São Paulo, Brasil
"Ele me chamou de negro."
"Agora virou malandragem.
"Malandragem?
"Malandragem, não.
"Você me respeita!"
(Diálogo entre Gerson e Mano Menezes)
"Rogério... Não vai expulsar ele? Está mandando tomar no **. Foi na cara do juiz que mandou tomar no **.
"Se aconteceu... Se estamos errados, estamos errados. A gente não quer estar certo estando errado. Mas aquele menino não iria fazer isso com o Gerson. Eu conheço o jogador, chegou agora, é um guri.
"Quanto tempo parou o jogo? Quanto tempo parou o jogo agora por causa do Gerson? Tem que tomar bico do Daniel (Alves) mesmo. Tem que tomar bico do Daniel, que é mais malandro que tu. Ele quer mandar em todo mundo... Quer mandar no jogo."
(Mano Menezes falando sobre Gerson com Rogério Ceni. Depois, desabafando alto.)
Não bastasse o péssimo desempenho, 24 jogos, oito vitórias, dois empates e 14 derrotas, a postura do treinador em relação à acusação de racismo de Gerson a Ramírez teve um peso enorme.
E Mano Menezes foi demitido do Bahia.
Assim como o colombiano Ramírez tem enorme chance de ter seu contrato rescindido.
Pela acusação de Gerson, de tê-lo chamado de maneira pejorativa, de 'negro'.
O Bahia sempre foi um clube que se posicionou absolutamente contra o racismo.
A diretoria foi suscinta no anúncio da saída do técnico gaúcho.
"O Esporte Clube Bahia comunica que Mano Menezes não é mais o técnico do Esquadrão.
Nesta mesma ocasião aproveitamos para anunciar que, em relação à grave acusação de racismo envolvendo o colombiano Indio Ramírez, o clube se posicionará em breve após finalizar a apuração do caso."
O ex-treinador da Seleção Brasileira segue em assustadora decadência na carreira.
Ele saiu do Cruzeiro, encaminhando o clube à Segunda Divisão. Assumiu o Palmeiras e foi mandado embora depois de apenas 20 jogos.
Vai embora do Bahia, depois de 24 jogos, com o clube, na 16ª colocação, com os mesmos pontos do Vasco, que está na zona do rebaixamento.
O termo 'malandragem' escolhido por Mano Menezes para definir a postura de Gerson em relação à denúncia de racismo foi lastimável.
E que causou enorme rejeição entre dirigentes e mesmo entre torcedores do Bahia.
Mano tinha contrato até o final de 2021.
Ele acreditava que abriria novo filão de trabalho, assumindo uma equipe do Nordeste.
Só ficou de setembro até dezembro.
Mas deu tempo de comandar a equipe na eliminação na Copa Sul-Americana diante do pequeno Defensa y Justicia, da Argentina, além de deixar o Bahia no caminho da Segunda Divisão no Brasileiro.
Mano Menezes perdeu mais um emprego.
Para piorar, a diretoria do Flamengo garante que irá ao STJD contra o treinador.
"Além de apoiar o Gerson na esfera criminal, o Flamengo representará ao STJD contra o atleta que ofendeu racialmete o Gerson, assim como o fará contra o Mano Menezes, que apoiou a ofensa racial e chamou de malandragem. Temos que banir o racismo da nossa sociedade", garantiu o vice-presidente jurídico do Flamengo, Rodrigo Dunshee de Abranches.
Mas a situação pode ficar muito ruim para Ramírez.
No final da noite de ontem, a CBF fez questão de anunciar no seu twitter.
"A CBF está solicitando à Procuradoria do Superior Tribunal de Justiça Desportiva a abertura imediata de uma investigação sobre a denúncia de racismo feita pelo jogador Gerson Santos, do Clube de Regatas do Flamengo, na partida deste domingo (20/12) diante do Esporte Clube Bahia."
Ramírez pode ser suspenso até dez jogos por racismo, ou injúria racial, expressão que a legislação utiliza e miminiza situações lastimáveis de racismo.
Gerson também usou as redes sociais, para mostrar a revolta, a dor. E reiterar sua acusação contra o colombiano Ramírez.
Que teria usado a seguinte expressão com ele, na partida de ontem.
"Cala a sua boca, negro."
"Amo minha raça e luto pela cor.
"O "cala boca, negro" é justamente o que não vai mais acontecer. Seguiremos lutando por igualdade e respeito no futebol - o que faltou hoje do lado contrário. Desde os meus 8 anos, quando iniciei minha trajetória no futebol, ouço, as vezes só por olhares, o “cala a boca, negro”. E eles não conseguiram. Não será agora.
"Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista". Não adianta ter o discurso, fazer campanha, e não colocar em prática em todos os aspectos da vida, inclusive dentro de campo. O futebol não é algo fora da sociedade e um ambiente onde barbaridades como o “cala a boca, negro” podem ser aceitas.
"É uma pena nós, negros, termos que falar sobre isso semanalmente e nenhuma atitude no esporte ser tomada a respeito. E é mais triste ainda ver a conivência de outras pessoas que estão dentro de campo e que minimizaram e diminuíram o peso do ato de hoje no Maracanã. É nojento conviver com o racismo e ainda mais com os que minimizam esse crime.
"Não vou 'calar a minha boca'. A minha luta, a luta dos negros, não vai parar. E repito: é chato sempre termos que falar sobre racismo e nada ser feito pelas autoridades.
"Racismo é crime. E deve ser tratado desta maneira em todos os ambientes, inclusive no futebol.
"Não me calaram na vida, não me calaram em campo e jamais vão diminuir a nossa cor."