Dança do pombo provou à CBF. O Brasil precisa de um estrangeiro. Jesus, Abel, Castro, os 'fáceis'. Mourinho e Guardiola, sonhos
Tite acabou 'se fechando' demais com os jogadores. Não havia distanciamento. A CBF quer um comandante mais vivido internacionalmente, acostumado com grandes competições. Jesus, Abel e Castro são opções
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
Doha, Catar
Os jogadores da seleção tinham certeza de que venceriam a Copa do Mundo.
Todas as declarações aqui no Catar iam na mesma direção.
Esse entusiasmo é comum em times com equipe com grandes talentos. E acostumados a acumular títulos.
Mas esse otimismo é dosado pelo treinador, pelo comandante, pelo exemplo.
É ele que tem de dar o rumo, de menor ou maior confiança.
O que aconteceu na seleção brasileira foi exatamente o contrário. Foram os atletas que envolveram Tite. O treinador passou a reagir igual aos líderes do time, como Neymar, Daniel Alves e Thiago Silva, que exalavam certeza do hexacampeonato. Admitiam as dificuldades, os pontos fortes dos adversários, mas as partidas não passariam de mera formalidade.
Tamanho o potencial do time.
Tite foi um regular jogador, seu potencial, a inteligente visão de jogo do versátil meio-campista foram travados por contusões nos joelhos. Teve de abandonar precocemente a carreira.
Jamais chegou a ser cogitado para disputar uma Copa do Mundo como jogador. Não tem ideia da ansiedade, da felicidade, da empolgação de quem veste a camisa da seleção brasileira. Ela vira uma armadura amarela, imbatível, que tem de despertar medo nos adversários.
Essa é a visão rasa dos jogadores de futebol.
Jamais do treinador.
Mas Tite se perdeu na Copa de 2022. Ele se deixou envolver. As suas decisões fundamentais foram baseadas nos desejos dos jogadores.
Não na sua visão crítica, distante, que deveria ter aos 61 anos.
Se permitir fazer a dança do pombo, que Richarlison consagrou, foi uma atitude bizarra. Não de alegria. Passou para os adversários a visão de arrogância, prepotência.
Qual técnico dançou com os atletas durante um jogo das quartas-de-final, goleando um adversário muito mais fraco, como a Coreia do Sul?
As celebrações exageradas são para os campeões, depois de uma final.
Antes, não.
Isso é básico para um comandante equilibrado emocionalmente, o que não foi o caso.
Tite disse que desejava passar a "alegria de um povo" dançando. Mas o questionamento das outras seleções e da imprensa do restante do mundo foi de arrogância.
"Só os maldosos vão ver além da alegria", disse Tite, nas suas superficiais, incoerentes e treinadas coletivas de imprensa. Ele tinha não só um, mas dois assessores de imprensa para orientá-lo antes das entrevistas. Luciano Signorini, o seu pessoal, que estava no Catar, com seus familiares. E Vinicius Rodrigues, da CBF, que ficou conhecido mundialmente por jogar um gato no chão, durante coletiva de Vinicius Junior.
Os assessores antecipavam as possíveis perguntas e os avisavam sobre os jornalistas mais maldosos. Daí Tite, que tanto fazia questão de contextualizar, explicar em detalhes suas decisões, em 2018, se tornou um treinador autossuficiente, como se não tivesse de tornar claras as situações que o Brasil vivia.
A postura agradava aos jogadores, trazia um constrangimento. Não dos jornalistas, como era a intenção. Mas para o próprio treinador, que parecia um homem perdido, sem convicção do que fazia. Tudo ficava ainda pior quando ele apelava para seus auxiliares Cleber Xavier e o ex-jogador Cesar Sampaio para explicar o que não queria falar.
Tudo o que Tite conseguiu passar foi insegurança.
Os jogadores acompanham as coletivas e adoravam a superficialidade proposital, as frases ocas, sem sentido, que não eram por acaso. Tite comemorava perguntas ufanistas e até de representantes de torcidas da seleção que assumiam o microfone reservado aos jornalistas. E discursava, cheio de rancor. Sentimento precoce. Porque ele é usado por quem conquista e não por quem ainda está no meio de uma disputa.
Tite também não confiava na alta cúpula da CBF. Ele sabe que foi mantido no cargo, depois de perder a Copa de 2018, porque não havia um treinador se destacando no cenário nacional. O ex-presidente Rogério Caboclo, depois afastado por assédio sexual, não queria contratar um estrangeiro. E, só por falta de opções, Tite seguiu.
Mas Caboclo percebeu a falta de critério, a dependência de Neymar, a mesmice tática do treinador, a influência de Daniel Alves e Thiago Silva nos grupos. E tratou de convidar Xavi para ser auxiliar de Tite. A promessa era que, depois da Copa de 2022, quando ele já fosse uma presença constante na seleção, o espanhol assumiria a equipe.
Tite não sabia e considerou uma profunda traição o convite confirmado por Xavi. Desde então a relação não foi a mesma com dirigentes da CBF. Tanto que, antes de perder sua segunda Copa, ele não havia comunicado o que cansou de repetir aos jornalistas, que iria embora depois deste Mundial do Catar.
