Logo R7.com
Logo do PlayPlus
Publicidade

Vaidade contribuiu muito, mas não explica sozinha o fracasso de Carille

Técnico não foi capaz de propor saídas quando time precisou e tropeçou feio ao se isentar e culpar só o elenco por sete jogos sem vitória. Aí veio o oitavo...

Futebol|Eduardo Marini, do R7

No Corinthians se diz que Carille 'esqueceu a humildade da Arábia Saudita'
No Corinthians se diz que Carille 'esqueceu a humildade da Arábia Saudita' No Corinthians se diz que Carille 'esqueceu a humildade da Arábia Saudita'

Uma das frases mais ditas e ouvidas na última semana, no CT do Corinthians e no Parque São Jorge, foi a de que o técnico Fábio Carille “esqueceu a humildade na Arábia Saudita”.

A afirmação é forte, com algum tempero de maldade, traz algo de verdade, mas está longe de abrigar todas as justificativas para a demissão do técnico.

Após ter sido bicampeão paulista e campeão brasileiro em 2017, à frente do Timão, Carille despediu-se do clube na metade de 2018 para treinar o Al-Wehda, da Arábia Saudita. Seis meses depois, exigido pelos torcedores, voltou como salvador, com musiquinha, festa no aeroporto, berros de “o professor voltou” e outros apetrechos de mimo.

Leia também

Em 2017, o time considerado ideal por Carille era: Cássio, Fagner, Balbuena, Pablo e Guilherme Arana; Gabriel e Maycon; Jadson, Rodriguinho e Romero; Jô.

Publicidade

Tempos em que Cássio era o ótimo Cássio de sempre, Fagner estava em sua melhor fase e a dupla Balbuena e Pablo funcionava como um paredão na zaga. Arana, Gabriel e Maycon estavam bem. Na frente, Jadson e Rodriguinho voavam baixo. E Jô, bem condicionado fisicamente, livre de baladas e biritas, fazia gol de tudo quanto é jeito – inclusive de mão.

O ótimo desempenho de quase todos no elenco desobrigava Carille de propor caminhos táticos elaborados e soluções para recuperar jogadores em má fase. A proposta tática era até primária, simplória: manter a casinha fechada a todo custo e tomar o mínimo possível de gols, porque em algum momento Rodriguinho, Jadson ou Jô farão algo e nos salvarão a vitória virá, nem que seja de ‘meio ou um quarto a zero’. E assim foi. Uma estratégia simples, mas suficiente para fazer cada atleta render bem em sua vocação e, com isso, turbinar o conjunto da equipe. Mérito dele.

Publicidade

Na volta, com ares de ídolo, apesar dos apertos financeiros do Corinthians, Carille pediu e recebeu alguns bons jogadores, entre eles o ótimo zagueiro Gil, o meia Júnior Urso e o atacante argentino Mauro Boselli.

O problema foi que grande parte dos destaques de 2017 foi embora. Não bastasse, os que ficaram caíram de produção e os novos contratados, à exceção de Gil, renderam bem abaixo do esperado. Resultado: a defesa, último guardião de regularidade, perdeu eficiência, o ataque continuou de mal com o gol adversário, as derrotas e empates se acumularam e o time passou a ver, impotente, a ultrapassagem de rivais na tabela do Brasileirão

Publicidade

Ao contrário de 2017, o Corinthians versão 2019 exigiu de Carille criatividade e recurso na geração de soluções táticas para dar nova vida ao ataque, estabelecer um futebol mais corajoso e fazer reaparecer o futebol de alguns comandados (como fazem hoje Jorge Jesus, Sampaoli e Renato, para citar três exemplos locais).

A criatividade e o recurso jamais apareceram, no entanto. Tudo do que o técnico fez, tentou fazer ou disse ter feito mostrou-se inútil para reverter a perda de consistência e o ganho de apatia do time. O boleto chegou pesado: sete jogos sem vitória e o sapeca de 4 a 1 do Flamengo no domingo (3), no Maracanã.

Bruno Henrique despachou o Corinthians e Carille com três gols em 4:05 minutos
Bruno Henrique despachou o Corinthians e Carille com três gols em 4:05 minutos Bruno Henrique despachou o Corinthians e Carille com três gols em 4:05 minutos

Em vez de assumir a ineficácia de suas tentativas, ainda que diante apenas do presidente Andrés Sanchez e do elenco, estabelecendo um pacto de cumplicidade e recuperação com os boleiros, no estilo ‘vamu lá pessoal’, Carille optou por dar uma entrevista desastrosa para sua relação com o elenco na sexta-feira (1º), ainda antes do atropelamento rubro-negro.

"Vergonha. Não preciso olhar como torcedor. Tenho que olhar como comissão e ser ciente daquilo. Vergonhoso. Não parece um time treinado, parece que se junta no vestiário e vai para o jogo. Você passa informações e depois está na beira do campo e isso não é feito. Não está faltando raça, mas tecnicamente a gente tem que ser melhor", disse o técnico.

Ou seja: se “não parece um time treinado” e “você passa informações” e em campo “isso não é feito”, então o “você” – ou seja, ele próprio, Carille – está isento de qualquer responsabilidade e a culpa pelos sete resultados ruins é toda do elenco, que não cumpria o combinado. Bom, aí veio o oitavo resultado negativo. E como veio...

As declarações caíram como um torpedo sobre jogadores, funcionários e cartolas do clube. Ninguém por lá concordou. Mais do que mera vaidade ou arrogância, faltou a Carille, ao menos nesse episódio, frieza pessoal e sensibilidade profissional na reação pública a ser dada em um momento de crise no grupo que comandava, num clube que, como se sabe, mobiliza milhões sempre com a paixão levada ao extremo.

A rigor, Sanchez e boa parte da diretoria corintiana estavam insatisfeitos com Carille antes mesmo dele lavar as mãos na fatídica entrevista. Os cartolas negam publicamente, mas sabe-se que técnico resistiu até domingo (3) em grande parte por causa multa a ser paga pelo clube se optasse pela demissão, hoje de R$ 3,6 milhões.

O presidente considerava a opção de segurar o técnico ao menos até o final do ano, mesmo porque tinha na ponta da língua a justificativa para a torcida caso lhe colocassem na parede por uma saída antes disso: ‘vocês exigiram a contratação, nós a fizemos e ele foi recebido por vocês como um ídolo; agora aguentem’.

Mas, com o estrago feito no elenco com a entrevista e a pancada no Maraca, não houve como segurar. Carille estava certo em não se demitir. Se “pagou do próprio bolso” a multa rescisória em sua saída para a Arábia Saudita, como afirma ter feito, nada mais justo do que receber agora o previsto em contrato.

Para entrar no time dos grandes técnicos, Carille ainda precisa provar que sua capacidade e o sucesso obtido em 2017 não se devem majoritariamente a circunstâncias positivas restritas ao ambiente do Corinthians, do qual é prata da casa como treinador.

Ele tem valor e condição de evoluir para se tornar mais completo no futuro – mas é ainda concretamente menor do que a vaidade, o amadurecimento profissional e até o currículo sugerem.

Rivais provocam corintiano Cássio: 'Saiu para não tomar mais gols'

Últimas

Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.