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Cosme Rímoli - Blogs

Por trás das lágrimas de Tardelli, o pior dos maus. A depressão

O gol salvador, do questionado atacante gremista, trouxe a revelação. O jogador, rotulado por suas farras, estava mergulhado na angustiante depressão

Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli

O agradecimento, o choro, o fim da agonia. Tardelli enfrentando a depressão
O agradecimento, o choro, o fim da agonia. Tardelli enfrentando a depressão

São Paulo, Brasil

Jogador de futebol na China é tratado de forma especial. Com admiração, reverência, respeito. Em fase ruim, o atleta pode até sair do clube. Mas tudo é feito de maneira discreta, sem exposição pública.

É uma questão cultural.

Diego Tardelli é um nômade. Em 16 anos de carreira como profissional, faz do Grêmio o seu 11º clube. 


Aos 34 anos, foi a mais cara aposta da diretoria, na obsessão pelo tetracampeonato da Libertadores da América e pelo bicampeonato mundial.

Teve o privilégio de fechar o contrato que queria. De três anos. Salário de R$ 1 milhão no primeiro. E R$ 1,2 milhão nos dois últimos. Mas seu currículo problemático foi levado em consideração. Salário integral só se atuasse por pelo menos 60% das partidas. 


Suspensão, perda de posição, suspensões não seriam perdoadas.

O jogador já relutou diante da desconfiança.


Mas tudo ficaria pior por seu início no clube. A imprensa gaúcha acostumada com contratações menos midiáticas no atual Grêmio prestou atenção. Havia Jael, jogador tosco em campo e de opiniões simples. Adorado pelo grupo. Mas, com a chegada de Tardelli, foi despachado para o futebol japonês, atuar no FC Tokyo.

A cobrança foi imediata e pesada. 

Tardelli mesmo sem entrar em campo já havia sido 'acusado' de rachar o elenco. Por conta de seu salário milionário. Depois, foi dito que ele e Luan não se suportava.

E que Renato Gaúcho havia discutido feio, o cobrado de forma pesada diante de todo o grupo, por seu fraco futebol.

Tudo isso exposto em jornais, rádios, televisão, portais.

O atacante havia passado quatro anos no Shandong Luneng, tratado com todo o respeito de um jogador internacional, que vestiu a camisa da Seleção.

O choque cultural entre o estilo chinês e o brasileiro atingiu em cheio o atleta.

Perdeu a vontade de treinar, queria desistir, sair do Grêmio, do país.

Virou reserva, afastado dos jogos por Renato Gaúcho, que não via reação do atacante.

Tardelli entrou em depressão.

E tudo ficou ainda pior com a cobrança pública do próprio presidente do Grêmio, Romildo Bolzan, ele também muito cobrado por conselheiros do clube e pela imprensa pela aposta no atacante.

"Estamos chegando a um ponto em que está na hora de decidir. O jogador tem que dar a resposta, tem que dizer se quer ficar ou não quer ficar. E como quer ficar. Se não quiser, não é problema nenhum. Só nos avisa."

O últimato foi em coletiva.

Era o tudo ou nada.

Tratado, com reverência, por quatro anos na China. Sentiu a diferença no Brasil
Tratado, com reverência, por quatro anos na China. Sentiu a diferença no Brasil

A situação era ainda pior pela fama de boêmio que o jogador cultuou por grande parte de sua carreira.

A desconfiança era generalizada em Porto Alegre.

Mas o caminho para entende o atacante era outro.

Tardelli procurou Renato Gaúcho e explicou o que estava passando. Estava mal psicologicamente. Houve até choro. O treinador percebeu o quanto Tardelli precisava de apoio, de confiança, de autoestima.

"Passei por um momento muito triste, conturbado nestes últimos quatro meses. Vim de uma cultura totalmente diferente. Você não está acostumado com críticas, mentiras. Acaba magoado."

Renato desempenhou o seu lado psicólogo e apoiou sua maior aposta.

Porém foi sincero.

Jogaria quem estivesse melhor. 

Só que o desempenho do ex-atacante santista nunca deslanchou. E a diretoria, a pedido de Renato, está contratando Luciano, ex-jogador do Corinthians, que estava no Fluminense.

A situação de Tardelli estava cada vez pior.

Mas o futebol oferece a consagração ou a depressão em cada partida.

E a redenção veio ontem, quando o Grêmio, com apenas dez em campo, depois da expulsão de Geromel, empatava com o Libertad.

O resultado do primeiro jogo das oitavas-de-final da Libertadores era péssimo.

Tardelli assistia tudo do banco.

Até que aos 17 minutos, Renato decide tirar o meia Jean Pierre e apostar no atacante. A substituição foi vista como desespero. 

A desconfiança dominava a arena gremista.

Só que o jogador entrou em campo diferente, confiança, sem medo de errar.

Aos 25 minutos, veio a recompensa.

Em um escanteio, com a área superpovoada, com esforço, Kannemann desvia a bola e ela chega até Tardelli. Sua técnica apurada se sobressai naquele décimo de segundo, e o voleio estufa as redes de Martin Silva.

Foi apenas o terceiro gol em 16 partidas.

O mais importante desde a sua contratação.

Com os paraguaios abertos, David Braz, que entrou no lugar de André, para compor a defesa, marcou o segundo gol.

E o Grêmio deu um passo gigantesco para ficar com a vaga.

Mas em meio à toda a festa, a revelação de Tardelli trouxe questionamentos importantes.

Acuado com tantas críticas e questionamentos, veio a depressão para Tardelli
Acuado com tantas críticas e questionamentos, veio a depressão para Tardelli

Primeiro, em relação ao choque cultural que os jogadores enfrentam quando trocam de países. Não é uma situação simples, fácil. Principalmente voltar.

Segundo e, cada vez mais relevante, a depressão.

Os clubes precisam levar a sério o lado psicológico dos jogadores.

A depressão é o mal do século XXl. 

Em todas as áreas.

Tardelli pode ter sido baladeiro, festeiro, arruaceiro, amadurecido. Levado a sério seu casamento, sua família, sua profissão. Pode estar milionário, com sua vida financeira definida até a velhice. Ter imóveis, carros, patrimônio.

Mas isso não o protegeu da melancolia, da tristeza mais profunda, da falta de motivação não só para jogar, mas para viver. 

A depressão é algo muito sério.

E que, de maneira ignorante, o futebol finge não existir.

Tardelli, Nilmar, Pedrinho, Cicinho, Thiago Ribeiro e até Ronaldo Fenômeno assumem terem sucumbido.

Mas inúmeros outros atletas escondem ou nem sabem o que vivem.

Os clubes e até a Seleção Brasileira precisam levar a sério a psicologia esportiva.

Viver anos e anos competindo, sendo julgado, criticado, aceito, rejeitado é algo que exige demais dos atletas.

Eles precisam de apoio profissional.

Não só para os músculos e alimentação.

Mas psicológico.

Se não seguirão sendo alvos fáceis da depressão...

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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