A luta pelo poder no Corinthians. Exclusiva com Paulo Garcia
O candidato que tornou imprevisível a eleição no Parque São Jorge
Cosme Rímoli|Cosme Rímoli

São 175 lojas em dez estados brasileiros. O faturamento de 2016 chegou a R$ 1,9 bilhão. A Kalunga é a maior rede de papelaria do país.
O império de 175 lojas em 13 estados diferentes, foi fundado por Damião Garcia. O jovem caixeiro viajante de Bauru se transformou em um dos grandes empresários da América do Sul.
Mas ele faleceu há dois anos sem conseguir realizar um dos grandes sonhos. Ser presidente do Corinthians. Foi um dos primeiros empresários a acreditar no poder de marketing do clube, patrocinando a camisa de 1985 a 1994.
"Só que meu pai, apesar de ser conselheiro vitalício e de ter muitos aliados importantes, percebeu: nunca seria presidente. A política no Corinthians sempre foi algo muito complicado. Com direito a manipulações. O meu pai tinha tudo para ser presidente. Mas sempre foi uma pessoa digna e jogava limpo. Por isso não se elegeu.
"Isso é histórico no Corinthians. O Dualib enganou o Vicente Matheus e o tirou do cargo. Na briga pelo poder com meu pai, venceu com votos de conselheiros com mandatos vencidos. Meu pai entrou na Justiça, provou que estava certo. Mas a decisão levou dez anos, o Dualib já nem estava mais no poder.
"Esse tipo de coisa não vai acontecer comigo. Gosto, de verdade, dos meus adversários para a presidência. São meus amigos. Mas não vou ser passado para trás. Vou jogar o jogo."
Em uma longa entrevista exclusiva, de duas horas, Paulo Garcia mostrou que é mais fácil vencer a recessão, a falta de rumo econômico dos vários governos brasileiros, do que vencer a eleição para presidente do Corinthians.
Garcia será o fiel da balança. Ele acredita na vitória. Mas inúmeras pesquisas apontam que o deputado federal do PT, Andrés Sanchez, e o o ex-presidente e atual conselheiro do Tribunal de Contas de São Paulo, Roque Citadini, são os favoritos na briga que ainda conta com Romeu Tuma Júnior e Felipe Ezabela.
Paulo Garcia é profundamente ligado a Andrés e a Citadini. Ele foi o maior doador na campanha do político à Brasília. E, na última eleição, cedeu à última hora, o direito de ser candidato a presidente, contra Roberto de Andrade, cedeu a vaga a Citadini.
Com inúmeros aliados nas duas principais chapas, Garcia, no mínimo, vai tirar votos importantes tanto de Andrés como de Citadini. O que torna a eleição corintiana, marcada para o dia 3, imprevisível.
Aliás, Garcia tem a certeza que as ameaças de impugnação das candidaturas dele, de Andrés e de Citadini, não terão sucesso.
Roque Citadini já até teria perdido o seu direito ontem, quando a comissão eleitoral do Corinthians, impugnou sua candidatura.
A Constituição da República, em seu artigo 95, parágrafo único, inciso I, veda aos Magistrados, o exercício, ainda que em disponibilidade, de outro cargo ou função, salvo uma de magistério, com o escopo de lhes assegurar uma atuação autônoma e independente", divulgou a comissão.
A acusação contra Andrés remete à anistia financeira de sócios, promovida por Eduardo Caggiano, coordenador do deputado federal à presidência. E contra Paulo Garcia, o fato de o secretário geral do Corinthians e articulador da candidatura, Antônio Jorge Rachid Júnior, divulgou em mensagem de whatsapp que o empresário pagaria as mensalidades de todos os sócios inadimplentes que desejassem.
Diante desse quadro, 845 sócios que foram favorecidos pelas atitudes de Andrés e Garcia foram proibidos de votar
Paulo, vamos começar explicando a sua postura em relação aos sócios. É verdade que você se ofereceu para pagar os inadimplentes? Essa atitude é moral?
