‘Por dinheiro, o Santos desmanchou aquele time maravilhoso, campeão de 1978. Se ficássemos juntos, ganharíamos muito mais títulos!’ Exclusiva com o genial Ailton Lira
Um dos maiores meias da história do Santos. Inteligente, com visão de jogo diferenciada. E exímio lançador, cobrador de falta. E humilhava os goleiros cobrando pênaltis. “Nunca pensei que o Santos fosse ser rebaixado”

Saudade para o torcedor do Santos tem nome e sobrenome.
Ailton Lira.
“É incrível. Saí do Santos há 45 anos, mas onde vou sou tratado com enorme carinho, respeito, admiração. Os santistas me abraçam, pedem foto, autógrafos. Eu fico muito feliz por não ter sido esquecido. E até acho um pouco de exagero”, confessa o ídolo.
Ele segue sendo muito humilde.
Foi um dos melhores e mais cerebrais meias do futebol brasileiro.
“Era ‘sacanagem’ jogar com o Ailton Lira. Ele tinha uma visão de jogo espetacular. E metia a bola onde queria. Era habilidade pura. Ele dominava a bola e eu já saía correndo no meio, o Nilton Batata e o João Paulo abriam pelas pontas.
“A defesa adversária ficava desesperada. Sabia que um de nós três iria receber a bola livre. O Lira era genial.”
A definição é de Juary.
Lira, Batata, João Paulo, Juary. E mais o auxílio de luxo de Pita. O Santos de 1978, que ganhou o Campeonato Paulista, era uma equipe espetacular. Tinha tudo para fazer história.
“Mas a direção do Santos se apressou e começou a desmanchar o time, por dinheiro. A nossa equipe era para durar uns 10 anos, trocando peças com calma. Iríamos ganhar muitos títulos”, diz, com firmeza, Ailton.
Ele chegou tarde para um grande time. Revelado pela Ponte Preta, teve pela frente, disputando posição, o maior jogador da história do clube de Campinas: Dicá.
‘Uma pena que não pensaram em nos colocar juntos, como o Formiga, me colocou com Pita. Eu e o Dicá daríamos muito certo juntos. Eu admirava muito o Dicá. Era um jogador espetacular“, assume.
Cansado da reserva, foi para a Caldense.
‘Era o terceiro clube de Minas Gerais. Acabei ficando quatro anos por lá.’ Se tornou o melhor de todos os tempos da equipe de Poços de Caldas, mas era muito pouco mérito para tanto talento.
Chegou no Santos com 25 anos e meio.
Em 1976, quando o clube estava mergulhado em grande crise. Por falta de dinheiro, e pressionado pela despedida do clube, de Pelé.
“A diretoria ia contratando promessas e mais promessas. Chegamos a ter mais de 40 jogadores.”
Mas logo sua maestria com o pé esquerdo foi notada. Assim como seu talento excepcional para bater na bola. Lançamentos, faltas e pênaltis eram motivo de empolgação para a torcida.
Contra a Ponte Preta, ele chegou a ter seu nome gritado pela torcida, antes de bater na bola. Ele teve de cobrar a falta. E, lógico, para a cena ser histórica, marcou o gol.
O Santos o desperdiçou logo. Após vencer o Paulista de 1978, quebrando o incômodo jejum de cinco anos sem título, Lira seguiu jogando muito bem. Por um triz não disputou a Copa do Mundo de 1978.
Cláudio Coutinho também o desperdiçou, na época cedendo ao bairrismo, ao protecionismo aos clubes cariocas.
Humilde, companheiro, ele decidiu passar a sua camisa 10 para Pita.
“Dei, falando: você é mais 10 que eu. Me dá a 8.”
E essa dupla maravilhou os torcedores de todos os clubes de São Paulo. Dois canhotos habilidosos, tendo a proteção do espetacular Clodoaldo.
É para chorar de saudade, mesmo.

O São Paulo o comprou em 1980. Disputou apenas o primeiro turno do Paulista, que o clube venceria.
O Al Nassr decidiu comprá-lo e foi fazer história no mundo árabe. Ganhou muito dinheiro. Mas ficou longe dos holofotes brasileiros. Voltou em 1982 para o Guarani. Mas contusões acabaram por atrapalhar seu final de carreira.
Tentou ser treinador.
‘Mas os esquemas de empresários não são para mim. Muita coisa pesada acontece. Já na base dos clubes. Com pais oferecendo dinheiro para os treinadores. Porque querem que seus filhos tenham vagas nos clubes. Sou uma pessoa honesta. Não quis seguir, não.“
Aos 74 anos, ele é o corintiano mais santista deste país.
“Virei corintiano por conta da minha mãe. Mas amo o Santos. E sofri muito com seu rebaixamento. Nunca imaginei que isso fosse acontecer. E torço muito para que não caia de novo. Mas eu entendo o porquê de o Santos estar nesse estágio. Muitas administrações ruins. Um dia iria refletir.“
Quanto ao Corinthians, Ailton Lira mostrava sua torcida de garoto de maneira especial.
“Fazia gols contra o Corinthians. Era a minha homenagem. O Tobias sofreu...”, sorri.
Mas sua grande ‘rivalidade’ era com Valdir Peres.
“Ele era meu grande amigo. Jogamos juntos na Ponte Preta. E ele sempre tentava me sacanear nas faltas, nos pênaltis. Me provocava, falava que iria pegar. Mas eu ia, com toda tranquilidade, e fazia os gols. Fui muito feliz no Santos.”
E a torcida santista foi muito feliz com o genial Ailton Lira.
Pena que esse casamento teve a velocidade de uma miragem.
Inesquecível miragem...
A entrevista completa, e exclusiva, com Ailton Lira está no canal do Cosme Rímoli, no youtube.
Toda terça-feira há um personagem importante ligado ao esporte.
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