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BRASILEIRO 2022

Debate ético chega ao futebol e 'cancela' contratação de jogadores

Casos relacionados a crimes fazem jogadores como o goleiro Bruno e o atacante Robinho serem rejeitados por torcedores dos clubes

Futebol|Eugenio Goussinsky, do R7

Robinho foi condenado na Itália
Robinho foi condenado na Itália

A cultura do "cancelamento" no futebol se encaixa no que vem ocorrendo em vários setores da sociedade. Mas com um objetivo típico: fazer da paixão pelo clube um instrumento em direção a questões éticas.

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Há casos de injustiças, movidos a fake news e intolerância. Mas também têm sido constantes os casos em que a idolatria dá lugar à rejeição e à indignação com atitudes graves, como violência contra a mulher, racismo e impunidade. Mesmo com a postura indiferente de alguns dirigentes.

Nesta linha, o torcedor acaba descartando bons jogadores e até ídolos que cometeram crimes ou foram condenados, como nos casos do goleiro Bruno, ex-Flamengo, e do atacante Robinho, ex-Santos.


Bruno cumpre pena por participar do assassinato da mãe de seu filho, Eliza Samudio, em 2010, e, somente depois de alguns anos de tentativas, acabou encontrando um time que o acolhesse: Rio Branco do Acre, em julho de 2020.

Mas, mesmo com liberação da Justiça para atuar, ele ainda é alvo de uma imensa rejeição no meio futebolístico e na sociedade em geral, por seu ato atroz.


"É um problema complexo, nestas situações eles precisariam de um acompanhamento psicológico antes e também durante o retorno. A Justiça permite, mas é preciso bom senso. Mas requerer bom senso de quem cometeu o crime é algo complicado. O próprio Bruno deveria saber que no futebol há uma visibilidade que o fará ficar marcado como um exemplo negativo. Deveria buscar outra ocupação. Se ele não percebe isso, abre brecha para ser contratado. E teoricamente mostra que não está nem aí com o que ele fez", afirma o colunista Caio César Nascimento, de 29 anos.

Pelo menos quatro clubes, visando aos seus próprios interesses comerciais, tentaram contratá-lo, mas logo voltaram atrás, por causa da pressão da sociedade, que feriu estes mesmos interesses.


"Os clubes e jogadores mobilizam as paixões no futebol e são representantes da identidade dos torcedores. Quando há jogadores que são alvo de escândalos e protagonizaram situações graves, um pai, por exemplo, não vai querer que seu filho tenha como referência este jogador", afirma João Ricardo Cozac, psicólogo do Esporte e presidente da Associação Paulista da Psicologia do Esporte.

Limite da paixão

Até mesmo em relação aos ídolos, a paixão tem limite. Títulos, glórias, orgulho e gratidão acabam sendo apagados por uma grande decepção para torcedores. Em 2017, o atacante Robinho, que está sem clube, foi condenado a nove anos de prisão na Itália, acusado de participar do estupro de uma jovem albanesa em 2013, em conjunto com cinco homens. Ele critica a condenação e afirma "não ter qualquer participação no episódio."

A notícia de que Robinho estaria próximo de retornar para o Santos, onde despontou em 2002 com o título brasileiro, não foi bem recebida por parte da torcida. Torcedores têm pressionado a diretoria para não vincular o nome do clube a este tipo de situação.

"Ele trouxe glórias, mas há um limite do aceitável. Ele já foi condenado por um crime na Itália. Jogador de futebol não deve ter salvo-conduto, nem mesmo o ídolo. Não existe explicação para defender a volta dele. Nem condiz com que o clube defende nas redes sociais, que é o respeito à mulher. Robinho não foi aceito em vários países e teve de ir jogar na Turquia, por se tratar de um país onde há muito machismo e não se liga tanto para isso", destaca Caio César, que é torcedor do Santos.

Para o profissional de informática, Vinícius Wesley Cassin, de 26 anos, a contratação de Robinho não seria boa para a imagem do Santos, em função desta condenação.

"Ele tem uma história no clube, mereceu a admiração da torcida, mas existem situações em que o ídolo precisa ser tratado como qualquer ser humano, e essa é uma delas. É um cancelamento no sentido de reflexão, já que o Santos é um clube de visibilidade mundial", observa.

O psicólogo Cozac observa que o futebol é um esporte que mobiliza muitas paixões, criando uma fusão emocional entre torcedores, clubes e jogadores. O clube, neste sentido, acaba sendo uma extensão do lar do torcedor, um palco onde ele coloca seus valores, seus desejos, seus anseios. Quando um jogador comete um crime, acaba rompendo esse elo, como se destruísse um pacto de confiança.

"Dentro desta fusão há uma análise sobre a identidade, que é muito construída na ação. Atletas, que representam e fundamentam essa relação de tanta mistura de identidades entre torcida e jogadores, quando não têm o comportamento digno da apreciação, da paixão e da doação da torcida, acabam sendo reprovados e, dependendo dos casos, o cancelamento acaba ocorrendo".

Rejeição atleticana

Também em situações mais leves, que não envolvem crimes, há cancelamentos que ocorrem de maneira implacável. Muitas falas não são esquecidas. A rápida disseminação da informação serve para noticiar um fato que é modificado horas depois. Foi o que ocorreu com Thiago Neves em setembro último. Assim que foi dispensado do Grêmio, o meia negociou com o Atlético-MG, mas a forte rejeição da torcida fez a diretoria voltar atrás no mesmo dia.

Ele acabou sendo recusado pelo fato de ter comparado, por exemplo, a queda da barragem de Brumadinho com a do então rival Atético-MG para a Série B do Brasileiro, tendo depois retirado o post. Na ocasião, ele jogava pelo Cruzeiro, clube no qual acumulou algumas polêmicas, principalmente durante a curta passagem do treinador Rogério Ceni.

"Fui super contra a contratação do Thiago Neves. Por motivos comportamentais. A brincadeira no futebol é bacana e saudável até que não invada o limite do outro. Ele invadiu e ultrapassou qualquer bom senso", afirma o atleticano Rubens Coronho, 50 anos, administrador de empresas.

Cozac considera que nestes casos mais simples, a paixão do torcedor também acaba, de forma inconsciente, se manifestando em direção a alguns valores que vão além do futebol.

"Não só os mais graves, mas casos mais leves também são observados, julgados, criticados por torcedores que querem ser representados por atletas, profissionais que tenham preocupação, zelo, cuidado e ética ao representarem essa paixão da torcida, movida também pelo comprotamento dos atletas no dia a dia e em relação ao clube", completa o psicólogo.

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