No sonho do tetra da Libertadores, o Palmeiras terá um inimigo íntimo: Felipão, na sua última batalha. Com o surpreendente Athletico
A três meses de completar 74 anos, Felipão conseguiu montar um vibrante e corajoso Athletico, que venceu o Estudiantes, na Argentina. Disputará com o 'seu' Palmeiras, o direito de chegar à final da Libertadores
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
"Para mim, que já tenho a minha ida terminada no fim do ano praticamente, digo que foi uma das vitórias mais emblemáticas de toda a minha carreira."
"Estou muito contente, muito satisfeito em terminar como a gente está terminando (a carreira). É muito bom, só tenho a agradecer esse pessoal."
"O que vou dizer (sobre o futuro)?"
"Dificilmente vou continuar (como treinador). Se eu conseguir mais algum título com esse grupo, e nós vamos conseguir, está na hora de terminar também."
"A família está pedindo isso. Acho também que, com 73, 74 no fim do ano, não é que pese, mas deixa a gente cansado demais naquele banco, brigando com esse pessoal."
"Acredito eu que, 95%, termino no fim do ano. A gente coloca alguém da comissão como técnico e vai ficar por fora, se continuar. Não sei se minha família vai ainda deixar."
"Vontade a gente tem..."
Cansado, esgotado, mas orgulhoso, Luiz Felipe Scolari viveu mais um momento de glória, nesta madrugada na Argentina.
Inesperado, como vários.
E o Palmeiras terá seu inimigo mais íntimo.
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Felipão conseguiu a façanha de classificar o Athletico Paranaense para a semifinal da Libertadores, com uma vitória épica, diante do Estudiantes, estádio Jorge Luis Hirschi, em La Plata, na Argentina por 1 a 0, gol de Vitor Roque.
Aos 50 minutos do segundo tempo, Vitinho, de 23 anos, cruzou para o garoto de 17 anos se antecipar, sem medo do choque, ao goleiro Andújar, e toca de clavícula para as redes argentinas.
1 a 0, Athletico.
O Estudiantes, de Ricardo Zielinski, era o grande favorito do confronto das quartas de final, depois do empate em 0 a 0 na Arena da Baixada. O time argentino não havia perdido nenhuma partida no seu estádio, pelo contrário, só havia vencido. Mas perdeu para o time de Felipão.
Foi a sexta vez que levou uma equipe à semifinal da Libertadores.
Duas com o Grêmio e três com o Palmeiras.
O treinador está a três meses de completar 74 anos.
Ele ganhou seis títulos pelo Palmeiras.
Uma Libertadores, um Brasileiro, duas Copas do Brasil, uma Mercosul e um Rio-São Paulo.
Foram três passagens pelo clube paulista.
A última provocou grande mágoa no treinador.
Após conquistar o Brasileiro de 2018, ele estagnou. Ficou preso ao mesmo esquema tático e 2019 foi decepcionante, sendo demitido após constrangedora derrota por 3 a 0 para o Flamengo.
O ex-presidente Mauricio Galiotte mandou o executivo Alexandre Mattos demitir Felipão. Mattos relutou, mas não houve salvação.
A diretoria palmeirense acreditava que o treinador não havia conseguido se atualizar, se renovar. Daí sua dispensa, sem o menor constrangimento.
Felipão teve passagem apagada na segunda divisão com o Cruzeiro, em 2020. Não conseguiu levar o time para a Série A. E na quarta vez que assumiu o Grêmio, encaminhou o rebaixamento do clube, em 2021.
Mas renasceu no Athletico Paranaense, com o respaldo de Mario Celso Petraglia, e de Alexandre Mattos. Embora tenha sido convidado para ser diretor-técnico e treinador temporário, Felipão conseguiu reestruturar o péssimo trabalho de Fabio Carille.
Tratou de seguir a velha forma. Montou uma equipe conservadora, ortodoxa quando joga fora dos seus domínios. Variando do 4-1-4-1 para o 3-6-1. Mas incendeia a Arena da Baixada, organizando o Athletico no 4-3-3, marcando por pressão o time adversário. Com o incentivo alucinado da empolgada torcida rubro-negra.
Foi assim que conseguiu esta campanha histórica, levando o clube à semifinal, depois de 17 anos.
Felipão assumiu o time com apenas quatro pontos em quatro partidas na fase de grupo da Libertadores. Carille saiu após o Athletico ser goleado por 5 a 0, na Bolívia, diante do The Strongest.
Felipão tratou de estruturar o elenco, apostar na intensidade, na vibração, na luta por espaço. Com muita marcação e contragolpes velozes, em bloco. Seu time venceu, na Arena da Baixada, o líder do grupo. O Libertad, do Paraguai, por 2 a 0, no jogo que valia a sobrevivência. Depois goleou o Caracas, por 5 a 1.
Depois, teve pela frente o mesmo Libertad, nas oitavas. Ganhou por 2 a 1 na Arena da Baixada. E, em Assunção, conseguiu segurar o heróico empate em 1 a 1. Veio a classificação para as quartas. E os confrontos diante do Estudiantes. O sofrido 0 a 0, depois de os paranaenses massacrarem os argentinos, mas não conseguirem marcar.
E a vitória de ontem, depois de muito sufoco, troca de provocações, ameaças de brigas. Com seus jogadores aplicados, lutando do primeiro ao último minuto, sem medo. E muito organizados. De marcação aguerrida, disposta a travar o voluntarioso Estudiantes.
Com a liderança impressionante de Fernandinho, que impunha respeito ao petulantes argentinos.
Tudo levava a crer que o jogo seria decidido nos pênaltis, após novo 0 a 0.
Felipão não quis começar a partida com Vitor Roque, sensação athleticana. Quis poupar o jogador de 17 anos para o terço final do jogo. Ele entrou aos 14 minutos do segundo tempo, no lugar de Canobbio. O técnico septuagenário colocou Vitinho na vaga do brigador Cuello, aos 36 minutos.
E o Athletico segurava o 0 a 0, com muita luta e vários sustos, inclusive a anulação de um gol legal dos argentinos. Lollo completou para as redes, depois de a bola cabeceada por Rogel beijar a trave. O árbitro Esteban Ostojich anulou de forma equivocada o lance. Alegando que Morel, em impedimento, atrapalhava o goleiro Bento. O que não era verdade. O lance aconteceu aos 17 minutos do segundo tempo.
33 minutos depois, Vitinho conseguiu encontrar espaço pela esquerda e conseguiu ótimo cruzamento para Vitor Roque, que se antecipou ao Andújar. Ele queria cabecear, mas foi sua clavícula esquerda que empurrou a bola para o gol.
Felipão ficou histérico, parecia ter 22 anos, comemorando a vantagem no placar, aos 50 minutos do segundo tempo. Ele sabia que a vaga para a semifinal estava garantinda.
E foi assim que garantiu o confronto com o Palmeiras.
O clube que garantiu a primeira conquista da Libertadores, em 1999. Há 23 anos.
Diante do melhor treinador deste país, Abel Ferreira.
Serão confrontos como Felipão sempre adorou.
Entrar como zebra, com o favoritismo do outro.
Dando o elemento com que incendeia seus jogadores.
A 'sua família'.
A raiva.
A vontade de mostrar que todos que desprezam seu time vão pagar.
Esse erro o Palmeiras de Abel Ferreira promete não cometer.
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