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BRASILEIRO 2022

Para Juan Figer, jogador brasileiro deixou de ser o melhor negócio

Maior patrão do mundo da bola vê graves problemas de organização do futebol no país

Futebol|Eugenio Goussinsky, do R7

Figer garante que não é dono de nenhum clube de futebol
Figer garante que não é dono de nenhum clube de futebol

O megaempresário de futebol, o uruguaio Juan Figer, completou 80 anos no último dia 4 e continua ganhando dinheiro no futebol. Mas não tanto no futebol brasileiro, justamente onde ele iniciou sua trajetória de agente, em 1970. Nesta época ele trouxe vários craques do Penãrol para o Brasil, como Héctor Silva, Pedro Rocha e Figueroa.

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Com o tempo, o polêmico e influente empresário se tornou uma eminência da bola, com trânsito entre jogadores, técnicos, dirigentes e políticos, em várias partes do mundo. No momento, ele diz que sua maior fonte de renda vem do futebol europeu.

Em entrevista exclusiva ao R7, Figer dá uma receita para os dirigentes no Brasil, que, para ele, não se organizam como deveriam para trazer verbas e, desta maneira, podem levar o futebol brasileiro para o buraco. 


R7 – Atualmente existem muitos agentes no mercado, numa situação bem diferente do momento em que o sr. iniciou, em 1970. O sr. considera isso benéfico para o futebol?

Juan Figer – Sem dúvida que sim. Não tenho problema com nenhum deles. Os novos agentes colaboram para dar um suporte aos jogadores. Praticamente todos os jogadores têm agentes hoje em dia, algo que antigamente não acontecia. Isto facilita porque o agente tem mais senso profissional e dá mais condições para que o futebol se desenvolva como um todo.


R7 –A nova legislação da Fifa, proibindo a participação de terceiros na aquisição de direitos federativos dos jogadores trará alguma mudança para o sr. ?

Figer – Para mim não muda absolutamente nada. Quando comecei a trabalhar neste ramo em 1970 eu já vislumbrava quais deveriam ser minhas atribuições e minha forma de atuação. Eu nunca adquiri nenhum direito econômico ou financeiro de jogador de futebol. Sempre foram os clubes que fizeram isto em minhas negociações.


R7 – Esta questão aliás já foi motivo de várias acusações contra o sr., como na CPI da Nike, em 2001, e, recentemente, em relação à transação de Hulk para a Europa. Foram utilizados clubes do Uruguai, como Central Espanhol e Rentistas, para comprarem parte dos direitos do jogador e depois revendê-los. O sr. é proprietário ou tem alguma participação nestes clubes?

Figer – Não sou proprietário de nenhum clube nem tenho participação econômica ou financeira ou de qualquer natureza em nenhuma agremiação. Quando eu comecei a atuar no futebol, não inventei nada. Copiei o que estava estabelecido pela Federação Italiana de Futebol, que não só autoriza, como é estabelecida pela Liga Italiana a co-propriedade de jogadores. Já me preocupava em ver como era o futebol em geral, não só na América do Sul, onde se iniciaram os meus negócios. 

R7 – Como o sr. vê a globalização do futebol hoje?

Figer – Sempre existiu a globalização. Hoje está maior porque há uma tecnologia em comunicação bem mais evoluída.

R7 – Esta nova legislação não vai prejudicar os clubes que não tinham recursos para contratar jogadores?

Figer - Vai beneficiar. Esta nova legislação vai fazer os clubes se organizarem melhor. Em lugar de jogar o estatuto no lixo, vão ter de ler, pois até hoje não estão bem informados do que pode e do que não pode. Será sempre permitido que dois clubes contratem um jogador em co-propriedade. Ele pode jogar em um ou em outro. Agora, um jogador não pode atuar por uma empresa, fundo ou banco. É uma co-propriedade que não tem sentido. Isso é especulação e é contra este tipo de vínculo que a nova legislação atua.

R7 – Qual a sua opinião sobre a Lei Pelé, que muitos consideram ter favorecido a atuação dos empresários?

Figer – A Lei Pelé, na verdade é a cópia da Lei Bosman, instaurada na Europa. Também foi uma continuação da Lei Zico. Não é algo adequado para estar direcionado ao futebol brasileiro. É uma mistura completa, uma salada. Pega disposições de determinados países e cada país tem seus próprios problemas de organização. Não se pode comparar o futebol no Brasil, com 200 milhões de habitantes com o uruguaio ou de algum país europeu. Aqui é um continente dividido em 27 estados que não têm poder de resolução.

