Jô provocou mistura de reações na própria torcida corintiana no Morumbi
Adriano Vizoni/FolhapressAmor pelo time do coração, vontade de conhecer um estádio, fazer companhia para a noiva, sentir a adrenalina do perigo iminente... Tesão. Muitos são os motivos pelos quais torcedores se infiltram na torcida adversária para acompanhar, sobretudo, um clássico no Estado de São Paulo. O histórico de violência nas arquibancadas fez com que um corintiano inclusive xingasse o atacante Jô, depois do gol de empate contra o São Paulo, ainda na fase de grupos do Campeonato Paulista deste ano.
São-paulinos descumprem norma e se infiltram entre palmeirenses
Desde abril do ano passado, no dia seguinte à morte de uma pessoa antes de um Corinthians e Palmeiras, os clássicos paulistas são disputados apenas com a torcida dos donos da casa. A medida foi anunciada pela Secretaria de Segurança Pública do Estado, após recomendação do Ministério Público Estadual e ofício enviado à Federação Paulista de Futebol. Inicialmente com validade até o fim de 2016, a norma foi renovada no início deste ano. Aos poucos, como uma espécie de voto de confiança às torcidas organizadas, um acordo com o 2º Batalhão de Choque liberou instrumentos musicais, bandeirões e faixas.
Isso para os torcedores “organizados”. Entre os torcedores “comuns”, a identificação é mais complicada e não há como proibir a entrada. Como não há o setor específico destinado aos visitantes, o jeito é tentar se misturar aos anfitriões e aí começam os desafios. A estratégia deles é sempre a mesma. Vão ao estádio com uma roupa neutra, que não tenha cores alusivas ao time rival, mas também não demonstre sua equipe de origem. Assim que o árbitro apita o início do jogo, a postura é de quem fosse ao cinema assistir à sessão da tarde. Mas logo a paixão fala mais alto.
“O grande tesão foi ver o Corinthians marcar um gol no Morumbi e aí eu tive que disfarçar bem, me controlar bastante. Um torcedor já tinha achado que eu era corintiano, começou a ficar de olho em mim e, quando saiu o gol, comecei a xingar o Jô. Esse mesmo cara já tinha me chamado de ‘corintiano filho da p...’", contou R.O., de 28 anos. “A sensação é de muita adrenalina. Muita mesmo. A gente sabe como é o futebol brasileiro e você ir infiltrado é uma loucura.”
Apesar das repetidas instruções dos amigos e familiares desde quando sai de casa, o roteiro de cinema às vezes não permite aos mais apaixonados ficarem apáticos. É aí que a situação pode fugir de controle e a racionalidade ficar de lado. Mesmo experientes em torcida infiltrada dizem que nem sempre o controle está com você. A comemoração de um gol acontece por instinto. É como se ao longo dos anos seu corpo fosse treinado para repetir aquele gesto no estádio ou em casa.
“Já fui em quatro clássicos infiltrado, dois contra o Palmeiras e dois contra o São Paulo. Já fui no meio da Independente e no Allianz Parque porque queria conhecer o estádio com minha noiva palmeirense”, afirmou o corintiano R.S., de 30 anos. “Quando fui infiltrado na torcida do São Paulo, há uns oito anos, quase apanhei. Não me contive, levantei, dei uma comemorada e sai correndo para o banheiro me esconder. Aí fui para outra área do estádio e me misturei em outra parte da torcida. Hoje, comemoro do meu jeito, dando soco na perna e por aí vai.”
Seja por uma questão cultural ou mesmo falta de motivação para brigar, nem tudo está perdido em setores mistos. A experiência de Grêmio e Internacional, tanto na Arena quanto no Beira-Rio, é a mais bem sucedida no País. No Gre-nal 412, pelo Campeonato Gaúcho, na casa do Tricolor, o setor de cadeiras gold sul e camarotes contava com 2,2 mil lugares. Os não vinculados ao programa de sócio-torcedor precisavam assinar um termo de responsabilidade no ato da compra.
Mas não é só o desafio que motiva esses torcedores. Com a popularização dos programas de sócios, é comum que pessoas tenham que ir aos jogos apenas para manter a frequência em seu cadastro e assim ter direito à gratuidade mesmo em partidas mais concorridas. Por isso, muitos também emprestam suas carteirinhas de sócios, que raríssimas vezes são conferidas na catraca.
“Um amigo meu palmeirense não podia ir ao jogo contra o São Paulo, mas não queria perder o rating do sócio-torcedor, aí me deu o ingresso. Era um setor com muita família. Não tinha perigo”, disse V.M., de 25 anos. “Faria de novo, sim, mas do mesmo jeito. Sem abrir a boca, ficando no lugar quieto. Mas é muito ruim você não torcer e nem se expressar direito.”
*colaborou André Ruoco, do R7
EsportesR7 no YouTube. Inscreva-se