Endividado, São Paulo impõe 50% a menos de salário. Revolta jogadores
Não houve acordo. O inseguro Leco mandou Raí avisar que os salários estão cortados pela metade. Sem direito de imagem. Decisão sem diálogo
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
O São Paulo mudou.
Nas décadas de 80 e 90, era exemplo de administração.
Dirigentes que se autointitulavam 'cardeais'.
Dono do 'maior estádio particular do mundo'.
Mais competente formador de jogadores na base.
Atletas brigavam com empresários para atuar com a camisa tricolor.
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Torcedores, orgulhosos, garantiam que o clube era um pedaço perdido da Europa mais desenvolvida.
Acumulava títulos, inclusive dois Mundiais, para a inveja dos rivais.
Tudo isso impulsionava a proliferação de torcedores.
Com o Morumbi constantemente lotado.
Exigia a maior cota de transmissão da Globo.
30 anos depois, o que mostra vai além da estagnação.
O clube não só parou no tempo.
Regrediu.
"Se apequenou", foi uma expressão que o ex-presidente Carlos Miguel Aidar usou para tentar classificar o Palmeiras.
Mas o termo se encaixa perfeitamente ao São Paulo depois justamente de seu retorno.
Aliás, um pouco antes, quando Aidar conseguiu um subterfúgio legal para manter Juvenal Juvêncio no terceiro mandato, embora inúmeros advogados considerassem manobra vazia, sem substância. Mas que vingou pela inexistência de uma oposição.
O clube já havia tomado um baque assustador da CBF, ao perder a abertura da Copa do Mundo para o Corinthians. Em vez da sonhada transformação do Morumbi em arena multiuso, a decepção de ver o rival ganhar todas as facilidades tributárias para construir um estádio. Com apoio fundamental do ex-presidente do Brasil, Lula.
Juvenal se iludiu, confiou demais em Ricardo Teixeira e travou, por anos, a modernização, que nunca ocorreu, do Morumbi.
De 2006 a 2014, com mão de ferro, Juvenal não percebeu o que acontecia no mundo. E seguiu tratando o São Paulo como se estivesse no primeiro mandato, entre 1988 e 1990.
O CT fabuloso de Cotia se tornou um território repartido com empresários. O clube foi engolido pela Lei Pelé. Não buscou soluções e aceitou passivamente dividir seus jovens talentos com agentes.
Departamento de marketing foi desprezado. A falta de grandes patrocinadores não é por acaso.
Juvenal centralizava tudo, mas sofria com sua falta de visão. E por não aceitar sugestões, novas maneira de gerenciar futebol.
Tudo iria piorar de vez com a volta de Carlos Miguel Aidar ao poder. Ele foi um dirigente moderno, ousado, respeitado entre 1984 e 1988. Ao retomar a presidência, em 2014, 26 anos depois, ele se perdeu completamente.
Deslumbrado, chegou a enviar a namorada para tentar intermediar a venda de Rodrigo Caio à Espanha. Várias negociações estranhas aconteceram no clube.
A ponto de Aidar ter de renunciar ao cargo, depois que o vice Ataíde Gil Guerreiro, que o agrediu fisicamente, mandar um e-mail para o advogado Antônio Cláudio Mariz, fazendo denúncias indefensáveis a Aidar.
O e-mail foi publicado, em primeira mão, pelo blog.
Com a saída abrupta de Aidar, o pior presidente da história do São Paulo, assumiu em outubro de 2015, Carlos Augusto Barros e Silva.
Homem a quem Juvenal Juvencio me confidenciou que jamais apoiaria à presidência do São Paulo, embora fosse seu companheiro há décadas e obcecado por assumir o cargo maior no Morumbi.
E Leco justificou plenamente a falta de confiança de Juvenal.
Seu primeiro ato como presidente, mesmo com o São Paulo prejudicado por Aidar, foi abafar as várias denúncias.
"O São Paulo resolverá tudo dentro do São Paulo.
"É problema do clube."
Yago Maidana, Under Armour, Far East, Cinira Maturana entre outros casos 'morreram' no Morumbi.
