Edmundo. Não há como punir o comentarista por acidente com três mortes
Reprodução Fox SportsSilêncio na Fox Sports.
A determinação é que ninguém deve citar o comentário que o ministro do Supremo Tribunal Federal, Roberto Barroso fez ontem, no julgamento do habeas corpus solicitado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Foi uma tentativa frustrada para impedir uma eventual prisão após o fim dos recursos na segunda instância da Justiça Federal.
O julgamento que durou onze horas deixou o ex-presidente Lula à disposição da Justiça. Cabe ao juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara de Curitiba determinar a prisão. E ele terá de começar a cumprir a pena de 12 anos e um mês, por ter recebido um apartamento triplex como propina.
Mas Barroso foi firme no seu depoimento. Autorizou a prisão imediata de Lula. Ele se mostrava profundamente irritado pela impunidade que domina este país em todas as instâncias.
E fez questão de usar Edmundo como exemplo.
“O caso do jogador de futebol, em dezembro de 1995, um conhecido jogador de futebol, saindo da balada, embriagado, dirigindo seu carro importado, provocou o acidente e a morte de três pessoas. Foi condenado em outubro de 99 a uma pena de quatro anos e meio deprisão. Homicídio culposo, pena relativamente modesta pela morte de três pessoas."
“Seus advogados entraram com nada menos do que 21 recursos apenas no STJ. E outros tantos no supremo. Em 2011, o ministro Joaquim Barbosa declarou a prescrição da pena. O caso até voltou pra mim, não concordei e a questão aguarda pauta para plenário. Mas as famílias das três vítimas podem assistir sem grande dificuldade pela televisão o jogador fazendo os comentários nos jogos de futebol. Portanto, além da perda, tem que conviver com o sofrimento da mais absoluta impunidade."
O ministro não poderia ser direto.
A indignação do ministro Barroso não tem efeito prático. Edmundo segue livre
Divulgação STJO ex-jogador se envolveu em um gravíssimo acidente na madrugada do dia 3 de dezembro de 1995.
Este é um raro ponto de vista do jogador, dado em entrevista à revista Isto É, em agosto de 2011.
"Fomos a uma choperia onde, eu juro, não bebi nada. Até tomava alguma coisa na balada para ficar com coragem de chegar em uma garota, mas bebida nunca foi o meu forte.
"Depois paramos num bar, onde tomei um chope e uma água. Quando eu estava indo para uma boate com um amigo, acabei dando carona para duas meninas.
"E foi nesse percurso que houve o acidente. Talvez por eu estar conversando, distraído, não vi que um carro entrou na minha frente em uma curva acentuada. E aí capotamos, causando a morte de duas pessoas que estavam em outro carro e de uma menina que estava conosco. Não quero fazer acusações, e sim me defender, mas ninguém falou que o menino que morreu não tinha carteira de motorista, por exemplo.
"Minha vida mudou radicalmente. Passei a ser uma pessoa melhor, a ter outros valores. Sofri muito com a dor das famílias dos envolvidos, mas graças a Deus todo mundo entendeu que foi uma fatalidade. Tentei fazer tudo o que estava ao meu alcance. Paguei indenizações absurdamente altas, e esse dinheiro nunca me fez falta."
Edmundo ficou um dia preso, no dia 16 de junho de 2011, juiz Carlos Eduardo Carvalho de Figueiredo, da Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro, expediu o mandado de prisão. Mas o advogado do jogador conseguiu sua liberação.
"Eu estava na minha casa, esperando que o meu advogado conseguisse uma liminar. Aí os policiais chegaram, fui encaminhado à delegacia e fiz todos os procedimentos necessários. Mas gostaria de dizer que fui tratado de forma diferente. Minha pena é de prisão semiaberta e a polícia não poderia vir à minha casa no meio da noite.
"Meu advogado é muito competente e deixo o caso nas mãos dele. Digo sem receio: cumpro a pena no semiaberto sem problemas, desde que a lei seja respeitada. Estou pronto para isso. Não tenho medo. Aceito a pena, mas só se for o justo, se ela for aplicada a todos na mesma situação que eu", disse, na mesma entrevista.
Joaquim Barbosa foi quem teve de anunciar a prescrição da pena de Edmundo
Divulgação STJEdmundo vivia em agonia, em 2011. Trabalhando como comentarista da Bandeirantes, esperava ser preso. Não acreditava que juiz algum assumiria a prescrição da pena. Os 21 recursos que sua defesa conseguiu foram os responsáveis pelo seguidos adiamentos da pena de quatro anos e meio de regime semiaberto.
