Após nocaute fulminante contra Lewis, a certeza. Cigano renasceu
Júnior lutou com seriedade. Com diretos violentíssimos, mas se protegendo, com responsabilidade. Arrasou o número três dos pesados do UFC
Cosme Rímoli|Do R7 e Cosme Rímoli
São Paulo, Brasil
Junior Cigano é um dos lutadores mais transparentes do UFC.
Se está bem fisicamente, sem problemas na American Top Team, bem treinado, tranquilo emocionalmente, focado, se torna um dos grandes pesos pesados do mundo.
Confiante, mas não a ponto de se tornar alvo fixo na grade, tendo a humildade de dar passos atrás, fugir, se proteger dos diretos do rival para poder soltar seus diretos, cruzados e jabs violentíssimos, o catarinense merece estar entre os três melhores pesos pesados do MMA atual.
Mas quando tem qualquer problema sério, Cigano carrega a dificuldade para o octógono.
E por isso viveu como uma montanha russa suas decisões de cinturões. Ganhou a primeira, contra Cain Velasquez. Fez uma ótima defesa de título contra Frank Mir. Mas afundou em duas derrotas absurdas, diante do mexicano Velasquez, quando aceitou ser socado como um saco de areia, utilizado nos treinamentos.
Stipe Miočić fez o que quis com ele, o nocauteando no primeiro round, em 2017. Cigano estava irreconhecível. A decepção foi tamanha que o UFC passou a tratá-lo como lutador intermediário, não como ex-campeão.
A sua instabilidade emocional o havia vencido.
Mas vieram as lutas contra o búlgaro Blagoy Ivanov e o australiano Tai Tuivasa.
Duas vitórias convincentes, principalmente a diante de Tuivasa, que entrou como favorito. Estava invicto, com nove vitórias seguidas. Acabou nocauteado no segundo round.
Mas viria o teste final, na noite deste sábado, contra o norte-americano Derrick Lewis.
Lewis é um lutador devastador.
Tirou Francis Ngannou e Alexander Volkov da decisão do cinturão.
Mas não conseguiu se desvenciliar de Daniel Cormier, foi finalizado.
E Cigano foi escalado pelo UFC para uma luta de recuperação.
Só que o brasileiro decidiu fugir do roteiro.
Quem acompanha sua carreira de perto sabia.
Assim que pisou no octógono em Wichita, no Kansas, a vida de Derrick Lewis não seria fácil.
O olhar espalhava confiança.
Magro, em plena forma, experiente, e até que enfim, completamente obediente ao seu treinador de boxe Luiz Dórea, estava pronto para demolir o norte-americano.
A principal armadilha que implodiu a carreira vitoriosa e lhe custou o cinturão dos pesados foi a sua postura. Querendo mostrar que era resistente à pancadas, decidiu mostrar que poderia resistir aos diretos de Cain Velasquez.
Cansaria o norte-americano de ascêndencia mexicana, como Muhammad Ali fez contra Joe Frazier, na histórica luta de 1971.
Cigano acabou massacrado.
Duas vezes foi alvo fácil para Velasquez.
Neste sábado, com movimentação constante, guarda levantada e, até não tendo vergonha de correr, para escapar dos golpes de Lewis, ele pôde estar inteiro, com toda a potência para espancar o adversário.
A estratégia do brasileiro foi perfeita.
Com nove quilos a mais que Cigano, Derrek queria o confronto aberto. Não só para deixar o catarinense à distância dos seus diretos e cruzados. Mas também perto dos chutes altos muito bem treinados. Não carrega o apelido de "The Black Beast" à toa.
Só que Júnior batia e saía do alcance do rival. Para o seu bem, acabara a tola estratégia usada contra Cain.
Mesmo assim, quando acertou dois chutes baixos, tomou dois diretos que quase comprometeram a luta.
Estático, Lewis esperava a aproximação do brasileiro. Mas foi surpreendido por um golpe rodado, que o acertou na costela. Foi quando o americano mostrou sua malícia. Dobrou o corpo como se estivesse vencido. Quando Junior acreditou que o finalizaria, Derreck quase o acertou com um potente uppercut. Ou seja, era uma bela armadilha.
Tudo isso aconteceu no primeiro round.
No segundo, Cigano estava ainda mais objetivo e se aproveitou da empolgação de Derreck, que lutava com a torcida a seu favor. E já de um certo cansaço do americano. O brasileiro estava mais preciso nos golpes e mais veloz.
Até que mediu a distância com o braço esquerdo e soltou o seu famoso direto.
O soco demoliu o norte-americano, que dobrou as pernas.
Desta vez não era nenhum truque.
E Júnior socou até que Herb Dean decretou o nocaute.
A luta acabou com um minuto e 58 segundos do segundo round.
"Obrigado, Wichita! Eu passei por ótimos momentos aqui! Estou me sentindo muito bem. Eu tinha combinações, trabalhei em cima disso, sabíamos que ia pegar alguma hora.
Hoje é aniversário do meu filho Bento e queria que todo mundo cantasse comigo 'Parabéns para você"', pediu em inglês para a surpresa platéia.
Depois de celebrar, veio o justo pedido.
"Como esse caras podem estar na minha frente (no ranking)? Eu quero minha chance pelo cinturão", disse sério.
Com Daniel Cormier avisando que quer se aposentar, muito provavelmente depois de um terceiro combate com Jon Jones, a categoria dos pesados ficará aberta.
E Cigano poderá ter o direito de lutar pelo título.
Esta noite, despachou sem dó ou dificuldade, o número três do ranking.
A situação é simples.
Se Cigano estiver confiante e obedecer Luís Dórea poderá reconquistar o cinturão que já foi seu.
E foi perdido de maneira de maneira tola.
Quando descobriu que é um ótimo lutador de MMA.
Mas está longe de ser a reencarnação de Muhammad Ali...
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