Cosme, é totalmente imoral. Mas eu fiz de maneira aberta, diante das manobras dos meus concorrentes. Fui ao clube e na frente de todos os conselheiros, avisei que meu cartão de débito estava na mão. Eu pagaria para quem quisesse deixar de ser inadimplente. Fiz porque quis mostrar que não ficaria quieto diante de manobras que considerava indecentes. Como essa anistia proposta pelos aliados do Andrés. O Roque também fez. Um dos seus assessores apareceu com uma pilha de carteirinhas. E com o dinheiro. O Tuminha até fotografou.
Com a anistia por parte da situação e o Roque estava pagando para alguns sócios, eu pagaria para outros sócios inadimplentes. Simples assim. Apareceram uns 30 e eu paguei o que eles deviam.
Diante dessa minha atitude aberta, o comitê eleitoral proibiu todos os sócios com anistia e os que tiveram suas dívidas pagas, de votar. O que acredito ser correto. Se eu entrasse na justiça protestando pelo que aliados do Andrés fizeram iria levar anos. Sei como é a Justiça no Brasil.
Fiz o que não concordo, acho imoral. Mas joguei o jogo. Por que se eu me calo, em uma eleição com três, quatro mil sócios, eu sairia com mil de desvantagem. Aí fica impossível ganhar. Fiz o que tinha de fazer.
Você acredita que as candidaturas do Andrés, a do Roque e a sua serão realmente impugnadas?
Não. O Roque já foi candidato à presidência, mesmo sendo ligado ao Tribunal de Contas. Não tem nada a ver. As manobras com os sócios inadimplentes não acontecerão. Não há motivo para impugnações. Eu sei que eu não serei impugnado. Fiz o que fiz como uma maneira de protestar pelo que estava acontecendo. No dia 3, estaremos todos concorrendo. Tenho certeza
Você é profundamente ligado ao Andrés e ao Citadini. Vai tirar votos dos dois. Tornou a eleição imprevisível. Por que resolveu se candidatar?
Se você acha que apenas vou tirar votos dos dois, está enganado. Vou ganhar a eleição. Porque sou um candidato independente. Não sou situação e nem oposição. Sou o que menos tem rejeição, porque me dou bem com todos. E todos sabem o empresário que sou. Eu decidi me candidatar porque o Corinthians precisa pela primeira vez ter uma gestão empresarial de verdade. Tudo ainda é muito atrasado no clube. Feito sem planejamento de verdade.
Vou fazer um plano diretor de crescimento. Que vai valer por dez anos. Vai passar do meu mandato. Se os conselheiros aprovarem, vamos estruturar o Corinthians para aproveitar seu potencial em cada área. Colocar profissionais de verdade, acabar com os feudos. Há pessoas que dominam certas áreas do clube. E muitas vezes não têm competência para isso.
O Corinthians deve R$ 400 milhões, R$ 360 milhões, fora o problema do estádio. Não tem patrocinador master. Não tem naming rights no estádio. São situações que não podem existir.
O sucesso do time é importante, mas o clube não pode ser abandonado.
Para que isso aconteça é fundamental resolver o problema do estádio. Você sabe afinal quanto é a dívida do Corinthians. E tem um plano para solucionar o problema?
Eu não conheço o contrato na íntegra. O Andrés precisa estar junto porque é quem conhece de tudo. Não tenho acesso aos contratos, como foi feito. Sou uma pessoa verdadeira. Não gosto de responder não sei. Mas não vou ficar inventando números como outros candidatos. O que eu sei é que a dívida existe. E como homem de negócios que sou, acredito que há solução para tudo.
Eu ouvi o Marcelo Odebrecht falar na deleção premiada da Lava Jato que o preço do estádio é R$ 400 milhões. Mas escuto no Corinthians que a dívida está em R$ 1,8 bilhão. O que é completamente inviável.
Para falar bem a verdade, acredito que nem o Corinthians saiba quanto é a dívida. É uma confusão. O Corinthians tem de pagar para a Caixa, para o fundo (que administra a dívida), para a Odebrecht. Há os juros. Mesmo estando tão perto do Roberto, ele nunca me falou quanto é. Só me disse que a dívida é um 'rabo de foguete'. Disse que o contrato é inviável.
Acredito que será necessária uma reformulação no pagamento. Não há como o Corinthians progredir com toda a sua arrecadação indo para o pagamento do estádio. A televisão paga bem, há os sócios-torcedores, venda de jogadores. Mas está claro que o ideal é que parte da arrecadação dos jogos fique com o clube.