R7 – Como o sr. vê a organização do futebol brasileiro?

Figer – Há um conflito de interesses. A CBF programa mais jogos do que deveria porque as federações estaduais necessitam de atividade. Politicamente é impossível não ter estaduais porque o colégio eleitoral da CBF é composto por 20 clubes e 27 federações. Entendo que da maneira que está atualmente prejudica todos os clubes, porque há aqueles que só participam dos estaduais e ficam o resto do ano parado. Jogam só quatro meses. Como ele vão planejar e contratar jogadores por um ano? Há diversos problemas graves no futebol brasileiro que deveriam ser solucionados com um calendário mais equilibrado. Sou a favor da unificação com o calendário europeu.

R7 - E o Bom Senso FC?

Figer - É uma necessidade a criação do Bom Senso FC. Trata-se de um sindicato que funciona. Como o Brasil é um país de dimensões continentais, com muitos estados, o Bom Senso centraliza as reivindicações dos jogadores brasileiros. 

R7 - Como o sr. viu a negociação de Neymar com o Barcelona. O Santos reclama de ter sido passado para trás pelo pai do jogador.

Figer - Não tive participação na negociação. Posso dizer o que sei através das versões que me contaram. O pai do jogador me contou a sua versão. Ouvi também outras partes, tenho contato com dirigentes dos dois clubes. Não vejo que houve fralta de ética de algum dos lados. O Santos negociou o jogador. Se negociou bem ou não é uma pergunta a ser feita. Por que o Barcelona pagou antes por um jogador que ia ter depois? Teve motivos. Logicamente porque outros queriam contratá-lo.

R7 - Mas isso levou à renúncia do presidente do Barcelona...

Figer -  O Sandro Rosell não renunciou por causa desta questão do Neymar. Outras circunstâncias internas do clube o fizeram tomar esta atitude. 

R7 - Várias são as denúncias de corrupção no futebol, como a de compra de votos para a Copa do Mundo de 2022 ser realizada no Catar. Ingleses também reclamam que foram preteridos de sediar o Mundial de 2018. A corrupção no futebol é algo significativo ou apenas restrito a alguns casos?

Figer - Não sei se existe corrupção no futebol. Há uma disposição da Fifa para obter informações mais profundas sobre isso, tanto que contratou um notório investigador do FBI (Michael Garcia). Quando ele terminar seu trabalho, no fim de tudo poderemos saber o que aconteceu. Hoje só podemos afirmar que existem comentários.

R7 - Como o sr. vê o fato de Gilmar Rinaldi, que trabalhou muitos anos como empresário de jogadores, ter assumido a coordenação da seleção brasileira?

Figer - Gilmar é um conhecido meu de longa data. Foi jogador, dirigente do Flamengo, se transformou em agente e agora deixou de intermediar negociações. É possível ele realizar um bom trabalho, porque ele tem conhecimento de várias áreas. Não é um conflito de interesses, ele encarregou outras pessoas de continuarem a trabalhar com os jogadores. Alguns jogadores ele nos repassou (a empresa que Figer tem com seus filhos, Marcel, de 47 anos, e André, de 44 anos). Não são jogadores famosos nem de grandes clubes, são jovens.

R7 - Qual a sua relação com Joseph Blatter, Ricardo Teixeira e João Havelange?

Figer - Conheço bem Joseph Blatter, não posso dizer que tenho amizade. Amizade é um termo muito profundo. Tenho bom relacionamento com ele, a quem conheço desde os tempos em que era secretário-geral da Fifa. Ele conseguiu elevar a Fifa a um nível muito importante. Também conheci bem João Havelange, hoje não tenho contato. Mas ele fez um trabalho excelente. Com Ricardo Teixeira também perdi contato depois da renúncia. Mas, quando eu necessitava de um algum contrato de um jogador meu com a CBF eu falava com ele, ele era a pessoa mais indicada, como presidente.

R7 - O sr. trabalha com jogadores do Botafogo?

Figer - Não tenho jogadores no Botafogo. Mas quando acontece de jogadores com quem trabalho não receberem eu aconselho a não pedir rescisão em três meses (como permite a CLT), mas às vezes não podemos evitar. Quando há conflitos sempre todas as partes saem prejudicadas.

R7 - Como o sr. vê a crise financeira dos clubes no futebol brasileiro?

