressaltada por Simon é a interpretação. Mesmo com a tecnologia, a decisão final tanto de solicitar o VAR quanto de categorizar as imagens revistas são papéis de um ser humano. Isso contribui para que, mesmo com o recurso, tenham ocorrido lances duvidosos, como afirmou Simon.
- O ponto é a interpretação. Algumas regras são interpretativas. Esses lances não serão consenso, mas a tecnologia veio para ficar, é uma tranquilidade a mais para o árbitro. Eu apitei por 27 anos no futebol e é bom ver que hoje temos isso. O árbitro pode estar cometendo um equívoco clamoroso, mas vê o vídeo e toma a decisão, ou não. É uma tranquilidade a mais.
Algumas modalidades, como vôlei e tênis, já estão mais acostumadas com o recurso da tecnologia. No vôlei, por exemplo, cada treinador tem direito a dois desafios por set, mantendo o pedido caso esteja correto quanto à sua reclamação. Para Simon, esse modelo pode ser uma ideia para servir de base para alguma aplicação do VAR no futebol, dadas as particularidades do esporte.
- A decisão final tem que ser do árbitro. Hoje em dia, esse é o protocolo. Ele decide, isso é essencial. Mas seria interessante um técnico ter um desafio por tempo. No primeiro tempo, um técnico gostaria de tirar um lance a limpo. Ele pode pedir e solicitar um desafio. Vejo com bons olhos de cada técnico ou capitão da equipe ter uma possibilidade de usar.
Além de dar ao árbitro a chance de checar lances, o VAR pode ainda auxiliar numa mudança de postura dos atletas em campo. Sabendo das 33 câmeras que observam cada um de seus movimentos, os jogadores passaram a ser cautelosos quanto a algumas atitudes durante o jogo, como alertou Simon.
- Nós tivemos 24 pênaltis e cerca de 445 lances avaliados pelo árbitro de video. A mentalidade do jogador tem que mudar. O lance do Mascherano contra a Nigéria é um pênalti que, com o VAR, não se pode cometer. O jogador vai começar a assimilar a simulação, é uma discussão que tem avançado. Vários jogos são salvos pelo árbitro de vídeo.
Com a experiência na Copa do Mundo e as recentes discussões dentro do futebol brasileiro, Simon apontou para as movimentações da implementação do VAR no contexto sul-americano e as expectativas para o Brasil. A ferramenta não foi aprovada para o Brasileirão pois a CBF não quis custear o seu uso, empurrando para os clubes, que não aceitaram.
- Na América do Sul, nós tivemos na Libertadores e na Recopa. Desde 2016, a Fifa autorizou algumas experiências pelo árbitro de vídeo. O Brasil estava no contexto, nós estamos no segundo semestre do calendário e não temos o VAR. Não sei como a CBF está equacionando essa questão. É evidente que tem que se dar um treinamento a esses árbitros, espero que isso esteja acontecendo.