Nem Jair servia para o Santos. Nem o Santos servia para Jair
O clube errou ao contratar um treinador defensivo. E o técnico errou ao acreditar nas promessas de que teria um grande elenco. Desfecho inevitável
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
A diretoria santista desperdiçou valiosos 40 dias de trabalho.
E acaba de fazer o que desejava desde antes da Copa do Mundo: demitir Jair Ventura.
O presidente José Carlos Perez mostrou total falta de rumo. O dirigente foi quem decidiu contratar o então treinador do Botafogo, pelo sucesso que havia feito, em 2016 e 2017, no clube carioca.
Sem recursos, Jair conseguiu montar uma equipe extremamente competitiva.
Fugiu aos padrões, à tradição, ao histórico toque de bola botafoguense. Apostou na marcação forte, até exagerada no meio de campo. E contragolpes velozes. Muitas jogadas ensaiadas em escanteios e faltas laterais.
Foi um assumido defensor da efetividade.
Não da beleza do futebol.
O filho do grande ídolo Jairzinho impressionou o futebol nacional ao levar o Botafogo à Libertadores. Mesmo com um elenco fraco individualmente.
Renovou, em 2017, contrato por dois anos.
Mas não resistiu à sedução de Perez. O recém-eleito presidente santista oferecia a Jair a entrada pela porta da frente no rico futebol paulista. O treinador sabia que o Botafogo não ofereceria nada diferente em 2018, a não ser jogadores com potencial no máximo mediano. E o objetivo seria lutar para não ser rebaixado.
O presidente santista pagou a multa de R$ 800 mil para a liberação do técnico.
Só que Jair não percebeu onde estava chegando. Se deixou levar pelas promessas do novo dirigente santista. O clube da Vila Belmiro tem perto de R$ 400 milhões em dívidas. E também não mostrava a mínima condição de montar um time muito melhor do que o de General Severiano.
Ou seja, seria um trabalho muito mais difícil. Porque, ao contrário que acontecia na equipe carioca, ele não tinha a menor raiz com o clube do litoral paulista.
Encontrou um elenco saído do desmanche. Com uma safra fraca nas categorias de base, com a exceção de Rodrygo. Com dirigentes sem dinheiro ou competência para buscar sequer um meia esquerda talentoso.
Jair tratou de tentar fazer o que sabia.
Montou um time fechado, especialista em defender, sem o tal DNA ofensivo, que os conselheiros e as pessoas que sustentam politicamente Perez reclamavam. O treinador de 39 anos respondia que não tinha outra alternativa.
Não iria montar uma equipe aberta, trocando passes, atuando no 4-3-3 ou 3-4-3, como muitos desejavam. Não havia material humano capaz de garantir que o clube não flertaria com a Segunda Divisão.
Foi eliminado do Paulista na semifinal, perdendo nos pênaltis, para o rico Palmeiras. Na Copa do Brasil, classificou a equipe para enfrentar, como zebra, o Cruzeiro, pelas quartas.
Mas antes da Copa do Mundo, a reclamação na Vila Belmiro era imensa. Conselheiros e membros das organizadas cobraram a demissão de Jair Ventura, alegando que o time atuava como equipe pequena. E não sabia atacar. O treinador conversou várias vezes com o presidente e explicou que era o que poderia fazer. Esperava reforços para poder montar uma equipe mais ofensiva.
Só que até o próprio Perez dava razão aos conselheiros. Não se mostrava mais à vontade na defesa da continuidade do treinador. Ouviu inúmeros pedidos para que aproveitasse a folga na Copa do Mundo e mudasse o técnico do Santos.
Mas o dirigente pensou na multa contratual e também na desmoralização de admitir um erro tão grande, logo nos seus primeiros dias como comandante santista.
Sabia que os R$ 172 milhões da venda de Rodrygo para o Real Madrid começariam a chegar.
E viabilizariam contratações.
Foi assim que o fechou com meia costarriquenho Bryan Ruiz , enquanto o polivalente meio-campista Carlos Sánchez e o atacante paraguaio Derlis González.
Só que o técnico não teria tempo para utilizá-los.
O Santos seguiu uma equipe absolutamente defensiva.
Depois da Copa, empatou com o Palmeiras.
E não passou do 0 a 0 contra a Chapecoense.
Perez não suportou à pressão pela demissão do treinador.
A 15ª colocação, a um ponto da zona do rebaixamento, pesou.
O dirigente mandou embora, como garantiu que não faria.
A passagem de Jair Ventura na Vila Belmiro foi fraca.
39 jogos apenas.
14 vitórias, 10 empates e 15 derrotas.
Aproveitamento de 44,4%.
Foi o melancólico final de um erro de mão dupla.
Jair Ventura errou no clube.
E o Santos errou de treinador.
Agora, no mesmo dia da demissão, a surpresa.
Apresenta Ricardo Gomes como treinador.
Ou seja, tudo já estava amarrado.
Constrangedor...
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