Cosme Rímoli Luxa defende 'reserva de mercado' a brasileiros. Mesmo com 20 anos de fracassos nas Copas. E Ancelotti escolhido para a Seleção

Luxa defende 'reserva de mercado' a brasileiros. Mesmo com 20 anos de fracassos nas Copas. E Ancelotti escolhido para a Seleção

Luxemburgo defende ex-jogadores brasileiros comandando clubes. Dirigentes preferem a modernidade, o estudo, a estratégia. Na Série A, são 11 estrangeiros e nove brasileiros. Os fracassos nas últimas cinco Copas ensinaram

  • Cosme Rímoli | Do R7

Luxa foi demitido pelo fracasso na Olimpíada de 2000. Pela força da CPI. Nunca foi cogitado para voltar

Luxa foi demitido pelo fracasso na Olimpíada de 2000. Pela força da CPI. Nunca foi cogitado para voltar

Reprodução/Twitter

São Paulo, Brasil

Vanderlei Luxemburgo nunca se conformou com a maneira como deixou a seleção brasileira.

Nem por nunca mais ter voltado.

Nem voltará.

Foi escolhido na segunda metade de 1998, quando conciliou seu trabalho com o Corinthians. Em 1999 serviu apenas ao Brasil. 

Mas foi atingido em cheio na CPI que investigava a relação entre a Nike e a CBF.

Teve de admitir que em toda a sua carreira atuou com documentos falsificados.

Tinha três anos a mais do que constava no RG, carteira de trabalho, motorista, passaporte.

Esses três anos pesaram muito a seu favor no início da carreira, na base. Era mais velho, tinha o corpo mais desenvolvido, mais força, mais velocidade do que companheiros de clube com quem disputava posição. Atuou até pela Seleção Brasileira de Juniores. E ganhou dois torneios de Toulon, que eram muito importantes na década de 70.

 Foi assim que atuou no Flamengo, Internacional e Botafogo, como lateral-esquerdo limitado.

Até seu nome era outro: assinava Wanderley Luxemburgo da Silva. Mas ele foi registrado sem w e y. E passou, desde 2000, a assinar Vanderlei. 

Além disso, havia uma grande dívida com o Fisco.

Luxemburgo tinha um time forte em Sidney. Ronaldinho era a grande estrela. Fracasso contra Camarões

Luxemburgo tinha um time forte em Sidney. Ronaldinho era a grande estrela. Fracasso contra Camarões

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Ele foi demitido após a eliminação nas quartas das Olimpíadas de 2000, de Sidney, contra Camarões. Antes, Vanderlei havia vencido a Copa América, em 1999.

Dois anos depois da demissão de Luxemburgo, Felipão seria campeão.

Seu currículo como treinador é importantíssimo. Colecionou títulos. Continuou montando equipes fortíssimas, como o Cruzeiro de 2003, ganhador da Tríplice Coroa. Vanderlei assumiu o Real Madrid, em 2005.

Mas jamais voltou a ser cogitado para a seleção.

Desde 2007 perdeu o brilho.

Acumulava 14 demissões ao assumir o Corinthians, agora, com 71 anos. Chegou a ser dispensado do Tianjin Quanjian, time chinês da segunda divisão.

Com o Corinthians atormentado pelos fiascos com Fernando Lázaro, e com Cuca tendo de abandonar o clube por ver resgatada sua condenação por estupro, Vanderlei foi chamado para um contrato de risco.

Alguns troféus que Abel Ferreira conquistou com o Palmeiras. O português, taticamente, faz bem ao país

Alguns troféus que Abel Ferreira conquistou com o Palmeiras. O português, taticamente, faz bem ao país

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Desde que recuperou os holofotes corintianos, ele segue com a campanha: a seleção é dos brasileiros. Os clubes de elite do país são dos treinadores brasileiros.

Assim como em seu perfil na Wikipédia não consta a triste passagem pela CPI, Vanderlei, que realmente conseguiu fazer do Corinthians de 2023 uma equipe competitiva, faz que esquece as cinco Copas do Mundo que o Brasil perdeu para europeus: 2006, 2010, 2014, 2018 e 2022.

E que um argentino é o atual treinador que fez Messi campeão mundial no Catar.

Da modernidade tática que os treinadores do exterior estão trazendo.

O fundamental intercâmbio.

E segue firme, reclamando do excesso de estrangeiros no futebol brasileiro.

Para ele, as grandes equipes do país seguiriam sendo o paraíso de ex-jogadores brasileiros, como o próprio Vanderlei.

Depois do empate com o Internacional, em 2 a 2, com direito a seu time tomar gol nos últimos minutos, Vanderlei discursou.

Contra o estudo, contra a modernidade.

