A vingança selvagem e cerebral de Adesanaya contra o seu carrasco Apoan. Haverá o tira-tema. A terceira luta entre os rivais
O nigeriano usou teatro, estratégia e conseguiu a revanche contra o seu carrasco, o brasileiro Apoan. E retomou o cinturão dos médios do UFC. Foi uma vitória cerebral. Dana White já projeta o terceiro confronto
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
Foi a mais impressionante armadilha na disputa de um cinturão, na história do UFC.
Digna de um gênio das artes marciais.
O nigeriano Israel Adesanya misturou teatro, capacidade incrível de absorção dos socos duríssimos, estratégia.
Principalmente força mental para superar o único trauma que carregava no mundo das lutas.
Usou a truculência, a ansiedade do brasileiro, ex-alcoólatra e ex-servente de pedreiro, para entrar de vez para a elite dos grandes campeões do MMA.
E bastaram quatro minutos e 21 segundos, no segundo round, da luta principal no emotivo UFC 287, em Miami, para que Alex Poatan desmoronasse, nocauteado por Adesanaya.
Irônico, ele tirou todo o trauma de acumular três derrotas para o paulista, estirado no octógono, fingindo dar flechadas. Pura sensação de prazer, já que Poatan se apresenta para as encaradas caracterizado como um índio brasileiro.
Enquanto Adesanaya comemorava a recuperação do cinturão do UFC dos médios, Dana White punha sua ganância para funcionar.
E, analisando o ranking dos médios, não há outra coisa a fazer. Senão marcar uma terceira luta entre os dois rivais, para 'provar' quem, afinal, é o melhor.
Trilogias por cinturões entre dois lutadores especiais, com uma vitória cada um, é um caminho natural e muito seguido na história de Dana White no controle do UFC.
Haverá o desempate.
E, provavelmente, ainda neste ano, para aproveitar o impacto da vitória do showman nigeriano.
A luta foi espetacular para quem admira o xadrez com o corpo que é o MMA.
O uso do melhor das lutas e da estratégia para superar o oponente.
Foi o que aconteceu ontem de forma cinematográfica em Miami.
O falastrão Adesanaya dominava os médios, vinha de 12 vitórias empolgantes. "Limpou" a categoria.
Robert Whittaker caiu diante dele duas vezes. Venceu Anderson Silva poupando o ídolo brasileiro. Bateu o inflado Yoel Romero. Humilhou o brasileiro Paulo Costa, o Borrachinha, Kelvin Gastelum, Jared Cannonier, Marvin Vettori.
Dana foi obrigado a buscar Poatan a peso de ouro. O brasileiro era a "pedra no sapato" do nigeriano. Ele o havia derrotado duas vezes no kickboxing, no qual não há espaço para luta agarrada, para o jiu-jítsu. Só trocação de socos, pontapés e cotoveladas.
Comentaristas brincam, dizem que os violentíssimos socos do brasileiro misturam diretos e uppers. O upper é o golpe que vem de baixo para cima, geralmente no queixo do rival.
Adesanaya sofreu duas derrotas no kickboxing para o brasileiro. A primeira, por pontos. E a segunda, por nocaute.
Dana sabia disso e, depois de Apoan fazer três lutas de preparação no UFC, armou o grande espetáculo.
Os dois se encontraram, para deleite dos fãs, em Nova York, no histórico Madson Square Garden.
E no combate pelo UFC 281, na noite de 12 de novembro de 2022, o nigeriano dominou os quatro primeiros rounds e também era dono do quinto, até que em uma fulminante sequência de socos, Apoan o nocauteou em pé.
Vitória espetacular.
Dana não deixou Alex Pereira, nome verdadeiro do paulista, nem respirar e já tratou de marcar a revanche que, lógico, o brasileiro não pôde recusar.
Essa afobação, a certeza que era melhor que o nigeriano foi o começo da derrota histórica de ontem.
Apoan tratou de treinar exatamente da mesma maneira. Encurtar o espaço, se preparando para travar as combinações de chutes altos e baixos empolgantes de Adesanaya.
Foi aí que começou o show.
A impressão nítida era que o africano estava intimidado, com medo, travado. O que foi dando mais e mais confiança ao brasileiro.
O primeiro round foi de aparente imposição de Apoan.
E veio o segundo assalto.
O brasileiro já se sentia dono do octógono, soltando seus socos, enquanto o nigeriano recuava, parecendo inferiorizado.
Até que ele mesmo, sem ninguém perceber, nem o público, nem os comentaristas, nem os narradores nem, muito menos, Apoan, caminhou para trás, para a grade.
Como se estivesse encurralado.
Apoan se sentiu vencedor e firmou os dois pés no chão, preparando-se para nova saraivada de diretos, para fazer desmoronar o nigeriano.
Só que Adesanaya estava mais do que preparado para os diretos. Ele, ao contrário da luta de novembro, manteve a posição de defesa, com os dois punhos protegendo seu rosto.
Até que, com o impulso da própria grade, desferiu socos violentíssimos sobre os diretos de Apoan. Ele usou a biomecânica a seu favor.
Quando o brasileiro escolheu os diretos, foi fácil acertar o seu rosto, com os seus socos passando por cima dos golpes de Apoan.
Foram movimentos coreografados, estudados e violentíssimos.
O brasileiro caiu sem sentidos com os socos altos no seu rosto.
Vitória espetacular de Adesanaya, que retomou o cinturão, com toda a justiça, e matou seu trauma.
Dana White era o mais empolgado da noite.
Ele é contratado pelo grupo chinês WME-IMG, que comprou o UFC por 4 bilhões de dólares, cerca de R$ 22 bilhões.
White só quer saber de lucro.
E esse confronto pessoal de Apoan e Adesanaya, que encanta o público consumidor de pay-per-view, ou seja, que paga, e caro, para vê-los lutar no octógono, é perfeito para o presidente do UFC, que corre atrás de ídolos para movimentar a principal categoria de MMA do mundo.
Portanto, sairá o tira-teima.
Adesanaya já sofreu muito nas mãos de Apoan.
Ontem foi a vez de o brasileiro pagar seus pecados.
O terceiro confronto é totalmente imprevisível.
Será marcado, para a empolgação dos fãs.
E para a alegria dos cofres do WME-IMG, dono do UFC...
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