São Paulo, Brasil
"Eu estava bem demais em 1999, mas sabe como é goleiro, né? Disputei o Mundial de Clubes e a Copa do Mundo. Copa é tão tensa quanto, mas é importante que tem sete jogos, três no mínimo. Se você falha no primeiro, tem o segundo para fazer algo.
"O Mundial era um jogo, velho.
"Errei bem ali, e o Palmeiras não tem Mundial por minha causa mesmo.
"Eu até considero (a Copa Rio 1951, um Mundial), mas acho assim: o Palmeiras foi atrás disso depois de o Corinthians ganhar lá no Japão. Tinha que ter corrido atrás disso lá em 1990. Ao invés de comemorar o Mundial de 1951, vai lá no Japão e ganha que é mais justo.
"Fiquei mal para caramba. Agora que o Corinthians é campeão do mundo (em 2012), fico ainda mais. Até então o pessoal não zoava tanto, agora ficou pior. Só o São Paulo e o Santos ainda da época do Pelé tinham Mundial, o Corinthians não tinha. A gente, como palmeirense, falava que era o time "sem passaporte" e que venceu o "torneio de verão" [Mundial de 2000]. Agora, não."
O inesquecível desabafo de Marcos, de 2018, resume bem o sentimento que domina o Palmeiras. O clube com maior patrocínio da América Latina, com o estádio melhor localizado do Brasil, que tem a Puma como fornecedora de material esportivo, tem obsessão por uma nova chance de disputar o Mundial dos tempos atuais, parar de se usar a Copa Rio, como escudo, para garantir aos rivais que também é campeão do mundo.
A controvérsia vem do fato de o torneio de 1951 reunir clubes convidados e que não foi oficialmente.
A Fifa já mudou de postura em relação ao torneio. Em 2007 e 2014 deixou claro que considerava o clube campeão do mundo. No entanto, depois do expurgo ético, com a prisão de vários dirigentes corruptos, a Fifa, em 2017, declarou que o clube venceu um torneio importante. Mas só considera os campeões mundiais a partir de 1960, com a disputa da Copa Intercontinental.
O mais próximo que o Palmeiras conseguiu do Mundial oficial foi em 1999, quando ganhou a Libertadores e perdeu o Mundial para o Manchester United, na falha de Marcos.
São 21 anos de fracassos.
Nestes anos, o Palmeiras foi vice em 2000, perdendo o título em São Paulo, para o Boca Juniors. Depois, caiu na semifinal em 2001, décimo em 2005 e 2006; sétimo, em 2009; 16º, em 2013; 19º, em 2016; 9º, em 2017; eliminado na semifinal de 2018; e nas quartas; de 2019. Nos outros dez anos, não citados, não conseguiu se classificar.
Chegar à disputa da semifinal, a partir de hoje, contra o River Plate, na Argentina, é uma vitória pessoal de Mauricio Galiotte, que mudou radicalmente a filosofia do clube, ao expurgar o executivo Alexandre Mattos, especialista em compras de jogadores e trocas de técnicos. Sem apoiar a base do clube. Mesmo com o Palmeiras colecionando títulos com seus garotos.
Não é só Galiotte quem está empolgado.
Leila Pereira, dona da Crefisa, patrocinadora única do clube, candidata à presidência, apoiada por Galiotte, deseja intensamente a conquista. Seria muito importante para sua eleição, mostraria o acerto da dupla.
Como grande incentivo há um bônus especial para a conquista da Libertadores. O valor é mantido em segredo. Mas os jogadores já sabem.
Abel Ferreira, já captou o clima de euforia da diretoria; da torcida, com direito à presença de centenas de torcedores no embarque do time à Argentina.
Mas o português está fazendo o máximo para que o clima de euforia não chegue nos jogadores.
Só que não deixará o Palmeiras acovardado, como aconteceu na última semifinal de Libertadores do clube, em 2018, com Felipão, enfrentando o Boca Juniors, na Bombonera. Como se fosse um time pequeno.
O português jamais ganhou um título como técnico.
Mas sabe que se encolher é um caminho suicida, hoje.
Mesmo diante da melhor equipe da Libertadores.
Abel decidiu seguir os passos do técnico que admira e que impediu que disputasse a Champions League.
Jorge Jesus.
Não deixar o Palmeiras se intimidar, seja onde for o jogo, diante de qualquer adversário.
Sua ligação com os atletas é de total cumplicidade.
O que exige tática moderna e excepcional lado físico.
O surto de Covid-19 ainda reflete no elenco.
Abel tem enorme desvantagem em relação a Marcelo Gallardo. São dois meses do português comandando o Palmeiras. O argentino está à frente do River Plate desde 2014.
E em seis Libertadores, conseguiu levar sua equipe à cinco semifinais. Campeão em 2015 e 2018 e vice em 2019.
Ele tem o domínio não só do seu elenco, mas do ambiente da competição.
De jogador talentoso, se tornou excelente técnico. Com direito a recusar até a Seleção Argentina.
O River Plate deve começar o jogo com Armani; Montiel, Paulo Díaz, Pinola e Casco; Sosa, Enzo Pérez, De La Cruz e Nacho Fernández; Suárez e Borré. O 4-4-2 muda durante a partida para 4-1-4-1, 4-3-3, 4-5-1, dependendo das circunstâncias. Essa é a vantagem de impor sua filosofia há anos.
Gallardo também vai no limite da competitividade. Não por acaso foi flagrado no sábado aconselhando seu zagueiro Rojas a 'arrebentar o tornozelo' de Tevez, no vibrante 2 a 2 contra o Boca Juniors, pelo Campeonato Argentino.
Ou seja, se preciso for, o time argentino troca a técnica pelos pontapés.
E exerce sempre enorme pressão emocional contra seus adversários.
O Palmeiras de Abel Ferreira deve entrar em campo com Weverton, Gabriel Menino, Luan, Gustavo Gómez e Viña; Danilo (Patrick de Paula), Zé Rafael e Raphael Veiga; Gustavo Scarpa (Gabriel Veron), Rony e Luiz Adriano.
4-4-2, que se torna 4-2-3-1 e 4-5-1. Ferreira exige marcação intensa e contragolpes velozes, objetivos. Nada de troca de bolas inútil nas intermediárias, como o Palmeiras jogava com o demitido Luxemburgo.
Abel não confirmará nem sob tortura. Mas o empate é um resultado que seria muito comemorado, trazendo a decisão da semifinal para São Paulo, na próxima semana, dia 12.
A cúpula palmeirense acompanha com atenção a indição do árbitro uruguaio Leodán González. Ele é considerado instável em jogos tensos.
Abel Ferreira tem trabalhado muito o lado emocional do confronto.
O fato de não haver torcida no estádio Monumental de Nuñez traz mais equilíbrio, teoricamente, à partida.
A mais recente semifinal de Libertadores foi desastrosa para Palmeiras. Eliminação da final para o Boca Juniors. A situação ruim tem relação explícita com a Argentina.
Felipão montou uma equipe acovardada diante do Boca. 2 a 0 para os argentinos.
Em São Paulo, com o Palmeiras desesperado, empate em 2 a 2.
Abel Ferreira sabe o quanto o clube de Galiotte precisa vencer o torneio.
E garante.
O Palmeiras terá coragem hoje na Argentina.
Para seguir sonhando em se livrar da dependência de 1951.
Faltam apenas três jogos para o Palmeiras voltar a disputar um Mundial.
O primeiro passo, fundamental, é hoje, às 21h30...
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