Ganhar a Copa América é ótimo. Mas o Brasil não pode se iludir
A chance de vencer a Copa América é imensa. O Brasil é bem melhor que o Peruu. Só precisa ter noção da realidade. O progresso está na Europa
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
Rio de Janeiro, Brasil
Ter, na decisão, hoje, no Maracanã, o Peru, que foi batido por 5 a 0, na fase de grupo, já deixa explícito o nível técnico da Copa América.
O Brasil marcou dez gols, em seis partidas do torneio, e não sofreu nenhum. Não por ser uma supermáquina de jogar futebol. Longe disso.
Os 0 a 0 contra a Venezuela e Paraguai e o sufoco que sofreu da Argentina são boas provas.
É um time coletivo, competitivo, mas que teve pela frente adversários muito mais fracos.
Tite não assume a fragilidade do torneio.
Não pode.
Não deve.
Ele precisa muito de uma conquista.
De um banho de Gatorade.
Ser erguido pelos jogadores.
Voltar a ter a imagem de um vencedor.
Em três anos, ele passou de revolucionário, com aceitação até para ser candidato a presidente, a um decepcionante técnico de repertório limitado.
O fracasso na Copa do Mundo foi imenso. E repercute até hoje. Durante toda a Copa América, a Seleção não foi assediada pelos hotéis onde passou. As fotos que a CBF divulgou, são de hóspedes pedindo autógrafos e fazendo selfies com os jogadores.
Os estádios lotados, a preços caríssimos, fazem parte da paixão do brasileiro ao futebol, da saudade de ver a Seleção no país e também pela certeza de disputa de um torneio que tem tudo para dar um título.
O torneio laboratório, extinto pela Fifa, a Copa das Confederações de 2013 foi o último, no mesmo Maracanã.
E teve o tom ilusório que esta Copa América pode ter.
Há seis anos, quando a Seleção humilhou a Espanha, então campeã do Mundo, imprensa e população ficaram encantados com o time de Felipão, Neymar, David Luiz.
Havia a certeza do hexa em 2014. Mas o que veio foi o 7 a 1, por conta da falta de realidade. Felipão não percebeu que só bateu times fracos na Copa das Confederações e, que seu esquema, 4-2-3-1, foi decorado pelos adversários no Mundial.
O Brasil é mais do que favorito para conquistar o título hoje. Importante para Tite por também não ter Neymar no elenco.
A vida sem ele está provada.
O técnico terá mais argumento para fazer com que o egocêntrio jogador aceite em se encaixar na equipe. E pare de tentar fazer com que o time atue em sua função.
O Peru de Gareca é uma equipe que foi montada há quatro anos. Tem jogadores limitados, mas que se submetem às ordens do argentino. A dedicação em campo é exemplar.
Foi assim que o país voltou a disputar uma Copa do Mundo depois de 36 anos. E comemorou como se fosse um título.
O caminho da chegada à final da Copa América teve a surra para o Brasil por 5 a 0. Se classificar em terceiro em um grupo de quatro. Eliminar o Uruguai nos pênaltis, depois de tomar sufoco histórico.
E fazer sua melhor partida diante de um Chile arrogante, aberto, prepotente. Que nunca acreditou no adversário. E em vinte minutos de jogo, já perdia por 2 a 0, graças a contragolpes eficientes, rápidos, em bloco.
O time é muito bem treinado por Gareca.
Mas limitado.
Seria uma calamidade o Brasil perder a final da Copa América, hoje, aqui no Maracanã. A diferença individual entre os jogadores é abismal. O conjunto brasileiro ainda precisa de encaixe. Mas também se sobrepõe ao peruano.
Tite é muito vivido para dar a única chance de vitória aos peruanos, que seria a Seleção se comportar como os chilenos, que atuaram com seu meio de campo aberto, muito adiantado, distante da defesa.
E cujo time, o colombiano Reinaldo Rueda, não pôde controlar os nervos. Depois de tomar o primeiro gol e parar na marcação peruana de até cinco jogadores na intermediária, os chilenos foram se irritando, perdendo a concentração.
Deixaram espaço fundamental pelas laterais para os contralpes puxado por Advíncula e Trauco. Eles foram peças inesperadas na vitória por 3 a 0.
Guerrero foi guerreiro, segurou dois zagueiros no peito e abriu espaço para Cueva, Flores e Carrillo. Sim, Gallese, que foi tão mal contra o Brasil, se recuperou na competição e deu segurança na reviravolta peruana na Copa América.
Tite treinou muito a saída de bola, a marcação por pressão. Mas também orientou seus jogadores a terem paciência, calma. Dosar o ritmo de jogo, já que é uma final.
Ele garante que a Seleção terá tranquilidade, foco, mesmo se sair perdendo no placar.
A aposta óbvia em Éverton Cebolinha, melhor no 5 a 0, será repetida. Philippe Coutinho terá espaço para maior movimentação, sem se preocupar com recomposição.
Gabriel Jesus e Daniel Alves trouxeram ao técnico o fim da dependência apenas do lado esquerdo ofensivo. Com o Brasil usando o óbvio, os dois lados do campo para atacar, ficará ainda mais difícil para os peruanos se defenderem.
Fora as horas que levou treinando escanteios e bolas paradas. As cabeças de Marquinhos, Thiago Silva e Casemiro serão as referências para as cobranças de Coutinho.
A difença entre os times é gritante.
Mesmo sem Neymar, o Brasil é amplo favorito.
"A Copa América é grande sim", garantiu Tite ontem, na sua última coletiva, antes da decisão.
Mas ela tem, na prática, o desprezo europeu.
O continente dono das últimas quatro Copas do Mundo não leva a sério porque sabe a defasagem tática. Os times sul-americanos ficaram para trás na distribuição, na dinâmica, na velocidade, na intensidade do jogo.
A conquista da Copa América tem o mesmo significado de terminar as Eliminatórias Sul-Americanas em primeiro lugar para a Copa do Mundo.
Como Tite conseguiu em 2017.
E que nada adiantou no confronto com a Bélgica, uma equipe apenas boa no continente europeu. Caiu como Parrreira pela França, Dunga havia sido derrubado pela Holanda, Felipão pela Alemanha.
O Brasil tem de comemorar, festejar, o possível título de hoje.
Mas não perder o senso se realidade.
A evolução está nos confrontos com os grandes times europeus.
Antes do Mundial do Qatar.
Golear em amistosos contra Panamá, El Salvador, Haiti ou vencer a próxima Copa América não levará a nada.
Que Tite não cometa o pior erro.
E se deixe enganar pelo próprio discurso.
O futuro vencedor do Brasil está na Europa.
Aprendendo com quem tem a melhor estratégia.
Dominar o continente americano é mera ilusão...
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