Está clara a necessidade de uma renegociação com o fundo, com a Caixa, com a Odebrecht. Como empresário sei muito bem que não existe a hipótese de pagar R$ 280 milhões, R$ 300 milhões para a Caixa e virar as costas para a Odebrecht, porque ela deixou de construir R$ 200 milhões, R$ 260 milhões em obras prometidas no estádio.
O Corinthians não pode ficar travado por uma dívida bilionária.
Por que o Corinthians enfrenta esse problema do estádio?
Acho que foi mal planejado. Se quis fazer o estádio para a Copa do Mundo e se fez de qualquer jeito. Sem planejamento algum. A conta ficou para o Corinthians.
Há como vender os naming rights do estádio? Alguém vai deixá-lo de chamar de Itaquerâo?
Eu acredito que a venda do nome do estádio é viável. Basta pegar uma empresa acostumada a lidar com isso, como a AEG, por exemplo, que administra inúmeros estádios no Exterior. É preciso estar nas mãos de especialistas esta venda. E talvez fazer contratos com quem transmitam os jogos do Corinthians para falar o nome da empresa que comprar o naming rights.
A Kalunga queria esteve perto de ser dona dos naming rights do estádio?
Sim. Eu me interessei, lá por 2010, 2011. Mas nem fiz oferta. Me pediram R$ 300 milhões. E não teve negócio. Não sei quanto eu poderia pagar. Mas não esses números. Aliás, a Kalunga poderia estar ajudando muito mais o Corinthians. Mas não pode. Houve uma mudança nos estatutos, quando o Gobbi era presidente. Um candidato a presidente não pode patrocinar o clube. A Kalunga queria, poderia ser a patrocinadora master da camisa, que está sem ninguém, mas o estatuto não permite. A regra foi mudada para mim.
Se você for eleito como será sua relação com seu irmão, Fernando? Ele seguirá dominando a base do Corinthians?
Assim que eu for eleito, o Corinthians deixará de fazer qualquer negócio com o Fernando. É uma questão de ética. Cumprirei apenas o que já está feito. Se ele tem a participação em alguns jogadores do Corinthians, seguirá com ela. Ele pagou por ela. Não fez nada desonesto. Só que não há como eu ser presidente e ele seguir empresariando jogadores corintianos. Já falei para o Fernando e ele entendeu.
Por que salvou o mandato de Roberto de Andrade, seu rival na última eleição?
Porque foi era uma injustiça que estavam fazendo com ele. Dei o meu apoio e das pessoas que estão do meu lado. O impeachment não foi para a frente. As pessoas mais próximas a mim assumiram algumas áreas da administração e o seu mandato está terminando da melhor maneira possível. (Como recompensa, por ter travado o impeachment, Garcia pôde nomear Flávio Adauto para comandar o futebol, na gestão Roberto de Andrade.)
Qual a sua avaliação dos seus principais rivais? Andrés e Citadini?
Os dois são pessoas honestas, querem o bem do Corinthians. Só que o poder desgasta. O discurso do Andrés está desgastado. Ele está há muito tempo, desde 2007 no poder. Ele conseguiu um estádio, construiu o Centro de Treinamento. Mas a que preço? E também não concordo com o fato dele ser deputado federal e querer voltar a presidente. Não haverá tempo para se dedicar como o Corinthians merece e precisa.
O Roque Citadini é elitista. Criou a expressão baixo clero para batizar o grupo do Andrés. Tem o discurso de que tudo está errado e precisa ser mudado. Não concordo com sua maneira de pensar o clube. Não vejo proposta.
Eu sou gestor. E sei que posso fazer melhor do que os dois.
Qual será sua relação com as organizadas, se eleito?
De respeito. Mas torcedor tem de torcer, pagar, ajudar o clube. Não posso desviar o dinheiro do Corinthians para pagar ônibus, dar ingressos. Não. O dinheiro do Corinthians é do Corinthians. E de mais ninguém. E a administração do clube cabe ao presidente e à sua diretoria. Não aos torcedores organizados.
Você não vai desistir de última hora, vai?
De jeito nenhum. Chegou a minha vez de ser presidente do Corinthians.