Doha, CatarCesar Menotti. Carlos Billardo. Alejandro Sabella. Três treinadores importantíssimos para o futebol argentino. Reverenciados. O trio tem um grande feito. Levado a Argentina a quatro decisões de Copa do Mundo. Em 1978, Menotti. Em 1986 e 1990, Billardo. E, em 2014, Sabella. Menotti e Billardo ganharam duas, 1978 e 1986. E, agora Lionel Scaloni, conseguiu fazer com que seu país chegasse à quinta final. O jogo será no domingo, contra a França, no Lusail Stadium, aqui em Doha. "Não posso me comparar com eles. Eles são história da Seleção. Fizeram grande (respeitada) a camiseta da Argentina. Sim, me enche de orgulho estar na final e representar a Seleção. Mas não posso me colocar à altura de pessoass que fizeram história no futebol mundial, não só com a Argentina", admitiu, com humildade, Lionel Scaloni, logo após garantir a Seleção na final da Copa do Mundo do Catar, vencendo por 3 a 0 a Croácia, país que eliminou o Brasil. Ele chorou muito, abraçado a Messi, depois da partida. Tinha motivos para não acreditar no que estava vivendo. Aos 41 anos, a história de Scaloni na Seleção Argentina chega a ser surreal. Não usa terno, prefere calça de agasalho e camiseta, não tem carisma. E mora na Espanha! Ele foi um lateral direito esforçado, com carreira mediana. Marcador, extremamente tático. Começou no Newell's Old Boys, passou pelo Estudiantes, La Coruña, West Ham, Racing, Lazio, Mallorca e Atalanta. Amigo de Jorge Sampaoli, foi chamado pelo treinador para ser seu segundo auxiliar no Sevilla, em junho de 2017. Depois de vários técnicos recusarem a Seleção Argentina, Sampaoli foi chamado pela AFA. E foi para a Rússia, Scaloni seguiu sendo um mero segundo auxiliar. A Argentina fracassou no Mundial, sendo eliminada pela França, por 4 a 3, nas oitavas-de-final. O presidente da AFA, Claudio Tapia, demitiu Sampaoli. E ofereceu o cargo a Mauricio Pochettino. Ele estava no Tottenham. Não pensou duas vezes em recusar. Diego Simeone também não quis largar o Atlético de Madrid. Gerardo 'Tata' Martino preferiu seguir trabalhando no Atlanta United, nos Estados Unidos, e depois acertar com a Seleção Mexicana, a voltar à Seleção Argentina. A imprensa e grande parte da população pediam para que Marcelo Gallardo assumisse o selecionado. Acontece que o então treinador do River Plate era um ferrenho inimigo da AFA. Reclamando do calendário, do estado dos gramados dos estádios, das arbitragens, das datas-Fifas. Ou seja, Tapia sabia que Gallardo seria um grande problema como treinador da seleção. Por coincidência, logo após o Mundial da Rússia, haveria um torneio sub-20, na Espanha. Tapia decidiu mandar Scaloni, já que ele tinha muita vontade de seguir trabalhando na AFA. A intenção era se preparar, treinar garotos, para assumir a carreira de técnico de profissionais em alguns anos. Acontece que a Argentina ganhou o torneio Cotif, em Valencia. O trabalho de Scaloni foi ótimo. Tapia decidiu que, diante do cenário, seria o treinador interino ideal. Até que o presidente da AFA encontrasse um técnico mais vivido, com prestígio internacional. O alvo era Pochettino. Mas ele se mantinha firme, não queria. Scaloni não ficou de mãos amarradas, tratou de conquistar a confiança do elenco argentino, traumatizado com o egocentrismo de Sampaoli. E foi muito claro com Lionel Messi, disse o quanto a Seleção Argentina dependia dele. E tratou de montar um esquema onde ele era preservado. Os outros jogadores correriam, por prazer, pela grande estrela argentina. Messi era massacrado pelas cobranças, comparações com Diego Maradona. A população queria ver o homem que ganhou seis vezes a Bola de Ouro como melhor do mundo atuando tão bem pela Argentina. Não só por clubes. Foi com Scaloni que a Argentina foi terceira colocada na Copa América de 2019, mas o time foi 'pegando liga', ganhando amistosos, Messi cada vez mais integrado, líder. Entendendo que seu país poderia surpreender na Copa do Mundo do Catar. Tapia foi ficando contente com o trabalho de Scaloni. Tudo ia bem até que veio a Copa América do Brasil, no ano passado. E ficou tudo muito melhor, com a conquista do título em pleno Maracanã lotado. Com o time de Tite completo, com Neymar em campo. A última conquista era a Copa América, de 1993. Foi quando Scaloni ganhou o apoio popular e da mídia. Os argentinos passaram a perceber seu trabalho. A maneira intensa que o time passou a jogar, preenchendo os espaços, dando botes mortais nos contragolpes. E o quanto Messi passou a render, privilegiado taticamente, para quando a bola chegasse aos seus pés ele estaria pronto para mostrar sua genialidade, mesmo aos 35 anos. O time ficou 36 partidas sem perder. Até que caiu diante da Arábia Saudita, na estreia na Copa do Mundo. "Foi o jogo que nos despertou. Entendemos que temos potencial para pensar em grandes conquistas. Mas que tínhamo de nos entregarmos de corpo e alma em todos os jogos. E foi o que fizemos desde a nossa estreia. Por isso não perdemos mais e estamos na final da Copa do Mundo", resume Scaloni. Ele chega à final da Copa sem jamais ter treinado um clube. Algo inédito no futebol da Argentina. Scaloni tem um grande defensor. O maior que poderia ter. Messi. "Lionel não deixa nada 'ao azar'. Ou seja, prepara muito bem a Seleção Argentina para as partidas. Passa o que o time tem de fazer em cada detalhe. É uma grande ajuda quando estamos no gramado. "Em nenhum momento estamos perdidos. Não nos desesperamos em momento algum. "É um grande treinador. E se chegamos à final contra a França, o mérito é dele." O treinador está muito animado, sabe que tem a oportunidade, depois de 36 anos fazer a Argentina voltar a ser campeã do mundo. Chegar ao seu terceiro título. E com Messi. Depois, ir comemorar com a família, em Marbella, na Espanha, onde vive. Para espanto dos argentinos, que só descobriram em abril de 2019, quando ele foi atropelado. Mas é lá que ele segue vivendo, feliz. Só deixa sua casa quando tem de treinar a Seleção de seu país. Situação surreal, mas que a AFA e o povo argentino aceitam...Confira 7 momentos em que Messi parece não sofrer com a presença de marcadores croatas