O primeiro erro grave de Ancelotti, que lembrou Tite. Tentar recuperar Paquetá. E impedir que a Seleção terminasse 2025 confiante, vitorioso
Ancelotti não permitiu que Estêvão, o melhor jogador contra a Tunísia, cobrasse o pênalti que poderia dar a vitória ao Brasil. Mandou que Paquetá, inocentado pela investigação de envolvimento em apostas, cobrasse. Ele isolou a bola. Fim de jogo, 1 a 1. ‘Veio a ordem’, disse Estêvão, constrangido

Carlo Ancelotti tomou uma atitude que lembrou Tite.
O ex-treinador da Seleção adorava agradar os jogadores.
Mesmo indo contra a filosofia que pregava.
O maior exemplo foi se prestar a imitar um pássaro, em plena oitava-de-final da Copa do Mundo do Catar, depois de um gol de Richarlison contra a Coréia do Sul.
Zlarko Dalic, técnico da Croácia, pegou a imagem de Tite bailando e mostrou aos seus jogadores, que viram a comemoração precoce. Dalic insistiu com seus atletas que era menosprezo do Brasil aos croatas, adversários das quartas-de-final.
A Croácia ganhou o incentivo a mais que precisava e eliminou o Brasil. Com a colaboração da ‘dança do Pombo’, de Tite.

Em Lille, hoje, Ancelotti teve atitude parecida.
Não dançou, mas não agiu como um treinador frio, calculista, vencedor que é. Mas teve atitude paternal.
O Brasil sofria contra os tunisianos, muito bem treinados, com sistema de marcação excelente, 5-4-1, travando as ações ofensivas. E empurrados pelos africanos que vivem na França, palco do último amistoso do Brasil em 2025.
O jogo estava empatado em 1 a 1.
Mastouri havia feito 1 a 0 para a Tunísia.
O gol do Brasil foi de Estêvão cobrando pênalti, depois que Bronn cortou escanteio com o braço. O garoto de 18 anos, melhor em campo, bateu forte, cruzado, deslocando Dahmen.
A partida seguia equilibrada, até que Vitor Roque tomou a bola de Sassi na grande área. O zagueiro o segurou. Pênalti.
Eram 32 minutos do segundo tempo.
Estêvão ia para a bola.
Ia.
Porque do banco de reservas veio a ordem de Ancelotti para o capitão Marquinhos.
“Paquetá, Paquetá”, disse o italiano.
Não havia a menor lógica esportiva para a escolha.
Só emocional.
O meio-campista havia sido inocentado da acusação de manipulação de apostas. Foram três anos de investigação. A sua imagem foi afetada. Deixou de ser contratado pelo Manchester City, de Guardiola, pela acusação.
Além disso, perdeu a posição de titular na Seleção para Bruno Guimarães.
A escolha de Ancelotti surpreendeu o próprio Paquetá.
E frustrou Estêvão.

O meio-campista decidiu enfeitar a cobrança.
Deu um pulinho antes de bater.
Queria deslocar Dahmen. Só que o goleiro tunisiano ficou parado no meio do gol. E Paquetá se enervou e bateu forte na bola, longe, por cima do travessão.
O lance foi um banho de água fria na Seleção.
E o Brasil jogou fora a maior chance de terminar 2025 com inédita série de duas vitórias em uma data Fifa, já que havia vencido o Senegal.
Ancelotti se sentiu pela primeira vez pressionado na coletiva. O clima de insatisfação dos jornalistas era evidente.
Sua desculpa para escolher Paquetá beirou o constrangimento.
“Paquetá é o cobrador de pênaltis. Quando chegou o segundo pênalti, eu mudei porque pensei que ia tirar um pouco de pressão do Estêvão e o Paquetá geralmente cobra muito bem.”
No dia 29 de junho de 2024, contra o Paraguai, pela Copa América, Paquetá já havia cobrado para fora um pênalti.
A pureza dos 18 anos de Estêvão aflorou quando ele foi perguntado porque não cobrou o segundo pênalti.
“Estava com muita vontade de bater. Mas veio a ordem e dei (a bola) para o meu companheiro (Paquetá.).”

Paquetá, que não esperava a ordem de Ancelotti, teve de explicar o motivo pelo qual perdeu o pênalti.
“Fico triste em não ter conseguido marcar e não ter ajudado a Seleção, a gente provavelmente venceria depois daquele pênalti. Estou muito habituado a fazer no meu clube, tenho grandes acertos, mas não esperei da maneira que espero.
“Ansiedade de fazer o gol acabou prejudicando um pouco. Vou tentar me colocar nessas circunstancias para evoluir nesse sentido para converter na próxima oportunidade e ajudar a equipe.”
Ancelotti, sentindo o clima de decepção, pelo empate, deu sua visão da partida.
“Tivemos um jogo muito mais difícil contra a Tunísia. Tínhamos falado que a Tunísia tem características diferentes, defende com um bloco muito baixo e pela nossa característica, dos jogadores que temos na frente, é mais complicado abrir essas defesas.
“Começamos o jogo mal, aos poucos reagimos, poderíamos ganhar e no segundo tempo, diante das dificuldades de poucos espaços, fizemos a partida que deveríamos fazer.”
O Brasil teve três mudanças em relação à ótima partida contra Senegal. Bento entrou no gol, no lugar de Ederson. E se mostrou muito inseguro, nervoso. Trouxe tensão à zaga.
Wesley entrou na lateral direita.
E foi mal demais.
Falhou no primeiro gol e deveria ter sido expulso, por duas faltas duras. Tomou o amarelo. Comprometeu a defesa.
Militão jogou como zagueiro, já que Gabriel Magalhães foi cortado. Estava bem na partida, até pedir substituição, contundido. E Caio Henrique entrou na vaga de Alex Sandro. E também mostrou fraco futebol, burocrático, sem ofensividade.
As laterais são problemas graves para o Brasil.
Ancelotti já tem a base de atletas que convocará para a Copa. Deixou claro isso, hoje, outra vez.
“Muitos jogadores estão certos na lista. Faltam alguns, mas a lista está bastante completa. Faltam dois amistosos, mas seis meses de jogos onde tudo pode acontecer. O calendário é muito exigente e o risco de lesão é muito alto.
“Então, acho que a equipe, o ambiente, estão no caminho correto para chegar no mais alto nível na Copa do Mundo. Tenho muita confiança nesta equipe e nesses jogadores, acima de tudo neste ambiente que é bom.
“Os jogadores são sérios, são profissionais, são patriotas, têm muito carinho pela camiseta e isso é muito importante.”

Ancelotti completou seu oitavo jogo na Seleção.
Foram quatro vitórias, dois empates e duas derrotas.
Se o Brasil não termina 2025 com um triunfo, a culpa é sua.
Que no próximo ano, ele aja mais como treinador.
E menos como pai dos jogadores.
Não se submeta a nova ‘dança do Pombo’, como hoje...