Tite é professor formado, homem culto, de leituras. Mas se perdeu completamente, emocionalmente nas vitórias, nas dificuldades e na derrota. No dia a dia.
Nenhuma decisão importante tática, recuperação ou não de um jogador ficou secreta neste Mundial. Vazada pelo mesmo órgão de imprensa. Todos os dias virou a mesma coisa. Esse órgão chegou a anunciar o corte de Gabriel Jesus e de Alex Telles antes da assessoria de futebol da CBF. Situação que Tite não enxergava que sabotava o próprio trabalho. Era ótimo para seleções rivais. A preparação é uma quando seu time vai enfrentar Neymar. E outra quando não.
Ou quando terá laterais improvisados pela frente, como teve a Croácia, facilitando a definição de seu plano tático.
Se fez a dança do pombo quando ganhou dos fracos sul-coreanos, não teve o controle do próprio time quando o Brasil vencia a Croácia, por 1 a 0, no segundo tempo da prorrogação.
Não teve voz de comando para exigir que Casemiro e Fred ficassem marcando na intermediária. Travassem o jogo. Que a seleção preservasse o fundamental resultado. No fim, empate e derrota nos pênaltis.
Na penalidade, aceitou Rodrygo, o caçula da seleção, começar batendo.. O menino de 21 anos sentiu a pressão e bateu mal demais, facilitando a defesa do goleiro Likakovic. Assim como o atacante do Real, Neymar não queria bater outro pênalti que não fosse o quinto. Tite deveria mandar que ele fosse para a cobrança. Não mandou. Marquinhos chutou na trave. Alisson não pegou nenhuma. 4 a 2 para a Croácia, adeus Copa.
E, lá no gramado do estádio da Cidade Estudantil, os mesmos jogadores que acreditavam na conquista da Copa, que fizeram Tite dançar, ficaram chorando, desesperados, sem seu comandante.
Tite estava longe, já tinha ido para os vestiários se acalmar, pensar nas explicações que daria pelo segundo fracasso seguido, em seis anos de trabalho.
Decidiu por uma postura impassível, fria, tentando mostrar que nada de anormal havia acontecido. O Brasil jogou melhor mas estava fora por causa "do futebol". Dos "pênaltis".
Tite controlava cada palavra. Havia treinado com seus assessores até para a derrota. Porque ele queria trabalhar em um gigante europeu depois da Copa. Seu sonho era Itália ou Espanha. E não desejava passar a imagem de um descontrolado.
A sua última entrevista como treinador da seleção foi superficial, vazia, fria. Não refletiu o sofrimento dos brasileiros, dos seus jogadores, nem o seu mesmo. Foi uma peça de teatro, ruim, muito ruim. E que mostrou sua artificialidade quando encontrou a esposa e filha, aí foi verdadeiro e chorou.
Tite teve o que nenhum profissional do futebol deste país jamais sonhou. A possiibilidade de comandar a seleção dos melhores jogadores atuando com as cores da bandeira em duas Copas do Mundo seguidas. Sem deixar o cargo, mesmo derrotado na primeira. Seis anos de trabalho que não deixaram frutos.
Quem assumir em janeiro terá de reconstruir a maneira de o Brasil jogar.
Com futebol amarrado a um só jogador, Neymar, como aconteceu na Rússia, foi péssimo.
Sem estrutura defensiva no meio-campo, privilegiando os atacantes "para respeitar o DNA" nacional, acabou com nova desilusão.
Nas duas Copas, Tite se perdeu emocionalmente. Mal assessorado. Desconfiado. E "fechado" com os jogadores, de maneira amadora.
A CBF percebeu vários desses erros.
E vai investir em um treinador com vivência internacional.
Acostumado a viver a pressão de grandes competições.
E não há ninguém assim no cenário nacional.
Por isso a busca por um estrangeiro.
Como a Champions League, fale ao menos uma língua latina.
Português, no mínimo espanhol.
Tite queria que seu sucessor fosse brasileiro.
Conseguiu exatamente o contrário.
Seus erros mostraram que a seleção precisa de um estrangeiro.
Seis anos de equívocos foram mais que suficientes.
Nomes cogitados e que serão discutidos pelo presidente Ednaldo Rodrigues.
Jorge Jesus, Abel Ferreira (com muitas restrições pelo "futebol defensivo"), Luis Castro. Esses portugueses são "fáceis". Há os sonhos como José Mourinho (mais defensivo que Abel Ferreira), Guardiola.
E ainda quem outros presidentes de Federações importantes, como a Paulista e a Carioca, sugerirem a Ednaldo.
Mas a escolha, ele avisa, sera toda 'dele'.
"Em janeiro eu defino o nome. Quero alguém para ficar até 2026."
Ou seja, com o ciclo que Tite tanto queria e desperdiçou...
Aberta a temporada de especulação sobre o nome do substituto de Tite na seleção brasileira
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