Por que Thiago Braz empacou após o ouro no Salto com Vara do Rio/16?
Para Vitaly Petrov, o seu treinador, nada mais natural. O brasileiro era um "espontâneo" que se aprimora tecnicamente em busca do bi em Tóquio.
Silvio Lancellotti|Do R7 e Sílvio Lancellotti

Desde que formalizou a sua participação olímpica nos Jogos de Antuérpia, Bélgica, em 1920, o Brasil apenas conquistou cinco medalhas de ouro no Atletismo, aquele batizado, corretamente, de Esporte Base. O já saudoso Adhemar Ferreira da Silva (1927-2001) arrebatou duas no Salto Triplo, em Helsinque/52 e Melbourne/56. Daí se passaram quase trinta anos até que, em Los Angeles/84, Joaquim Cruz vencesse os 800m. Só em Pequim/2008 a primazia coube a uma mulher, Maurren Maggi, no Salto em Extensão. E enfim, Thiago Braz da Silva abiscoitou o Salto com Vara no Rio/2016.

Foi uma surpresa deliciosa. O evento havia se iniciado no dia 5 de Agosto mas, ao contrário do que tinha fantasiado o COB, Comitê Olímpico do Brasil, até a segunda-feira, dia 15, o País penava para somar pódios à sua insignificante coleção. Todavia, surpresa deliciosa, e inesperadíssima, o ouro despontou de uma prova complexa e numa noite de tempestade brutal, uma chuvarada capaz de interromper, várias vezes, o torneio da modalidade no Estádio Nílton Santos, o alcunhado Engenhão. Desabada, com muita fúria, desde as 20h, a intempérie, afortunadamente, cessou nos entornos das 22h.

Sim, afortunadamente, bem no exato momento em que Thiago, um paulista de Marília, 22 de idade, principiou a sua escalada: 5m65, 5m75, 5m85, 5m93, marca que já lhe garantia a prata, atrás apenas do francês Renaud Lavillenie, ouro em Londres/2012, o recordista mundial desde um torneio na Ucrânia, em 2014, com 6m16, e o novo recordista dos Jogos desde dez minutos antes, com 5m98. Pois Thiago ousou. Pediu o sarrafo a 6m03, marca inédita em sua carreira. Valeu, passou, brilhante. Acuado, Lavillenie pediu o sarrafo em 6m08. Dispunha, porém, de mais uma única chance. Vaiado, se abalou e falhou. Antológico: Thiago com o ouro e, também, o novo recordista dos Jogos.

O rapaz havia inaugurado a sua bela história na Vara em 2009, com meros quinze anos de idade, ao superar os 4m40 e abiscoitar um bronze no Sul-Americano de Juniores em São Paulo. Daí, espetacularmente, evoluiu. Em 2010, a prata nos Jogos da Juventude em Singapura, 5m05, e o ouro no Sul-Americano de Medellin, 5m10. Em 2011, o ouro no Pan-Americano de Juniores em Miramar, na Flórida/EUA, 5m20. Em 2012, o ouro no Mundial de Juniores de Barcelona, 5m55 e o primado continental no Sul-Americano de Cartagena, 5m83. Daí, estacionou até estabelecer o novo primado continental, em 2016, num meeting de Berlim, 5m93, e o seu fantástico ouro do Rio.

Só que, após o Rio, Thiago de novo empacou. Por quê? Nada mais natural, de acordo com Vitaly Petrov, o seu treinador nos últimos quatro anos, também o preparador de vários talentos estratosféricos como Sergey Bubka e Yelena Isinbayeva, também o orientador de formidável brasileira Fabiana Murer – que, aliás, o apresentou a Thiago. Para Petrov, essas situações de aparente lapso são comuns no trajeto de atletas tão meticulosamente especializados como os praticantes do Salto com Vara. Tudo conta, do tamanho e do peso da Vara, da sua flexibilidade ao local preciso da empunhadura e o crucial número das passadas que conduzem do arranque até as bordas do sarrafo.

Para Petrov, o rapaz de Marília era um “espontâneo” que necessitava de aprimoramento técnico. Tanto que o levou consigo ao seu centro de preparação em Formia, na Itália, entre Roma e Nápoles, onde também cuida de Ana Paula de Oliveira, do Salto em Altura e esposa de Thiago desde 2014. Petrov explica que, sem saber, Thiago já utilizava uma empunhadura melhor que a de Bubka. O tamanho da Vara não importa, as regras não impõem o comprimento ou o peso. A qualidade do Salto, contudo, depende do ponto da empunhadura. Thiago segurava o seu equipamento dez centímetros mais próximo da ponta do que Bubka. Mas, lhe faltava melhorar as passadas.

Não, não se trata de um detalhe insignificante. Quando superou Lavillenie e ganhou o ouro no Rio, Thiago dava dezoito passadas no rumo do sarrafo. Petrov considerou que, com vinte passadas, até os Jogos de Tóquio/2000, o rapaz de Marília deverá sobrepujar o recorde de 6.16 do gaulês. Por isso o treinador não se aflige com o fato de Thiago nunca mais ter reprisado a marca dos 6m03. Depois do Rio, ele se limitou aos 5m60 do meeting de Shangai, em Maio de 2017. E, um tantinho acima, aos 5m70 de Sotteville, na França, poucos dias atrás, no comecinho deste mês de Julho de 2018.

No dia 21, sábado último na contenda da Liga Diamante, em Londres, ele empacou nos 5m46, o sexto lugar, e acumulou 7 pontos – pouco e no entanto o suficiente para incluí-lo entre os doze finalistas da competição. Thiago está bem atrás dos 39 pontos do norte-americano Sam Kendricks, bronze no Rio. Dos 23 do canadense Shawn Barber. E dos 22 de Lavillenie. Na decisão da Liga, no próximo 31 de Agosto, em Bruxelas, na Bélgica, fará a sua corrida ao sarrafo com vinte passadas. Petrov sabe, e Thiago também sabe, que o título apenas chegará caso os seus adversários fracassem. De todo modo, os dois não se abalam. Olham longe. Onde está à espera o bi do ouro em Tóquio.
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