Wolfenstein 2: The New Colossus tem humor e tiroteios na dose certa
Game de tiro vai contra a maré e entrega ótima experiência single player
Jogos|Tiago Alcantara, do R7
Imagine um jogo em que você assume o papel de um protagonista que decide lutar contra as forças opressoras de um mundo dominado pelos exércitos nazistas.
Ao considerar essa premissa, talvez não seja apenas uma mera coincidência que Wolfenstein 2: The New Colossus chegue em uma época conturbada em que discussões raciais voltam a entrar em pauta e em um momento em que o mercado de jogos eletrônicos passa por uma mudança de foco em títulos multiplayer; afinal, o game mostra todo o seu potencial, justamente, lidando sem reservas com essas duas questões problemáticas, e com muita eficiência.
Narrativa pessoal
Nos primeiros momentos do game, somos apresentados ao jogo com um breve resumo de todos os fatos que culminaram no atual coma do protagonista William "B.J." Blazkowicz, que desperta seis meses depois do desfecho de The New Order com memórias de seu passado, marcado, em grande parte, pela relação autoritária e abusiva com seu pai.
Embora as sequências iniciais sejam chocantes, é exatamente essa a força motriz que coloca o jogador em um estado de empatia com o protagonista, em uma narrativa que abre mão de uma motivação em que salvar o mundo é a coisa mais importante para se tornar uma envolvente jornada pessoal. E isso funciona muito bem aqui.
Outro ponto relevante do enredo é a relação de Blazkowicz com os outros membros da resistência, com coadjuvantes muito carismáticos que garantem cenas hilárias e diálogos criativos que sempre surgem em uma cena ou outra para trazer um pouco mais de profundidade ao universo do game.
Ao mesmo tempo em que o game diverte com suas piadas e situações improváveis, Wolfenstein II também é corajoso e ousado ao falar sobre racismo e intolerância, associando constantemente tais posicionamentos aos membros e líderes do exército nazista de forma um tanto quanto caricata, mas que não destoam completamente da realidade social e política do mundo atual. A sensação, no final das contas, é a de que tudo foi feito no tom certo para que a mensagem não caia na problematização batida de discursos por igualdade.
O resultado de tudo isso é nada além do que se espera: uma campanha memorável, repleta de momentos épicos e que certamente vão povoar as lembranças dos jogadores por muito tempo. E tudo isso é algo que seria praticamente impossível de ser feito se Wolfenstein 2 seguisse os moldes dos recentes games de tiro em primeira pessoa focados no multiplayer.
Vamos falar sobre jogabilidade
Se por um lado, o enredo do jogo acerta em diversos pontos, será que podemos esperar pelo mesmo nível de qualidade na parte de jogabilidade de The New Colossus? Sim!
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Apesar de Wolfenstein : The New Colossus não “reinventar a roda” no gênero FPS, a sequência do game traz melhorias em todos os sentidos em comparação ao seu antecessor. Grande variedade de armas, cenários maiores e mais verticais para favorecer investidas furtivas, eliminações silenciosas variadas e armas pesadas que concedem vantagens temporárias são só alguns dos componentes que deixam tiroteio mais dinâmico e estratégico.
E por falar em estratégia, agora é possível escolher entre a utilização de uma única arma por vez ou de duplas simultâneas. Isso adiciona decisões táticas, colocando o jogador em situações em que é necessário decidir entre gastar toda a munição com duas metralhadoras ou investir na precisão de uma única arma de fogo.
O game equilibra muito bem as situações furtividade e de ação. As eliminações silenciosas são sempre as mais vantajosas, uma vez que, além da economia de munição, proporcionam avanços mais seguros pelos cenários sem uma horda de inimigos atirando em sua direção.
Nos momentos de tiroteio, The New Colossus possui características similares a Doom (2016). Isso significa que não são raras as situações em que a inteligência artificial dos inimigos vai se aproveitar de cada vulnerabilidade do jogador para criar emboscadas, exigindo do jogador o máximo de atenção e atividade constante durante os combates.
Se você é do tipo que valoriza a exploração, não vão faltar documentos, itens colecionáveis e artes conceituais do game espalhadas pelas fases. Vascular todos os cantos dos cenários também rendem kits de melhorias, que podem ser utilizados para melhorar e adicionar propriedades específicas em suas armas de fogo.
Você também pode coletar documentos do Enigma em corpos de generais abatidos para desbloquear missões secundárias, bem como desfrutar do sistema Contraptions, que recompensa o cumprimento de objetivos opcionais no mapa para desbloquear habilidades de combate e movimentação para Blazkowicz.
Trilha sonora e dublagem
O trabalho de localização do game no Brasil é outro dos pontos fortes que não podem ser deixado de lado, resultando em uma dublagem em português de qualidade, que apesar do recorrente problema de sincronização labial, mantém toda a carga emocional dos personagens e não economiza nos palavrões e gírias das falas originais.
A trilha sonora, ainda que pouco variada, é outro aspecto a ser elogiado, embalando com maestria todos os momentos de combate e tensão com ritmos apropriados e que não soam nem um pouco repetitivos durante toda a campanha.
Um tropeço aqui e ali
Por mais que os cenários e efeitos especiais do jogo estejam dentro dos padrões gráficos da geração atual de consoles, não pude deixar de notar em diversos momentos que as expressões faciais durante as sequências jogáveis deixam muito a desejar. Vale notar que o mesmo deslize não se aplica às cenas pré-renderizadas, que detalham com profundidade o sentimento de cada personagem nos momentos mais dramáticos.
Outro ponto que incomoda um pouco são as raras situações em que você eliminou todos os inimigos e não há nenhum tipo de indicação clara do que é necessário fazer para avançar pelo cenário, deixando o jogador em uma situação em que é necessário testar todas as possibilidades até que alguma coisa ocorra. No entanto, é possível pressionar o botão de ajuda para que o game indique para onde você precisa ir, sendo este um problema pequeno e totalmente contornável.
Veredito
Wolfenstein 2: The New Colossus consegue dar conta do recado ao abordar um tema polêmico e mostra todo o seu potencial criar um universo envolvente e com personagens marcantes, e tudo isso sem deixar de lado a sua qualidade em aspectos de jogabilidade.
É admirável a forma como o estúdio Machine Games conseguiu dar sequência ao jogo Wolfenstein: The New Order sem perder o fôlego da narrativa, oferecendo uma das experiências mais imersivas e satisfatórias dos últimos tempos.