O uruguaio Pezzolano conseguiu ir além de Luxa e Felipão. Levar o Cruzeiro à Série A

O uruguaio Pezzolano conseguiu ir além de Luxa e Felipão. Levar o Cruzeiro à Série A

Reprodução/Twitter

“Na minha época [como jogador] tinha tanto ex-jogador.

"Para jogar futebol o cara não precisa falar bonito. Tem que ensinar futebol. Estudo pertence ao futebol. O ex-jogador sabe fazer isso.

"Mas agora estão trocando ex-jogadores por professores.

"Pega o Liminha, ex-volante do Flamengo, e vê quantos passaram na mão dele.

"Não era formado em educação física, mas era ex-jogador de futebol."

Luxemburgo seguiu.

"Estamos formando jogadores para jogar no futebol europeu. Estamos trazendo treinadores europeus para cá, tendo mais que 50% deles disputando o Brasileirão aqui, onde tínhamos sempre grandes treinadores. Na minha época, sempre teve muito treinador brasileiro. Não sou contra os europeus, mas será que cabe tanto técnico europeu aqui no Brasileiro?"

Dos 20 clubes, 11 têm técnicos estrangeiros. Sete portugueses e quatro argentinos.

Todos escolhidos de livre vontade pelos dirigentes brasileiros.

Vanderlei insiste na tese de que o país não precisa se preocupar com o restante do mundo.

“Será que não temos brasileiros mais jovens e começando a carreira... para dar ênfase à nossa essência do futebol? É preocupante. Ah, a modernidade. Cara, não estamos na Europa. Estamos no continente sul-americano. Não somos europeus. A nossa característica aqui é diferente até na hora de falar, falamos português, e não espanhol. É totalmente diferente. E não estamos percebendo que estamos querendo transformar tudo em europeu dentro do Brasil."

O treinador não percebe que só a essência não leva mais o país a lugar algum. São cinco Copas do Mundo de fracassos.

E, mais importante, o mundo não acredita nos treinadores do país.

Não há nenhum na elite da Europa.

Os clubes não acreditam nos técnicos brasileiros.

Mesmo Tite, que fracassou nas duas últimas Copas do Mundo, sonhava com um convite de qualquer clube europeu. Não veio.

Ou seja, a Europa acredita nos jogadores, não nos técnicos brasileiros.

Abel Ferreira é o grande exemplo da importância do intercâmbio. Desde novembro de 2020 ele está no país. Ganhou duas Libertadores. Um Brasileiro. Uma Copa do Brasil. Uma Supercopa do Brasil, uma Recopa Sul-Americana, dois Campeonatos Paulistas.

O Cruzeiro subiu da Série B para a A com o uruguaio Paulo Pezzolano. Vanderlei Luxemburgo e Felipão fracassaram na mesma tarefa.

Na verdade, Vanderlei, que é muito inteligente, sabe que a modernidade chegou para ficar. 

O lado mais necessitado do futebol do país era o dos treinadores.

Principalmente dos ex-jogadores.

Eles seguiam trabalhando por instinto, repetindo o que haviam feito décadas atrás.

A evolução chegou, queira Vanderlei Luxemburgo ou não.

Ele mesmo trabalha com o instinto, mas estudou muito. 

Aprendeu conceitos europeus e que aplica nos clubes em que trabalha.

Talvez faltassem mais.

Luxemburgo pensou que, depois da demissão em 2000, um dia voltaria à seleção. Jamais aconteceu

Luxemburgo pensou que, depois da demissão em 2000, um dia voltaria à seleção. Jamais aconteceu

Reprodução/Twitter

Talvez por isso jamais tenha vencido uma Libertadores, apesar de ter disputado nove.

Talvez por isso, nos 25 títulos que ganhou, não exista nenhum internacional comandando clubes.

Luxemburgo voltou a ter voz forte no Corinthians.

Por seu próprio mérito, talento.

Conseguiu se reinventar quando parecia ultrapassado.

Só que ele não conseguirá travar o intercâmbio.

Fernando Diniz, o técnico interino da seleção, deve muito ao estudo dos métodos dos técnicos estrangeiros, principalmente Guardiola.

Vanderlei tem todo o direito de acreditar, de pregar o que quiser.

Só que os próprios dirigentes do futebol deste país decidiram.

Perderam a fé nos velhos métodos nacionais.

E buscaram a evolução.

E ela estava lá fora.

O tempo do improviso, do instinto, do saudoso Liminha passou.

Ou o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, não ficaria esperando, e torcendo, para que o italiano Ancelotti aceite ser o novo técnico da seleção brasileira.

O discurso de Vanderlei não tem eco nos dirigentes.

A reserva de mercado para os técnicos brasileiros acabou...

Campeão do 1º turno, Botafogo está perto de conquistar o título do Brasileirão?

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