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Conheça torcedora que já fugiu da família e tem uma vida dedicada ao Vitória

Em entrevista exclusiva ao Lance!, Rosecleide conta desafios como torcedora

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Lance|Do R7

Rosecleide com o tradicional rosto pintado em entrevista ao Lance! (Foto: Rafael Carmo / Lance!) Rosecleide com o tradicional rosto pintado em entrevista ao Lance! (Foto: Rafael Carmo / Lance!)

Poucas pessoas são capazes de repetir a frase acima por causa de um clube de futebol. Mas, para Rosecleide Aquino, a paixão pelo Esporte Clube Vitória, que completa 126 anos nesta terça-feira (13), não tem limites. Ela já fugiu de casa, largou a família e correu até risco de vida para acompanhar o clube Bahia afora. Não à toa, Rosecleide, aos 66 anos, é um dos maiores símbolos dessa instituição centenária.

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Quando reportagem do Lance! chegou à casa dela, que, por coincidência, fica no bairro de Nazaré, ao lado da Arena Fonte Nova, Rosecleide já estava quase pronta para ir ao Barradão acompanhar Vitória e Cerro Largo pela Sul-Americana, mas antes era preciso segurar a ansiedade para uma longa entrevista. Só faltava um detalhe, tomar os remédios que viraram rotina depois que ela sofreu um infarto durante viagem para acompanhar a equipe na Série C do Campeonato Brasileiro, em 2022.


Com orgulho, a torcedora dizia que, mesmo contra a recomendação dos médicos, frequentava o Barradão em todos os jogos do Vitória, ao mesmo tempo que mostrava marcas roxas espalhadas pelo corpo, consequência, segundo ela, das fortes emoções com o time.

- Chego no aeroporto e passo mal. Comecei a não poder respirar. Estava com dificuldade. O pessoal viu e chamou ajuda. Os passageiros que estavam ao meu lado perceberam. O avião ainda não tinha descido. Eu estava no aeroporto em Salvador. Aí a aeromoça disse: "A gente vai levar você para sua casa". Mas eu respondi: "Eu não vou não, eu vou ver o jogo do Vitória". Ela insistiu: "A senhora não tem condições, está pálida". Eu estava com muita dor - relembrou Rosecleide.


Rosecleide ficou 33 dias internada em Brasília, onde mora uma das suas filhas, passou por três cirurgias, mas conseguiu vencer mais essa batalha, claro, com o Vitória sempre ao seu lado, costume que ela leva desde a adolescência.

O começo da paixão pelo Vitória


Hoje, dona Rosecleide é reconhecida por quase todos os torcedores do Rubro-Negro e homenageada por onde passa. A casa dela é vermelha e preta, das grades na parte externa aos copos, quadros, almofadas até mesmo o ventilador e a geladeira. Mas para chegar a esse ponto, foi preciso sacrificar muita coisa pelo clube. A história de amor entre Rosecleide e Vitória começou quando ela tinha apenas 12 anos, em um dos momentos difíceis da história do time, que via o rival Bahia tomar a hegemonia do futebol estadual.

- Eu tinha 12 anos quando comecei a ver o sofrimento daquela torcida e o outro lado se achando. Eu pensei: "Eu vou torcer para esse time". Falei para o pessoal que estava na Fonte Nova, que hoje é a Arena Fonte Nova. Quando perguntaram: "Por que você escolheu um time que não ganha nada?", eu respondi: "Mas ele vai ser muito grande". Na época, o Vitória era grande para mim, mas sofria contra o rival. Isso foi antes de 1972.

- Em 1972, veio aquele time bom, e eu já torcia nas arquibancadas, escondida da minha família. Eu fingia que ia ao banheiro e demorava, porque estava na torcida do Vitória. Ali, fui me apaixonando cada vez mais. Era um amor secreto, e, como você sabe, amor secreto é mais gostoso. Minha família toda era Bahia, então eu torcia escondido. Em casa, eles queriam que eu torcesse para o Bahia, me davam roupas, mas eu não usava. Eu queria vestir vermelho e preto - revela.

Uma menina de 12 anos em um estádio de futebol, ainda por cima escondida, não era tão comum naquela época, em um ambiente machista e hostil para as mulheres. Rosecleide, no entanto, não se importava muito e seguia acompanhando o time. Mas quando a família descobriu, vieram as consequências, que foram muito cruéis para a jovem torcedora do Vitória.

- Eu pegava o trem escondida para seguir o Vitória. Fazia tudo o que você possa imaginar. Quando minha família descobriu, me bateram, me espancaram. Eu ainda era adolescente. Foi aí que eu disse: "Eu vou me revelar e vou ganhar o mundo". Saí de casa e começou minha luta. Fui livre como um pássaro. Depois que me revelei como torcedora do Vitória, sofri muito. Não quero relatar tudo o que passei, mas foi muito sofrimento.

