Há mais mulheres na trilha?
Lembro de ter pesquisado na internet exatamente o termo "mulheres na trilha" e a única coisa que apareceu na busca foi a informação de mulheres que se aventuravam no motocross.
Blog de Escalada|Do R7
Comecei a fazer trilha para acompanhar um namorado. O relacionamento terminou, eu me vi apaixonada pela atividade outdoor e sem noção de como montar uma barraca ou me inserir em um novo grupo de freetrekking e dar continuidade aos roteiros.
Lembro de ter pesquisado na internet exatamente o termo “mulheres na trilha” e a única coisa que apareceu na busca foi a informação de mulheres que se aventuravam no motocross. E foi aí que eu vi uma “deixa” para criar o perfil Mulheres na Trilha e construir, de forma colaborativa, esse conhecimento sobre o universo feminino na prática do hiking e do trekking.
Foto: Mulheres na Trilha
Creio que essa não é uma realidade isolada: mulheres que começam a fazer trilha para acompanhar um parceiro. Fato é que esse cenário tem mudado e cada vez mais a presença feminina tem conquistado espaço na modalidade, principalmente, por meio de iniciativa própria.
Uma pesquisa informal, realizada entre os grupos de freetrekking de Belo Horizonte-MG, nesse primeiro semestre de 2019, para identificar o perfil dos praticantes, revelou que 58% são do sexo feminino. E esse resultado é mesmo perceptível nos roteiros. Pelo menos nos que faço, tem sido uma constante ter mais mulheres do que homens.
Foto: Mulheres na Trilha
As próprias marcas, voltadas aos esportes de aventura, têm se atentado para esse aumento e desenvolvido roupas e equipamentos específicos para o público feminino. E como isso me alegra, viu? Recentemente, testei uma mochila cuja indicação de uso era “unissex”.
Talvez, no fundo, quisessem dizer “foi desenvolvida para homens, mas mulheres podem usar, se quiser”. Não consegui uma regulagem que me beneficiasse: a barrigueira não se ajustou bem ao meu quadril, a fita ficou no limite e, mesmo assim, frouxa e sem sustentação necessária para balancear o peso, o que acabou sobrecarregando os ombros e, provocando desconforto e lesão, devido ao atrito das alças e da barrigueira.
Faltam dados
No Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente e responsável pela gestão dos parques nacionais, não há dados do número de visitantes categorizados por gênero. Entrei em contato direto com alguns desses parques e também não consegui esses números.
Na Federação de Montanhismo e Escalada do Estado de Minas Gerais, importante instituição que fomenta a prática do montanhismo nas terras mineiras, não há pesquisas ou registros para subsidiar essa afirmação do aumento do número de mulheres praticantes de esportes de montanha. Mas quem está no cargo de presidente é Giselle de Melo e reforça essa percepção: tem mais mulheres na trilha!
Foto: Mulheres na Trilha
Na verdade, no montanhismo, de forma geral, faltam dados consistentes que possam servir como base para potencializar uma prática mais segura e consciente da modalidade. Mas acredito que essa falta de informação, por si só, já é um importante indicativo. Precisamos nos mobilizar! Disseminar referências qualificadas, tais como atrativos e normas das unidades de conservação, de modo a proporcionar um ambiente mais acolhedor e amistoso para os que estão chegando a esse universo.
Fico feliz por contribuir um pouco com o trabalho desenvolvido pelo Instagram @mulheresnatrilha. As dicas compartilhadas lá servem para incentivar e motivar muitas mulheres a ingressarem e/ou a darem continuidade ao esporte.
O que nos move
As mulheres são culturalmente estimuladas a não explorar lugares “selvagens”, a não ser na companhia de um homem. Quando o assunto é segurança, precisamos mesmo nos preocupar, afinal, somos mais suscetíveis a alguns riscos, como assédio, por exemplo, e todo cuidado é pouco. Além disso, sair da zona de conforto exige esforço.
O corpo dói, ao se movimentar, por horas, em terrenos irregulares e sob exposição às condições climáticas (frio, chuva, calor intenso); e o desconhecido, ao mesmo tempo que instiga, intriga, e é normal ter medo. Mas esse contato com a natureza é tão transformador, que é inevitável experimentar essa sensação de liberdade e não se apaixonar.
Enfim, são tantos os benefícios, que escreveria, por horas, sem concluir. Para mim, o maior deles, no entanto, é a capacidade de simplificar! Na montanha é onde, realmente, o pouco se torna muito. A gente vai aprendendo a abrir mão das coisas, a ser mais prática, a carregar somente o que é necessário e a valorizar as pequenas alegrias. Sem contar o grande luxo da desconexão e a sensação de que as horas passam mais devagar. Que coisa boa é ter mais tempo para celebrar a vida, né?
Foto: Mulheres na Trilha
Só sei que se a jornada da escritora Cheryl Strayed, que se aventurou sozinha, por três meses, pela trilha do Pacific Crest Trail, nos Estados Unidos, em 1995, e que deu origem ao livro e ao filme “Livre”, fosse feita nos dias atuais, com certeza, mais mulheres cruzariam o seu caminho.
Para as adeptas à trilha sonora, essas incursões no mato ainda podem vir embaladas pela “A Trilheira”, música do cantor e compositor Bernardo do Espinhaço, que homenageia estas destemidas mulheres e, cujo videoclipe tive a honra de participar. Por fim, que essa não seja só uma conquista numérica e sim de pertencimento. E que o universo outdoor se revele ainda mais como lugar de encontro do feminino.