Torcedores trocam ameaças pelo Facebook após morte de corintiano por espancamento
Rede social virou palco de guerra virtual e de promessas de mais assassinatos
Futebol|Gustavo Alves, do R7
A guerra entre torcidas organizadas fez mais uma vítima. Segundo relatos de familiares, o corintiano Felipe 'Dime', de 17 anos, foi espancado até a morte quando se dirigia para a quadra da Gaviões da Fiel na noite de sábado (24).
Pelas redes sociais, familiares lamentaram a morte do garoto. A irmã de Dime entrou no Facebook dele para informar aos amigos sobre a tragédia. Indignada com a violência, mandou um recado para os vândalos que se travestem de torcedores:
— Estou informando aos amigos que na noite de ontem, meu irmão veio a falecer,motivo? covardes que agrediram ele ate vir a obito, voces amigos que arrumam confusão por tudo, agridem as pessoas como se não houvesse consequencia, mais há e as piores possiveis.Passarem informações sobre velório e enterro assim que formos informados.
No mesmo post sobre a morte, torcedores do Corinthians apontaram a torcida do Palmeiras como responsável pelo assassinato. Um corintiano, amigo de Dime, aproveitou a oportunidade para ameaçar de morte os torcedores do clube rival.
— Mata 1 morre 2 nossa corrente não será quebrada !!
Um palmeirense, que acompanhava atentamente a movimentação dos comentários — e pareceu estar envolvido no espancamento — usou o espaço no Facebook para responder à ameaça.
- Ae (nome do torcedor corintiano) segura tem mais....O próximo pode se VC...aki é a Mancha...e a corrente de vcs vai servi pra colocar dentro do seu caixão.
Momentos depois da mensagem do palmeirense, o corintiano apagou o comentário. Outros amigos começaram a pedir ao integrante da organizada do Palmeiras para pelo menos "respeitar a dor da família" naquele espaço.
Em outra página, porém, as ameaças continuaram. No Facebook da Gaviões da Fiel, o post sobre a morte de Dime também foi usado por corintianos para promessas de morte aos palmeirenses. Um deles prometeu vingar o colega nesta segunda-feira (26).
— Eu vou cobrar a morte desse muleque, me aguarde seu porcú imundo. Vou matar vc na faca...sem dó nem piedade. Eu adoro matar porco também, q se f... o promotor e a justiça. Mas isso não vai ficar assim não...amanhã vai subir um porcú morto.
Em um grupo do Facebook, chamado "Porcão x Gaviões: Rivalidade em campo sempre haverá", formado por torcedores dos dois times, palmeirenses teriam comemorado o assassinato do garoto.
A Gaviões da Fiel divulgou uma nota em seu site oficial sobre o falecimento de Dime.
"É com muito pesar, que informamos o falecimento do nosso amigo, irmão, Dime. Um Gavião, um Corinthiano, que nasceu e cresceu nos Gaviões. A família Gaviões da Fiel lamenta muito essa grande perda e transmite os nossos sinceros sentimentos a todos os amigos e familiares do Dime, um menino bom, trabalhador, novo, cheio de vida e que nos fará muita falta.
O velório esta acontecendo no Velório Cemitério Nossa Senhora Salete, localizado na R. Dr. Zuquim, 1698 – Santana. Enterro será no Cemitério da Cachoerinha as 13hs, Endereço: Avenida João Marcelino Branco - Vila Nova Cachoeirinha.
//DIME ETERNAMENTE EM NOSSOS CORAÇÕES// #luto"
Impunidade impera na guerra declarada entre torcidas
Segundo levantamento feito pelo R7 em dezembro, a rivalidade entre torcidas organizadas já havia deixado ao menos 101 mortos nos últimos 26 anos. O corintiano Felipe 'Dime' seria a 102ª vítima. Entre as mortes, 65 foram por tiro, 14 por espancamento e 23 por bomba, atropelamento, pedradas, entre outros.
O último registro feito no Estado de São Paulo havia acontecido em 19 de outubro de 2014. Leonardo da Mata Santos, de 21 anos, morreu atropelado no km 18 da rodovia Anchieta quando palmeirenses atacaram santistas que subiam a serra sem escolta policial.
O Estatuto do Torcedor, implantado em 2003, responsabiliza os clubes pelo comportamento de seus torcedores. Diante desse quadro, que pode resultar até em expulsão de competições, muitos clubes optaram por se desvincular das torcidas organizadas, caso do Corinthians, com o presidente Mario Gobbi, e do Palmeiras, sob o comando de Paulo Nobre.
Em entrevista ao R7 em dezembro para falar sobre a violência entre torcedores, o então ministro do Esporte Aldo Rebelo falou que proibir a existência de organizadas seria um ato fascista.
— É preciso haver um equilíbrio entre coibir e reprimir. Essas ações precisam ser efetivas. Estamos conversando com todas as instâncias, com o Ministério Público, as polícias federal e estaduais, as secretarias de Justiça. Isso é, inclusive, de interesse das torcidas porque estas mortes acabam degradando a imagem destas entidades, só reduzindo o papel delas aos olhos da sociedade e servindo de pretexto para setores fascistas, que querem colocá-las na clandestinidade.
De acordo com um levantamento do Ministério do Esporte, feito pela Secretaria Nacional do Futebol e da Defesa do Torcedor, a impunidade tem prevalecido nessa guerra entre torcidas, já que apenas 3% dos assassinos estão presos.