Horizon: Zero Dawn: em busca do aço encantado
Estratégia, paciência e curiosidade são essenciais para desbravar o título
Jogos|Victor Fermino, do R7
Lembra de quando a fadiga de mundo aberto começou? Quando quase todo jogo parecia oferecer uma variação da mesma fórmula, começamos a querer coisas mais lineares. As lutas de veículos em Mad Max eram divertidas, o realismo em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain era impressionante e as explosões em Just Cause 3 eram engraçadinhas, mas parece que a indústria só pegou o jeito depois de um bom tempo. Primeiro, com The Witcher 3: Wild Hunt, e agora, com o novo The Legend of Zelda: Breath of the Wild e Horizon: Zero Dawn. A união do paradigma mundo aberto com a vontade de fazer algo novo é até condizente com o universo do jogo, que é primitivo mas tem tecnologias avançadíssimas.
A primeira coisa que você vê é como Horizon é bonito, mesmo no PS4 normal e sem HDR. Não precisa se preocupar em comprar um PS4 Pro e uma TV 4K só pra ele. O que mais chama a atenção graficamente é a variedade de cores. Apesar do mundo de Horizon ter bastante marrom e laranja, devido a cânions e desertos, a paleta é bem contrastante, já que as máquinas emitem luzes azuis e a luz do eventual luar tira a saturação chata do Sol. Além das cores, o jogo apresenta modelos bem detalhadas e animadas.
Entretanto, o aspecto que mais chama a atenção é a direção de arte dos ambientes mais sci-fi: como você sabe, Horizon é um misto de mundo tribal com ficção científica, e é nos momentos mais futuristas que ele se mostra impressionante. Lugares mais cheios de tecnologia apresentam muito neon, além de estruturas complexas, que me fizeram querer usar o modo Fotografia mais do que estou acostumado. E não são só as estruturas: os inimigos robóticos também provocam uma sensação de ameaça, por terem armas e tanques de combustíveis, mas também passam uma sensação de familiaridade, por se parecerem com dinossauros e animais já conhecidos.
E a performance também não é ruim. É claro que não roda a 60 quadros por segundo, mas ao menos o jogo se mantém em 30 constantemente, mesmo em combates mais intensos.
Horizon não tenta reinventar as ideias fundamentais de RPGs open world; pelo contrário, o exclusivo de PS4 se dedicou a criar uma experiência polida usando coisas que já conhecemos. Sabe aquela coisa de subir em torres para revelar o mapa, coisa que a Ubisoft é criticada por fazer sempre? Ela está presente em Horizon, mas aqui, as torres são dinossauros pescoçudos de metal. Eles se locomovem, e nunca estão sozinhos. Sabe as mecânicas de RPG colocadas em jogos de ação para criar longevidade artificial fazendo você dedicar horas a ganhar XP para poder avançar? Em Horizon, upar não serve para muita coisa. Você ganha pontos de habilidade, e um pouco de HP, mas nenhuma habilidade te deixa imediatamente muito mais forte, e os acréscimos na sua vida não adiantam muito se você for pego de mal jeito por um Tirânico.
Upar pode não ser uma das coisas que você vai buscar fazer, mas isso não quer dizer que o jogo é um RPG falho. Há uma roda de diálogos, parecida com Mass Effect e Dragon Age, e assim como nestes jogos, há decisões morais. São três tipos de resposta: a violenta, a racional e a gentil. Infelizmente, não posso dizer que suas respostas ditam os resultados da história. No fim das contas, o jogador não tem muita agência sobre o papel de Aloy na história.
Além disso, coletar e construir materiais é um ponto extremamente importante no combate de Horizon. Se você jogar na dificuldade normal, é provável que só perceba isso quando for tarde demais. Isso porque o espaço para guardar recursos é ridiculamente pequeno, e os inimigos deixam muitos itens para trás. Se você ficar preso em alguma missão e precisar lutar contra um inimigo fraco contra bombas, é melhor rezar para ter os itens necessários, porque senão você vai ter que jogar alguns recursos fora e rezar para ter algum cadáver com o que precisa por perto.
Felizmente, você pode aumentar a capacidade da sua bolsa de recursos, mas isso também requer materiais relativamente raros, vindos de animais como javalis e coelhos. Isso quer dizer que você vai dedicar uns bons minutos caçando bichinhos indefesos se quiser evitar dores de cabeça depois. Esse é um dos pontos nos quais Horizon fica chato e repetitivo, mas não é o único.
Horizon brilha nos combates
O combate de Horizon é um verdadeiro deleite. Tem muitos jeitos de se aproximar de um inimigo e atacá-lo, e cada um dos tipos de dinossauro robótico tem um desafio diferente. Os voadores são completos babacas e você vai odiá-los para sempre, mas eles não deixam de ser divertidos. Isso porque esse é um dos poucos jogos, além de Monster Hunter e, talvez, Dragon’s Dogma, que te força a pensar como um caçador. Claro que você pode simplesmente correr e enfiar a sua lança em todo mundo, afinal a Aloy não cansa de correr, mas é arriscado. Usar seu Foco (basicamente a visão de detetive) para analisar o ambiente, marcar os inimigos, observar suas fraquezas e entender suas rotas é muito mais eficaz, especialmente quando há muitos inimigos.