Mas foram mal enterrados.
A ponto de o Ministério Público no mês passado revelar que empresa de Cinira recebeu R$ 1 milhão por intermediar a ida da Under Armour como fabricante de uniformes do clube, em 2015.
O MP também investiga R$ 179 mil que Aidar recebeu justamente de uma sobrinha de Cinira. Assim como a compra de Iago Maidana do Monte Cristo, de Goiânia.
Se o Ministério Público investiga até hoje a segunda passagem de Aidar na presidência, no São Paulo tudo foi esquecido.
Leco assumiu e mostrou sua insegurança, sua falta de rumo.
Montando e desmontando times.
Trocando treinadores, como quem troca de camisa.
Uma ciranda cara. Com multas rescisórias, fracassos, desgastes.
Começou por Doriva por Milton Cruz, Milton Cruz por Edgardo Bauza, Edgardo Bauza por Ricardo Gomes, Ricardo Gomes por Rogério Ceni, Rogério Ceni por Dorival Júnior, Dorival Júnior por Diego Aguirre, Diego Aguirre por André Jardine, André Jardine por Vagner Mancini, Vagner Mancini por Cuca, Cuca por Fernando Diniz
Usar, sem constrangimento,o maior ídolo da história do clube, Rogério Ceni ,como escudo, como cabo eleitoral.
Para depois de eleito, despachar, sem piedade, depois de desmontar o time de Ceni.
O que o São Paulo ganhou com a insegurança de Leco?
Derrotas, vexames, prejuízo e aumento de jejum de títulos.
São oito anos de decepções, de assistir festas alheias.
De lágrimas.
De vergonha.
A incompetência lógico que chegaria aos cofres.
Mesmo com uma sede incrível para vender jovens e comprar velhos atletas, o prejuízo só se acumula.
A ponto de o clube passar a atrasar salários dos jogadores, o que seria inacreditável décadas atrás.
E agora, com a pandemia do coronavírus, o pior.
O inseguro Leco consultou os atletas sobre sua vontade de reduzir os salários em 50%.
Os jogadores, que já tinham os direitos de imagem atrasados em dois meses, disseram não.
Mas o que fez o inseguro Leco?
Decidiu usar sua força presidencial.
Pagou os dois meses de atraso, de janeiro e feveiro, do direito de imagem.
Não o de março.
E no mesmo dia, disponibilizou 50% do salário de março.
Avisou que seria assim até as partidas voltarem a acontecer.
E depois pagar os 50% que ficou devendo em seis vezes.
Além de não pagar, a partir de abril, o direito de imagem.
Deixando para o 'futuro' novo acerto.
Os jogadores estão, lógico, revoltados.
Além disso, tiveram de aceitar férias impostos.
Entre 2 e 22 deste mês.
Coube a Raí, outro ídolo usado como escudo por Leco, para explicar a ditatorial decisão do São Paulo.
O clube tem líderes importantes no elenco, como Daniel Alves, Hernanes, Volpi, Juanfran.
A maneira que foi tudo foi imposto decepcionou o elenco.
Criou um clima pesado.
Revoltante.
Todos sabem que o Grêmio e o Atlético Mineiro, por exemplo, cortaram 25% dos salários.
E não a metade.
Eles estavam dispostos a negociar.
Não esperavam que o valor fosse imposto "de cima para baixo".
Por enquanto, ninguém reclamará publicamente.
Por enquanto...
Leco é o pior presidente do São Paulo.
A estatística confirma.
Jamais qualquer comandante do clube viveu um jejum tão grande: quatro anos e cinco meses sem um título oficial.
O segundo pior foi José Douglas Dallora, entre 1982 e 1984.
São 13 presidentes do São Paulo que passaram por esse desgosto, não ter sequer uma conquista.
Além dos fracassos em campo, o clube acumulou, em 2019, dívidas de R$ 180 milhões.
Elas já estariam beirando os R$ 200 milhões.
O mandato de Leco termina no final deste ano.
Aos 72 anos, ele segue inabalável.
Diz que cumprirá o mandato até o último dia.
Mesmo sendo pior presidente do São Paulo...
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