Corinthians, São Paulo e Santos: descontrole financeiro pode comprometer futuro do trio
Clubes precisam de restruturação operacional e de gestão segundo especialistas
Lance|Do R7

Corinthians, São Paulo e Santos, cada um à sua maneira, inflou seus gastos financeiros nos últimos meses. Sem controle financeiro, os três times podem ter o futuro comprometido, com restrições orçamentárias que os deixem ainda menos competitivos perante aos rivais brasileiros.
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No ano passado, ameaçado pela chance de ser rebaixado, o Corinthians foi ao mercado e contratou Memphis Depay, André Carrillo, José Martínez, Hugo Souza e outros, aumentando consideravelmente seus gastos com a compra de direitos econômicos e salários. O Tricolor, preocupado com a distância para Palmeiras, Flamengo, Botafogo, aliviou sua folha salarial para poder repatriar Oscar. De volta da Série B, o Santos entendeu que precisava ter um time competitivo. O retorno de Neymar, que estava previsto para a metade do ano, foi antecipado. Assim, o Peixe se viu obrigado a reforçar o elenco.
— São Paulo, Corinthians e Santos estão num processo de estrangulamento. Em breve, eles podem ter problemas, porque o número de dívidas é muito grande. No caso de São Paulo e Corinthians, o comprometimento das receitas com essas dívidas é elevado. E eles continuam gastando. O Santos tem receitas muito estáveis, baixas, para o volume de investimento que está sendo feito. Isso também chama a atenção — pontua o economista César Grafietti, sócio da consultoria Convocados, especialista na análise financeira dos clubes brasileiros.
O Corinthians tem uma dívida que ultrapassa os R$ 2 bilhões, incluindo a Neo Química Arena. Embora esteja contando com a ajuda da torcida, que tem contribuído fielmente com o clube através da vaquinha para a quitação do estádio alvinegro, o Corinthians projeta gastar este ano aproximadamente R$ 400 milhões em juros decorrentes das dívidas contraídas pela agremiação.
— O Corinthians é uma bomba relógio. Então, ela vai explorar. Faz um RCE (Regime Centralizado de Execuções) aqui, faz outra operação ali, consegue um acordo. Para quem faz um R$ 1 bilhão de receita, sobrou só R$ 600 milhões. E aí você não paga dívida. Precisa parar tudo e repensar completamente a estrutura. Não dá para ter um jogador de R$ 3 milhões. Tem que ter uma reestruturação financeira e operacional — pontuou Grafietti.
O Corinthians optou pelo RCE, cujo objetivo principal é impedir bloqueios das contas do clube, que impactam a operação da gestão no curto prazo, forçando a diretoria a ter que “apagar incêndios” constantemente.
— Ao renegociar a dívida sob um regime centralizado, os credores não podem bloquear os recebíveis do clube. O Corinthians tem um passivo elevado, mas também gera um grande volume de caixa. O desafio é tornar a operação sustentável, ou seja, fazer com que a receita supere a despesa, algo que não vinha acontecendo. Se isso não for corrigido, o RCE apenas adia o problema — Pedro Daniel, diretor executivo de esporte e entretenimento da EY.
Esportivamente, os três tradicionais clubes paulistas já foram deixados para trás. O último título do Corinthians foi o Paulista de 2019. O São Paulo ganhou a Copa do Brasil, em 2013, e o Santos foi campeão da Série B no ano passado.
De 2019 para cá, Palmeiras e Flamengo ganharam dois Brasileiros e duas Libertadores cada, além de Copa do Brasil, Supercopa e Estaduais.
— O São Paulo precisa oxigenar as ideias. Atrasou demais. O clube parece parado no tempo. E a área de marketing até melhorou. Tem o MorumBis, tem o contrato com a Live Nation para os shows, melhorou ali o relacionamento e as receitas com a publicidade, com o patrocínio. Mas a gestão operacional, que é o futebol, continua muito ruim. E olha que o torcedor de São Paulo voltou ao estádio, então tem gerado boas receitas de bilheteria e tudo mais. Mas, ainda assim, o nível de gastos está muito além do que deveria. São muitos gastos, mas os gastos não conseguem ter melhores resultados e as entradas que eram mais comuns do clube acabam não acontecendo mais. No caso do São Paulo, é realmente uma formação errada do elenco, caro e pouco produtivo — analisou César Grafietti.
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O Tricolor aprovou a criação de um fundo de investimento em direitos creditórios (FIDC) para levantar R$ 240 milhões, visando reestruturar suas dívidas com instituições financeiras. O clube firmou parceria com as gestoras Galapagos e Outfield para conduzir a operação, cuja meta é reduzir o custo financeiro e estender os prazos de pagamento.
— O São Paulo centralizou sua dívida em um único credor, que impôs algumas contrapartidas, como a redução dos custos do futebol. O objetivo é que o clube consiga honrar os compromissos e pagar sua dívida, que foi alongada nesse processo. No curto prazo, isso gerou dificuldades de pagamento, incluindo atrasos em salários e direitos de imagem. O clube tem um caminho a seguir, mas precisa manter o controle financeiro para cumprir com esse novo credor — avalia Pedro Daniel.
O “Efeito Neymar” causou uma revolução no Santos. Contratos de patrocínio aumentaram 400% de valor, o clube passou a ser procurado por muitas empresas interessadas em firmar parceria com o Peixe. Mas segundo especialistas, o cenário ainda inspira cuidados.
— O Santos, há três meses, vivia uma situação muito complicada. Hoje, conta com um fator decisivo, que é a chegada de Neymar, impactando positivamente diversos aspectos do clube. Essa mudança pode ser a grande chance de reestruturação financeira, desde que bem aproveitada. Se o Santos conseguir renovar com Neymar e construir um projeto sustentável no médio prazo, poderá mudar de patamar em termos de receita, o que facilita o ajuste financeiro. Sem esse fator, a situação do clube seria muito mais difícil — explica Pedro Daniel.
Para dar um time competitivo a Neymar, o Santos foi ao mercado e comprou o atacante Rollheiser, o volante Zé Rafael, além de trazer jogadores como Deivid Washington, Gabriel Verón e outros jogadores, inflacionando sua folha salarial.
— O Neymar, para mim, é o menor problema. Você tem que dar alguma base para o Neymar poder jogar. E aí é que entra o problema. O clube não tem essa receita toda para garantir, seja os pagamentos das suas contratações, seja a quantidade de salários e tudo mais. Então, a minha sensação é que o clube está dando um all-in, mas um all-in pensando em virar uma SAF mais pra frente. Essa é a minha leitura. Vai tentar usar o Neymar do lado do clube positivo, em campo e com imagem, para tentar mostrar que é um clube sustentável e aí atrair algum investidor. Então, se isso não acontecer, o clube vai ter sérias dificuldades no final do ano. Tenho certeza disso — projetou o economista César Grafietti.