Logo R7.com
Logo do PlayPlus

São Paulo goleou o Santos no 1º jogo profissional do Brasil; partida foi embrião da ida de Pelé para a Vila

E um dos artilheiros da partida pelo Tricolor levou o Pelé para o Santos 23 anos depois

História em Campo|Ivan BelmudesOpens in new window

Santos e São Paulo fizeram em 1933 o primeiro jogo profissional do Brasil Divulgação/Santos FC

O Sansão é um clássico que envolve muita grandeza, afinal falamos de dois dos times mais vitoriosos do Brasil. Hoje nossa viagem histórica será para o ano de 1933, quando o recém-criado São Paulo da Floresta goleou o Santos em plena Vila Belmiro, pelo primeiro jogo profissional da história do futebol brasileiro.

Mas não se engane, a derrota dolorosa traz um delicioso componente para os torcedores alvinegros: naquele jogo estavam dois dos principais responsáveis pelo Pelé jogar pelo Santos.

Predestinados para a grandeza

Pelé chegou ao Santos ainda na adolescência Divulgação/Santos

Existem times que nasceram predestinados para a grandeza. Poucos podem ostentar essa alcunha e um deles no Brasil, claramente, é o tricolor do Morumbi. Isso vem muito antes do time se tornar o primeiro e único clube tricampeão mundial do país: remonta da fundação do São Paulo. Podemos dizer que o time que surge como resultado da briga pelo profissionalismo no futebol paulista e brasileiro já nasceu gigante.

O mesmo podemos falar do Santos, simplesmente o time do Rei do Futebol, uma equipe que mesmo sendo sediada numa cidade do litoral, com pouco mais de 400 mil habitantes, por diversas vezes espantou o mundo com craques que encantaram com o futebol arte e ofensivo desde o início do século XX.


A luta pelo profissionalismo

Voltemos ao Tricolor e sua ligação com o profissionalismo. Na realidade, desde meados da década de 1920, muitos clubes ditos amadores já pagavam bonificações para atrair os grandes craques.

De amador o futebol tinha pouca coisa: um clube para ser campeão de um torneio como o Paulista necessitava de grandes benfeitores, que tornavam possível financiar as caras despesas da época. E, é claro, isso gerava um desnível entre os times com mais e os com menos recursos.


Com a popularização do esporte, a profissionalização se tornava cada vez mais urgente.

A união dos craques e o nascimento do Tricolor

Com a crescente discussão entre o profissionalismo e o amadorismo, os clubes se dividiram ainda mais em São Paulo e alguns deixaram de competir. Um deles foi a Associação Atlética das Palmeiras, clube alvinegro, cujo campo ficava na Avenida Angélica e que foi campeão Paulista dos anos de 1909, 1910 e 1915, que abandonou o esporte em meio a polêmica pela profissionalização em 1929.


Outro grande expoente que não podemos deixar de lembrar é o tradicionalíssimo Clube Atlético Paulistano, time da elite paulistana que foi 11 vezes campeão paulista, sendo a grande força dos primórdios do futebol no estado.

O clube também era ferrenhamente contrário à profissionalização do esporte e, em 1930, encerrou seu departamento de futebol com a unificação das ligas e a iminente guerra contra a manutenção do esporte amador.

Acontece que dirigentes e ex-jogadores dos departamentos de futebol dos dois grandes clubes resolveram se unir e pensaram em formar uma nova equipe. Para isso, reuniram inclusive as cores das agremiações: o vermelho e branco do Paulistano, com o branco e preto do AA Palmeiras, curiosamente as cores da bandeira do estado de SP. Surgia assim o São Paulo.

Paulistas na vanguarda e a força do Sansão

Desde 1930, os times passaram a se organizar em busca da profissionalização do esporte e enfrentavam forte resistência, inclusive do Governo Federal. Na época o Brasil vivia um turbilhão político e a ditadura da Era Vargas, o que culminou inclusive com a Revolução Constitucionalista de 1932 (o que renderia um capítulo à parte, mas existe ampla bibliografia sobre o tema).

Voltando ao futebol, em 1933, a APEA (Associação Atlética de Esportes Atléticos) rompeu de vez com a CBD (Confederação Brasileira de Desportos - antecessora da CBF) e se profissionalizou.

O marco desse rompimento foi um amistoso, que seria realizado no dia 12 de março daquele ano, na Vila Belmiro, entre o time do São Paulo da Floresta (recém-criado) e o Santos Futebol Clube, que há poucos anos encantou o país com o futebol do esquadrão caiçara dos 100 gols.

O nascimento do Peixe

Bem, o time do Santos estava longe de ser aquele dos melhores momentos de 1927. Também não era aquela equipe que dois anos depois conquistaria o primeiro título estadual alvinegro. Digamos que o Peixe estava numa entre-safra. Aliás, o apelido PEIXE surgiu nesse jogo.