Figer - Muitos clubes não pagam em dia porque não são administrados da forma correta, mas de forma muito passional. Muitas vezes os dirigentes planejam entradas de dinheiro que não acontecem. Com isso há dificuldade de se conseguir patrocinador, dificuldade de trazer o público aos estádios, enfim, toda a organização está prejudicada.

R7 - Qual a dificuldade de clubes com grandes torcidas e exposição na mídia conseguirem mais verbas?

Figer - Existe muita pressa, imediatismo, falta de planejamento. Querem dinheiro para ontem e isso dificulta muito. Você acha que eu fico oito meses por ano na Europa assinando contratos todos os dias? Fico fazendo relacionamentos. Em geral, não é fácil fechar um contrato, às vezes demora até cinco anos para um negócio se acertar.

R7 - Pode-se dizer que o futebol brasileiro não tem gerado tanta rentabilidade para o sr., como em outros tempos?

Figer - Sim, não trabalho neste momento com tantos jogadores brasileiros como antes. O futebol vai mudando, hoje há um aspecto que está fazendo o futebol brasileiro sentir: a parte física ganhou mais importância. O estilo mudou e o mundo não contrata mais jogadores virtuosos mas sim os que tenham rendimento físico adequado e mentalidade de profissionalização total. Ganso é um talento, mas, da forma como atua, não se adaptaria ao futebol europeu. Digo europeu porque é lá que conta e não nos Emirados Árabes, Catar, Japão ou outro centro. Fora isso, não é o caso do Ganso, o jogador brasileiro, em geral, ainda precisa aprender a ser mais profissional. O futebol brasileiro hoje não é mais o melhor do mundo, mas é evidente que um dia poderá voltar a ser.

R7 - Há alguma maneira de compensar, de diversificar os negócios?

Figer - Meus negócios estão voltados somente ao futebol. Trabalho também com jogadores de outros países (Figer é um grande amigo do dirigente máximo do Atlético de Madrid, Miguel Angél Gil). Para manter a estrutura que mantenho tenho de investir. É caro mas tenho conseguido pagar as despesas. Em outros momentos agenciei um número maior brasileiros, mas não trabalho só no agenciamento. Trabalho também na intermediação. São atividades totalmente diferentes.

R7 - Qual o seu time de coração?

Figer - Penãrol e, claro, Uruguai, que voltou a figurar com força no cenário, não como antes, mas, por ser um país pequeno, vejo isso como um milagre. Desde criança sou sócio do Penãrol. Sempre tive ligação com o futebol, meu pai era sócio do clube. Meu pai tinha uma fábrica de camisas e eu tinha uma metalúrgica antes de trabalhar com futebol. Comecei como empresário em 1970, mas antes eu já tinha bastante contato com o futebol, inclusive tendo atuado como diretor das divisões de base do Penãrol. Não tenho outro time além do Peñarol, sou fiel. Um homem troca de mulher, de partido, mas não troca de time. 

R7 - Qual o melhor jogador de todos os tempos?

Figer - Pelé é o melhor. Em seguida vêm Maradona, Di Stéfano, Cruyff, Schiaffino, Zico e Platini.

R7 - Messi ou Maradona?

Figer - Acho Maradona melhor porque do ponto de vista individual ele era superior. Messi é excelente, mas é um jogador mais de connjunto.

R7 - O sr. foi agente de Maradona. Como foi trabalhar com ele?

Figer - Foi muito bom. Eu levei o Maradona do Barcelona para o Napoli, um time que tinha muito apelo no Sul da Itália, folclórico. Não dava mais o Maradona ficar no Barcelona, ele já começava a ter uma vida um tanto desregrada, com saídas à noite. Se não fosse o Maradona, eu iria levar o Sócrates para o Napoli. Depois o levei para a Fiorentina. Conheço o Maradona desde que ele tinha 14 anos. E já dava para ter a ideia de que seria um grande do futebol. Ainda mantenho contato com ele, não diário, mas tenho muito carinho por ele. O Maradona é muito boa pessoa. Totalmente diferente do que a imprensa brasileira mostra.

R7 - Por que o sr. continua morando em São Paulo?

Figer - Me acostumei com a cidade. Mesmo assim sinto falta da água. Agora ainda mais (risos). Nasci em Montevidéu, próximo das águas e vou anualmente a Punta del Este, onde fico entre novembro e março. Aqui costumo a ir a restaurantes, já que a diversão do paulista definitivamente não é a praia.

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