Mesmo quando eu tinha equipamentos melhores e tinha bastante HP, subestimar inimigos menores sempre me surpreendia, porque a inteligência artificial dos répteis de lata adora cercar o jogador e pegá-lo de surpresa. Por isso Horizon é um dos exclusivos mais desafiadores de PS4 — as lutas são justas e exigem atenção aos seus recursos e arredores, além de decorar padrões de movimento, como habitual.
Mas, claro que nem tudo são flores: como eu disse, o combate é muito flexível, então tem muitos jeitos de derrubar um inimigo. O jogo foi feito com isso em mente, mas a verdade é que todos os chefes do jogo ficam bem mais fáceis com bombas explosivas ou de proximidade. Chega a ser cômico, até porque os ingredientes dessas bombas não são raros. O problema é só ter espaço para elas na sua bolsa.
E se a inteligência artificial dos dinossauros é digna de elogios, o mesmo não pode ser dito dos humanos, que produzem as piores lutas do jogo: eles ficam parados no mesmo lugar, não se coordenam, e para piorar, o jogo adora fazer com que eles tenham muito HP.
Outra dificuldade vem da exploração: Horizon é um jogo com mecânicas transversais muito boas, geralmente. Você consegue subir e descer montanhas com facilidade, e isso se aplica às dungeons também. A dificuldade vem dessas dungeons e seus layouts horríveis. O problema é que você não percebe isso da primeira vez que visita cada uma porque o jogo te mostra para onde ir e como ir, mas se você voltar a esses lugares, vai acabar se perdendo. A dica é explorar cada canto na primeira vez, para não ter que voltar nunca mais, até porque não tem combate nesses lugares.
Felizmente, há outras distrações além de explorar dungeons confusas e lutar contra inimigos regulares: os Caldeirões são dungeons mais lineares e interessantes, com combate e visual mais marcante. E o incrível é que eles são opcionais, e só fiz o primeiro depois de terminar o jogo.
Quanto à duração, demorei aproximadamente 20 horas para chegar ao fim da história principal, e ignorando boa parte dos objetivos secundários. Ainda tenho algumas outras missões para realizar agora e coisas para descobrir, mas é um jogo de tamanho razoável, que chega a lembrar RPGs de PS1 pelo tamanho.
Já quando se trata de som, fiquei meio dividido, porque, primeiramente, a trilha sonora é muito boa. Não é o tipo de música que eu procuraria ouvir no Spotify depois, mas a execução é tão dinâmica e homeopática que mal dá pra se incomodar com as faixas. A dublagem também não é ruim, na versão portuguesa.
O problema mesmo é a falta de uma necessidade de usar o som para sua vantagem. Num jogo tão comprometido a trazer uma experiência de caça imersiva, é estranho não sentir a necessidade de usar som de forma mais estratégica. Claro que isso se deve ao fato das máquinas serem grandes animais escandalosos com neon que anunciam cada ataque, mas isso seria legal no caso de combate contra humanos. Ou talvez a Guerrilla Games pudesse ter colocado uma maior variedade máquinas sutis, afinal já existem dinossauros invisíveis no jogo. Mas talvez isso venha numa iminente continuação.
Apesar do jogo não ligar muito para as suas escolhas, a história não é ruim. Na verdade, é até muito boa! Claro que algumas das revelações se enfraquecem quando consideramos o nome da protagonista, ou algumas cenas de trailers, mas a verdade é que o jogo tem uma narrativa consistente, que adora mostrar alguma loucura insana do melhor jeito possível. Até as side quests que parecem mundanas acabam dando em alguma conspiração de algum culto bizarro, com um conflito literalmente explosivo ou algo assim. O diálogo pode não ser dos melhores, mas o ritmo com o qual a história anda é excelente. A caracterização é… decente? Difícil dizer. A Aloy é uma personagem interessante, e os coadjuvantes tem uma boa exposição também, mas as últimas poucas horas de jogo acabam com isso. Na verdade, o clímax desse jogo é bem ruinzinho, porque descarta qualquer possibilidade de revelações interessantes, e abraça os clichês do gênero de ação.
Infelizmente, não é só a história que os momentos finais do jogo estraga; a última missão é preguiçosa e anticlimática a ponto de parecer uma piada. Não é um JRPG, então eu não esperava nada muito escandaloso, mas pareceu faltar verba, ou até ousadia. Se serve de consolo, o final do jogo em si é satisfatório, e deixou um gosto bom. Só espero que a eventual continuação corrija os problemas e venha com ideias novas.
Horizon: Zero Dawn não é só um dos principais exclusivos de PS4 do primeiro semestre; ele é uma amostra de uma nova forma de fazer jogos open world. É um jogo que parece refinado e experimental ao mesmo tempo, e dá bastante espaço para se tornar uma franquia. Apesar de algumas críticas, valeu muito o tempo investido, e é um jogo daqueles que você recomenda para todo mundo que compra um PS4, não só por ser bonito, mas por ser divertido e representativo do que devemos ver no futuro.
Nota 10
Horizon: Zero Dawn - PS4