Empreendedorismo no montanhismo: A história de sucesso de um casal de Minas Gerais
Empreendedorismo é, em termos gerais, a disposição ou capacidade de idealizar, coordenar e realizar projetos, serviços, negócios. Possuir espírito empreendedor
Blog de Escalada|Do R7
Empreendedorismo é, em termos gerais, a disposição ou capacidade de idealizar, coordenar e realizar projetos, serviços, negócios. Possuir espírito empreendedor é uma das qualidades fundamentais para sobressair nos dias atuais. No montanhismo, uma área que muitos desejam empreender para “viver disso”, mas que na prática existem poucos casos de sucesso made in brazil. O motivo desta desproporção entre vontade e realidade tem uma explicação: ser empreendedor é ter a ousadia de colocar suas ideias em práticas.
Com tantas boas ideias sobre a exploração do mercado de montanhismo, por que há tão poucos casos de sucesso nacionais no empreendedorismo? A pessoa nasce empreendedora ou se torna ao longo da vida com muita determinação, prática e estudo? As respostas a estas duas perguntas já produziram muitos artigos na área de economia. Porém, em um único aspecto, muitos concordam. Um dos caminhos para aprender a ser empreendedor é analisar casos de sucesso e extrair tudo de positivo que eles têm para oferecer.
Foto: Felipe Guimarães
Este é o caso de Felipe Guimarães e Thaiana Ferreira, os proprietários do Hostel Picus, um empreendimento voltado quase que exclusivamente a montanhistas na região do Parque Nacional do Itatiaia, mais precisamente na cidade mineira de Itamonte. Os dois conseguiram iniciar praticamente do nada, para atualmente possuir um estabelecimento que é referência no Brasil de boa administração, bom serviço ao cliente e hospitalidade.
O Hostel Picus, é um excelente exemplo para quem sonha em abrir uma pousada ou um “refúgio de montanha” (termo comum no montanhismo brasileiro para designar albergues e pensões voltado a montanhistas). O sonho de abrir uma pousada, seja na montanha ou na praia, faz parte da cultura nacional, especialmente da classe média brasileira. O desejo de viver em um lugar tranquilo, preferencialmente paradisíaco, é recorrente em conversas entre amigos.
O início
A ideia de possuir um hostel já era antiga de Felipe Guimarães. Desde que começou a namorar Thaiana Ferreira, passava horas falando deste desejo e de como seriam seus planos de fazê-lo tornar realidade. Porém Guimarães tinha um problema que todos possuem: A falta de recursos. Por não ser de uma família rica, também buscavam alternativas possíveis de realizar o sonho.
Inicialmente ambos pensaram em estabelecer um ginásio de escalada na cidade de Itamonte-MG, o qual ofereceria também pernoites para escaladores que visitassem a região. Após algumas procuras, esbarraram na primeira grande dificuldade de qualquer negócio: o aluguel do espaço físico. Segundo os proprietários, o valor era “muito caro”, e o plano de estabelecer uma escola de escalada e hostel teve de ser adiada.
Após algum tempo, o proprietário de um local que era uma oficina desativada de caminhoneiros fez uma oferta interessante aos dois. Felipe e Thaiana poderiam ficar no lugar, como caseiros, para não deixar o local abandonado. Sendo caseiros, os dois não necessitariam pagar aluguel e poderiam administrar o local, pagando as contas de luz, água e IPTU. Além disso o proprietário permitiu que o local fosse usado como hospedagem.
Esta foi a porta de entrada para que a dupla começasse a colocar em prática o desejo de ter um hostel com a tenacidade e disciplina para trabalhar no próprio negócio. Na época o casal possuía também um sócio, que ajudou a investir na primeira infraestrutura básica, que eram os beliches e as roupas de cama. A contribuição de Guimarães e Ferreira era com o trabalho de limpar todo o estabelecimento e realizar a devida manutenção.
No início a lotação total do Hostel era de 12 pessoas (quando lotava). O espaço inicial era uma cozinha, banheiro e o quarto coletivo. De acordo com o casal, este início não havia lucro, mas o dinheiro arrecadado era suficiente para pagar a gasolina para buscar os clientes, a comida de ambos e a ração do cachorro.
