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Testemunha do terror em Munique 1972 diz: 'O esporte vence tudo'

Brasileiro Alberto Murray Neto acompanhou negociações de seu avô, Sylvio de Magalhães Padilha, depois de israelenses ficarem nas mãos de terroristas

Olimpíadas|Eugenio Goussinsky, do R7

Jogos Olímpicos de 1972 ficaram marcados pelo terror, mas prosseguiram
Jogos Olímpicos de 1972 ficaram marcados pelo terror, mas prosseguiram

Ainda menino, o paulista Alberto Murray Neto, 53 anos, presenciou o momento mais dramático da história da Olimpíada. Aos seis anos, ele estava em Munique, em 1972, levado pelo avô dele, Sylvio de Magalhães Padilha, então presidente do COB (Comitê Olímpico Brasileiro) e membro do comitê executivo do COI (Comitê Olímpico Internacional).

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Pelos corredores do hotel, acompanhou de perto a movimentação dos dirigentes, a tensão, a angústia e as negociações com os terroristas que, no dia 5 de setembro, invadiram a Vila Olímpica e fizeram de reféns atletas isralenses. Enquanto as negociações não avançavam, seu avô, Magalhães Padilha, e os outros membros do comitê se ofereceram como reféns em lugar dos israelenses.

"Lembro das duas situações: todo o comitê executivo, formado por cinco dirigentes, concordou, por unanimidade, em se oferecer como refém. E de que, àquela altura, todos comentavam que o avião não ia levantar voo, já que nenhum país se prontificou a receber os terroristas. Já se sabia, no íntimo, que o desfecho iria ser trágico."


Murray Neto, hoje advogado, se tornou competidor de atletismo na juventude, em função do estímulo dado por seu avô, uma referência em sua vida. Seu avô, Sylvio, mesmo sendo militar, fez dura oposição ao golpe de 1964.

Naquele momento em 1972, mesmo ainda criança, ele observava com admiração a movimentação do avô. Foram horas de trabalho incessante, segundo conta.


"Acompanhamos pela TV tudo o que estava ocorrendo tão perto de nós. Meu avô passou o dia inteiro em reuniões intermináveis e tensas. Foi um momento de muita angústia. Quando eles se ofereceram como reféns, senti orgulho. Depois, esse orgulho se misturou à consciência de que os dirigentes estavam cumprindo um procedimento diplomático. Os sequestradores não iriam aceitar a troca, o alvo deles era Israel e os reféns judeus."

O governo alemão, então comandado pelo primeiro-ministro Willy Brandt, social-democrata, autorizou a realização de emboscada contra os terroristas, já na Base Aérea de Fürstenfeldbrück, próxima a Munique, para onde os reféns foram transferidos de helicóptero. Houve tiroteio, os terroristas mataram 11 reféns e, entre os criminosos, somente três se salvaram. Um policial alemão também foi morto.


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Murray Neto conta que o clima na Vila Olímpica era de consternação. O episódio se iniciou na madrugada seguinte à última conquista do nadador Mark Spitz, que, no dia 4, ganhara seu sétimo ouro naqueles Jogos. Spitz, que é judeu, foi retirado às pressas da Vila pela segurança, assim que a notícia da invasão se espalhou.

"Lembro-me de ter visto a Vila Olímpica antes e depois do acontecimento. O clima era totalmente diferente. Antes, era festivo. Depois, ficou totalmente sombrio."

Esporte acima de tudo

Murray Neto esteve presente no ato ecumênico realizado no estádio Olímpico, no dia 6, em memória das vítimas. E diz que o COI acertou em dar continuidade aos Jogos, que ficaram paralisados por um dia.

"Tenho guardado este culto ecumênico, me lembro do estádio lotado, das homenagens às vítimas. Houve na época uma discussão no COI, para definir se as competições iriam ter continuidade. No fim tiveram. O COI acertou, os Jogos e o esporte não podem se curvar aos terroristas, têm que mostrar que são mais fortes do que essas ideias perversas."

Murray Neto, além de atleta, passou a atuar no esporte. Hoje ele é diretor do Conselho de Ética do COB. Tendo ido a todas as Olimpíadas desde então, considera que aquela foi um marco.

"Quem viu a Olimpíada até 1972, viu. A partir daquela os Jogos viraram outra coisa. A segurança passou a ser prioridade. Até então, era possível até se pular os muros da Vila. Os terroristas fizeram isso. Havia uma espécie de zona mista em que os torcedores e fãs tinham contato com os atletas. Depois, o esquema de segurança passou a ser diferente. Lembro-me do meu avô, nos Jogos seguintes, em 1976, como membro do COI, abismado com a segurança. Falava 'Nunca vi algo igual'. E olha que, se comparado a hoje, o esquema era básico."

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Tempos depois, a política ainda tentou interferir nos Jogos. Os americanos boicotaram a Olimpíada de Moscou, em 1980. E na seguinte, em 1984, foi a vez dos soviéticos boicotarem. Tais tentativas de se sobrepor politicamente por meio do esporte foram infrutíferas, conforme diz Murray Neto. 

"Aquele acontecimento em Munique, em vez de me afastar, me aproximou mais do esporte. Sou um apaixonado pelo esporte. Aquilo me fez entender que realmente o esporte é a única instância capaz de unificar povos. Naquela Vila, e em outras, atletas israelenses, árabes e de todos os povos se uniram. E assim é em competições, prevalece este espírito de integração. No fim das contas, o esporte venceu todas os confrontos políticos na história."

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