São Paulo, Brasil
"Cala a boca, negro."
A acusação de Gerson de racismo praticado pelo colombiano Ramírez teve consequências graves.
O afastamento do jogador do elenco do Bahia, com a possibilidade real de rescisão de contrato.
Foi a gota d'água para a demissão do decadente Mano Menezes, que comparou a acusação à malandragem.
Mas também trouxe luz ao excelente jogador de 23 anos.
E que estaria enfrentando problema grave na carreira.
Um boicote na Seleção Brasileira.
Não relacionado a sua raça, sua cor.
Mas por ter tido a coragem de expor seu esgotamento físico e psicológico e recusado convocação para disputar o pré-Olímpico, em dezembro de 2019.
O treinador André Jardine mandou um auxiliar procurar o jogador do Flamengo e perguntou se ele disputaria o torneio. Gerson foi sincero.
Como havia se transferido da Fiorentina para o Flamengo em julho de 2019, estava há um ano sem férias. E com a vitória do clube na Libertadores, houve o Mundial. O atleta estava esgotado, querendo descansar, justamente quando o Pré-Olímpico seria disputado.
Não aceitou a chamada.
Sua sinceridade repercutiu na cúpula da CBF.
O coordenador Juninho Paulista deixou escapar a possibilidade de um boicote, em futuras convocações. Gerson poderia 'ser esquecido'.
"Tem que saber os momentos, né? Eu acho que tudo é levado em conta, não só o aspecto técnico. A gente olha todo o aspecto, o técnico é o principal, mas tem comprometimento, disponibilidade e foco. Tudo isso a gente leva em consideração", disse Juninho, perguntado se a recusa de Gerson poderia prejudicá-lo no futuro.
E desde então, mesmo jogando muito bem, o meio-campista do Flamengo não fez parte de nenhuma convocação de Tite.
No Flamengo sempre houve muito estranhamento.
E a tese de boicote prevalece na imprensa carioca.
Everton Ribeiro, Gabigol, Bruno Henrique, Pedro, Rodrigo Caio tiveram chances neste ano com Tite.
Gerson, por coincidência ou não, acabou sendo deixado de lado.
Constrangido, Tite não teve como escapar do tema 'boicote' no Sportv, canal a cabo da Globo, que sempre dá guarida ao treinador da Seleção.
"Não houve qualquer tipo de punição ao Gerson. Minha palavra que não teve nada disso. Sei que houve esse fato sobre o pedido dele para não jogar pela seleção de base.
"Sempre esteve no nosso acompanhamento. Existe uma concorrência na posição. Em alguma circunstância que se escolhe um e não leva o outro. Mas esse aspecto disciplinar não tem", garantiu o treinador.
Perguntado sobre se estaria sendo 'prejudicado' nas convocações, por não ter aceitado disputar o pré-olímpico, Gerson foi cauteloso. Fugiu às suas características de jogador que assume suas questões. Deixou claro que sabia que suas palavras poderiam trazer represálias.
"É meu sonho e objetivo estar na Seleção Brasileira. Tenho certeza que no momento certo terei minha oportunidade e, quando tiver, vou procurar agarrar com unhas e dentes. Quanto à pergunta, o assunto foi conduzido, todo ele, pelo meu pai em conjunto com o Flamengo.
"Recebi um contato da comissão técnica da seleção olímpica, perto da nossa viagem para a disputa do Mundial, e a única coisa que fiz foi passar para o meu pai, que é o responsável por conduzir tudo isso com o Flamengo. Acredito que tudo foi tratado com transparência por todas as partes", respondeu o meio-campista, ao ge, em julho.
Não adiantou nada todo esse cuidado.
Gerson seguiu sendo um nome desprezado pela Seleção.
Não foi chamado para nenhuma partida, nem para reserva.
Contra o racismo, ele pôde se rebelar.
Pela estranha ausência da Seleção, não.
Esse é o futebol brasileiro...
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