A ampliação
Com o tempo, por causa do baixo fluxo de dinheiro oriundo do lucro, o sócio inicial saiu do empreendimento. Na época o espaço disponível já estava ficando pequeno, pois o fluxo de hóspedes era de aproximadamente 20 pessoas e o estabelecimento necessitava de um investimento para ampliação. Ambos começaram a trabalhar nesta ampliação, com o pouco dinheiro que tinham guardado e com algumas operações bancárias possíveis. Thaiana diz que “na época a gente colocou muito dinheiro e ficou com medo”.
Porém uma ideia surgiu, que era ampliar o lugar em um espaço que já existia. Para esta ampliação seria necessário reformar um espaço já existente do lugar. Após uma negociação com o proprietário, fizeram uma proposta ousada, mas que foi fundamental para a existência do estabelecimento: reformar o lugar para a ampliação e, após um tempo, adquirir o local do proprietário. Após alguma negociação de prazos e preços com o proprietário, a proposta foi aceita.
Ambos fizeram a seguinte conta: se em um ano começaram atendendo de 3 a 4 pessoas, passando a atender 20 pouco tempo depois, a ampliação sustentaria a possibilidade de negócio. Porém ambos acreditavam que em 5 ou 6 anos este número iria dobrar. Mas após quase dois anos da ampliação, o Hostel Picus já estava atendendo aproximadamente 70 pessoas, por final de semana.
De acordo com as informações disponibilizada Felipe e Thaiana, o estabelecimento hoje possui capacidade para 75 pessoas hospedadas em camas. Há ainda a possibilidade de camping, em um espaço reservado do estabelecimento, que pode amentar consideravelmente o fluxo de pessoas. Felipe afirma que “nosso recorde já foi atender 102 pessoas”.
Thaiana, entretanto, não esconde que administrar um hostel não é fácil. “A gente trabalhou todo este tempo com reforma, coisas estragando, bagunça, pessoas reclamando e correndo sempre para arrumar” afirma Thaiana.
“O espaço já está muito grande, mas há muita despesa, investimentos e funções a desempenhar ” completa. Felipe afirma categoricamente que “quem faz tudo, todas as atividades, sou eu e a Thaiana”. Recentemente o estabelecimento possui uma pessoa encarregada da faxina, que, segundo afirma o casal, quem realizava esta tarefa eram um dos dois.
Empreendedorismo
Atualmente o café da manhã, um serviço que inicialmente o hostel não realizava, já é oferecido aos hóspedes, fazendo parte do pacote de hospedagem. O jantar também é oferecido, mas é oferecido à parte da hospedagem. Felipe, bastante emotivo, afirma que “se alguém já ficou aqui algum dia, contribuiu para a reforma do Hostel e o seu crescimento”. “A gente faz tudo de coração, para ter um lugar que todos possam ficar e ficamos felizes de ter uma estrutura melhor” completa Guimarães. Thaiana não se ilude com o sucesso que o hostel picus possui no momento, dizendo que o estabelecimento é “uma obra para a vida inteira, pois tem muita coisa para arrumar e muita coisa por fazer ainda”.
Mas por que um hostel pode ser considerado empreendedorismo no montanhismo. Porque o público do estabelecimento é quase que prioritariamente de montanhistas. Segundo Thaiana, “a maioria das pessoas que recebemos, algo como 98%, são visitantes do Parque Nacional do Itatiaia, principalmente a parte alta”. O casal afirma que nem todos são montanhistas, mas completam dizendo que deste público é de toda a faixa etária, não tendo um perfil estabelecido.
Para diversificar o público, além de divulgar o espaço, o casal cede o lugar para a realização de eventos. Workshops de fotografia, campeonatos de escalada e curso de primeiros socorros em áreas remotas são os eventos organizados no local. De acordo com o casal, já houve até mesmo comemoração de carnaval (data que é na baixa temporada) e um casamento. Cada um destes eventos ajuda a lotar o hostel, além de fazer com que os visitantes retornem e tragam mais pessoas.
A fama de estabelecimento bem organizado e voltado ao montanhista do Hostel Picus não fica restrito ao público nacional, Felipe e Thaiana afirmam que há um grupo de viajantes holandeses que pelo menos três vezes por ano visitam a região e fazem questão de se hospedarem lá. “Mas também há de outros países, mas são pessoas aleatórias, mas não grupos organizados”, complementa Thaiana.
Um outro aspecto estratégico do estabelecimento, é a proximidade com o ponto final do trekking da serra fina. Muitos clientes optam por deixar o carro no Hostel Picus, para quando chegarem já estarem com o automóvel lá. A estes clientes, Felipe e Thaiana disponibilizam um almoço e opção de banho quente.