"A prescrição do crime é um direito constitucional. O problema é quem vai assinar essa prescrição. O juiz que me condenou pela primeira vez disse para o meu advogado que chegou à pena depois de ler uma nota na coluna do Ancelmo Gois (no jornal "O Globo"). Ela dizia que o Eurico (Miranda, ex-presidente do Vasco) tinha pago US$ 1 milhão para me livrar. Isso não é verdade, faço questão de dizer. Aí o juiz ficou naquela situação.
"Eu estava pronto para pegar a pena máxima, que poderia ser revertida em cestas básicas. Foi isso que aconteceu, mas fui condenado com agravantes, algo que não é aplicado em acidentes de trânsito, em casos de homicídio doloso. Eu era réu primário, sem antecedentes, e tudo poderia ter sido encerrado há 15 anos. O caso foi a Brasília e voltou para o Rio de Janeiro, onde ninguém assina a prescrição. Agora, tudo volta e meus filhos sofrem."
Só que no dia 11 de setembro de 2011, no site oficial do Superior Tribunal Federal, o ministro Joaquim Barbosa determinou extinta a pena. Os advogados do jogadore conseguiram que ela prescrevesse, ou seja, levasse tanto tempo para ser cumprida que a sentenção não valia mais.
Vale recordar palavra por palavra do que foi publicado.
"O ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal (STF), declarou extinta a punibilidade do ex-jogador de futebol Edmundo Alves de Souza Neto, em decorrência da prescrição do crime pelo qual respondia. Em 1999, ele foi condenado por homicídio e lesão corporal após se envolver em acidente de trânsito que resultou na morte de três pessoas e três feridos.
A decisão ocorreu no recurso interposto pela defesa do ex-jogador (Agravo de Instrumento 794971) contra a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que fixou a pena em quatro anos e seis meses de detenção a ser cumprido em regime semiaberto. A pena inicial era de três anos, mas foi acrescida da metade (18 meses) em razão de a condenação ter sido por mais de um crime (homicídio e lesão corporal).
Ao analisar o caso, o ministro Joaquim Barbosa destacou que, para a hipótese de prescrição, a regra determina que seja observada a pena aplicada isoladamente, ou seja, desconsiderando-se o aumento referente ao concurso de crimes. Esta regra está prevista no Código Penal (artigo 110, parágrafo 1º; e artigo 119) e na Súmula 497 do Supremo.
Assim, de acordo com a decisão, se aplica ao caso do ex-jogador o artigo 109, inciso IV, do Código Penal, segundo o qual a pena fixada entre dois e quatro anos prescreve dentro do prazo de oito anos.
A contagem desses oito anos, de acordo com o ministro, deve ser feita a partir da publicação definitiva do acórdão do TJ-RJ sobre a condenação, que ocorreu no dia 26 de outubro de 1999. Dessa forma, a prescrição ocorreu no dia 25 de outubro de 2007, antes mesmo da data em que esse recurso chegou ao STF, o que aconteceu em abril de 2010.
“Deu-se assim, a extinção da punibilidade do agravante, no que se refere aos delitos em questão, pela prescrição intercorrente ou superveniente, por já se ter consumado o lapso prescricional acima mencionado."
Ou seja, a justiça brasileira tinha oito anos para punir Edmundo.
Não foi tempo suficiente.
E depois de 16 anos, ela foi oficialmente exinta.
O que o ministro Roberto Barroso fez ontem foi mostrar sua indignação com o que aconteceu envolvendo Edmundo. Ele participou do processo e foi contra a extinção da pena.
Ele desabafou, mostrou indignidade.
Mas, 23 anos depois do acidente, o caso está encerrado.
Pode servir como exemplo de impunidade.
Mas não há maneira legal de ser revertido.
Edmundo não será preso.
O departamento jurídico da Fox Sports sabe disso.
Assim como o agora comentarista.
Por isso, a opção pelo silêncio.
Não há porque repercutir o ataque de Barroso.
Na prática, foi um mero desafavo de um juiz indignado.
Edmundo seguirá livre...
As três mortes custaram 18 horas na cadeia.
Graças aos 21 recursos dos advogados que pôde pagar...
O acidente de Edmundo deixou três mortos. Ele assumiu ter bebido
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