Torcedores do São Paulo da Floresta que foram para Vila Belmiro, tentando provocar os santistas, chamavam os alvinegros de “peixeiros”, em alusão ao fato de estarem numa cidade litorânea. Pois o apelido pegou, ao invés de ofender, e é entoado com orgulho pelos torcedores santistas.

Humilhação Tricolor

Friedenreich foi um dos primeiros ídolos do São Paulo Reprodução/Redes Sociais

Sobre a partida? Foi um show de Friedenreich e companhia. O craque, primeiro futebolista a ser considerado ídolo nacional, foi o autor do primeiro gol profissional do futebol brasileiro. Waldemar de Brito (duas vezes) e Araken Patusca (duas vezes) também marcaram. Lagu foi o responsável pelo gol de honra para o alvinegro.

Ficha técnica

SANTOS 1 X 5 SÃO PAULO

Local: Vila Belmiro, Santos (SP)

Data: 12/3/1933

Árbitro: Sotero de Mendonça

Gols: São Paulo: Friedenreich, Waldemar de Brito (2), Araken (2);

Santos: Logu

SANTOS: Athiê, Garcia, Meira, Valdomiro, Bisoca, Alfredo, David, Armandinho, Catitu, Seixas e Lagu. Técnico: Francisco de Almeida

SÃO PAULO: Moreno, Iracino, Silvio, Orozimbo, Zarzur, Ferreira (Rapha), Patrício, Waldemar de Brito, Friedenreich, Araken e Onofre. Técnico: Clodô

Coincidências da bola

Agora, pense numa coincidência deliciosa. Dois jogadores presentes nessa partida foram peças fundamentais para que Pelé vestisse a camisa 10 do Santos.

O goleiro alvinegro neste jogo (sim, o camarada que tomou 5 gols do São Paulo) era simplesmente Athiê Jorge Coury, presidente que contratou e manteve o Pelé no Santos durante o período mágico do clube.

E Waldemar de Brito, o carrasco artilheiro que marcou dois gols para o Tricolor na goleada histórica em plena Vila Belmiro, foi o homem que levou o Pelé para o Peixe! Ele era técnico do Bauru Atlético Clube (BAC) na década de 1950, conheceu o franzino filho do Dondinho com a Dona Celeste e descobriu que ele era o Rei do Futebol.

Muitas histórias são contadas quando se fala de Pelé. Uma delas é de que foi nessa partida que Athiê e Waldemar ficaram amigos. Ao término do jogo, como bom esportistas que eram, foram para confraternização dos times - posso imaginar os dois numa resenha de fim de tarde, tomando uma cerveja em Santos, com aquele delicioso pôr do sol e cheiro de mar, talvez com algum tira gosto - isso só imagino. Licença poética para o nobre cronista.

Isso seria decisivo 23 anos depois. Não precisaram de muitas partidas pelo BAC para que Waldemar percebesse que Pelé era Rei, mesmo aos 15 anos. Enxergou nisso a oportunidade de mudar de vida. Era amigo e tinha a confiança da família do menino. (Pouco tempo antes dona Celeste negou a venda do passe de Pelé para o Bangu).

Troca de favores

Waldemar de Brito, ex-jogador do São Paulo Reprodução/Redes Sociais

Waldemar era funcionário público em Bauru e estava cansado da cidade do interior. Queria voltar para Capital, onde estava toda a família e amigos. Lembrou que um velho conhecido era presidente de um clube campeão paulista de 1955 e deputado estadual influente. Sim, era Athiê Jorge Coury, que já estava sabendo do jovem Edson e estava interessado no talento do menino.

Foi feito um acordo entre eles: caso o deputado conseguisse a transferência de Waldemar para Capital, ele convenceria a família do Pelé a assinar com o Santos.

Pois o deputado conseguiu (conta-se que para isso enganou o então governador Jânio Quadros - que assinou a transferência sem ler - após tomar alguns drinks, oferecidos pelo amigo e deputado, no Ilha Porchart Clube em São Vicente).

No dia 22 de julho de 1956, Pelé, com o pai Dondinho e Waldemar de Brito, chegou na Vila Belmiro, onde 23 anos antes o artilheiro Tricolor ajudou a compor a humilhante goleada na estreia do futebol profissional. O futebol tem dessas…

Waldemar de Brito

Pelo Tricolor, Waldemar jogou 138 partidas e marcou 56 gols. Ele atuou ainda no Palmeiras, com 15 jogos e 5 gols. Encerrou a carreira em Santos, pela Portuguesa Santista. Ou seja, sempre foi rival do Santos, em campo, até se tornar uma das pessoas mais importantes na história do clube, fora das quatro linhas, mesmo sendo carrasco dos santistas no primeiro jogo profissional da história do futebol brasileiro.

Últimas


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.