Símbolo de resistência

Rosecleide recebeu a reportagem com o rosto completamente coberto pelas cores vermelha e preta, que juntas traçavam o escudo do Esporte Clube Vitória. Ela fez parte da geração conhecida como "Caras Pintadas" no Barradão, por conta da sua ousadia e modos diferentes de expressar seu amor pelo time.

Mas o que pouca gente sabe é que esse costume de pintar o rosto surgiu como um símbolo de resistência ao preconceito no futebol e à repressão que existia dentro da própria casa da torcedora do Vitória.

- Quando conheci meu marido, ele não aceitava que eu fosse ao estádio. Naquela época, diziam que mulher tinha que ficar em casa. Mas eu me rebelava, comecei a pintar o rosto em 1985 e saía assim, sem ninguém saber quem eu era.

Rosecleide nunca aceitou esse lugar que era socialmente destinado à ela e, com sua alma rebelde e o amor pelo Vitória correndo nas veias, rodou o Brasil atrás da sua maior paixão, com o rosto pintado e a esperança de ver o clube em dias melhores.

- Mesmo com meu marido incomodado, eu seguia firme. Ele dizia que eu era maluca, que meu lugar era em casa, mas eu não aceitava. O Vitória era minha paixão e meu símbolo de liberdade.

- Eu deixava tudo em ordem em casa e seguia o Vitória, mesmo sem dinheiro. Passei dificuldades, fome, mas nunca abandonei o clube. Em muitos lugares, eu conseguia comer por causa da minha história. Quando o Vitória subia, eu voltava e pagava tudo. Mesmo com dificuldades, segui o clube em todo o Brasil. Dormi em estações, enfrentei desafios. Minha família não entendia meu amor, meus filhos sofriam preconceito na escola, mas eu não desistia - completou a torcedora do Vitória, com orgulho.

Nunca desistir

Depois da entrevista, era hora de fazer o caminho que Rosecleide mais gostava. Pegar seu leão de brinquedo e a luva de boxe, que também representa a luta de uma vida inteira em prol do Vitória, e ir ao Barradão. Um dos seus amigos de longa data que o Vitória proporcionou leva a torcedora de carro para a maioria dos jogos, e o Lance! aproveitou para acompanhá-los no trajeto.

A partida entre Vitória e Cerro Largo estava marcada para as 21h30 (de Brasília), mas chegamos com antecedência ao Barradão. Rosecleide, inclusive, entra por um portão diferente, o mesmo que dá acesso ao ônibus com os jogadores, o que facilita a chegada dela. Era por volta das 20h, e o movimento ainda estava fraco, mas as poucas pessoas que lá estavam reconheciam Rosecleide, que era cumprimentada por vendedoras de acarajé, seguranças e torcedores de todas as gerações. É um reconhecimento merecido para quem dedicou a vida ao clube.

Foi de um pequeno mirante no setor das cadeiras, que fica na parte central do Barradão, que Rosecleide viu o time perder para o Cerro Largo por 1 a 0, resultado péssimo para as ambições da equipe na Sul-Americana.

Mas ela sabe que nada é fácil. Para quem desafiou a família, o marido e toda uma sociedade que não entendia o sentimento dela, os fracassos esportivos são o de menos. Isso Rosecleide consegue superar e voltar ainda mais forte.

- Hoje, vejo o Vitória novamente em reconstrução. Acompanhei o clube cair para a Série C e depois voltar para a Série A, jogando a Sul-Americana. Mesmo em momentos difíceis, meu amor nunca mudou. A paixão que me fez lutar no passado segue viva. O Vitória é minha história.

- Recentemente, o Vitória estava mal na Série C, e eu estava internada. Mas mesmo no hospital, meu coração estava com o clube. Quando o Vitória voltou à Série A, eu senti que meu amor foi recompensado. E agora, vejo o Vitória em reconstrução novamente. Um clube que, mesmo entre altos e baixos, continua sendo meu grande amor. Porque amar o Vitória é isso: é resistir, é sonhar e nunca desistir - declarou-se.

Após o apito final, lá estava ela, voltando para o carro a passos lentos, por conta da sua dificuldade de locomoção, e abatida pelo resultado, mas com a garra de quem vai acompanhar o Vitória até o último dia da vida, independente do que acontecer. É como uma mãe que coloca o filho para dormir e espera ansiosamente para vê-lo novamente, vibrante, alegre e pulsante. Esse "filho" chama-se Esporte Clube Vitória.

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