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O Jornalismo, a Internet, os memes, o cai-cai de Neymar, as "fake news"

Como se transformou a missão de pesquisar e de colher informações, e como a tecnologia auxiliou a Mídia mas também criou um ritual de inutilidades

Silvio Lancellotti|Do R7

Um dos memes sobre Neymar: a sua "rotina de exercícios"
Um dos memes sobre Neymar: a sua "rotina de exercícios" Um dos memes sobre Neymar: a sua "rotina de exercícios"

Na cobertura da Copa do México/70 eu redigia os meus textos em máquinas pesadíssimas ou, até, diretamente nos chamados telex/teletipos, que faziam as transcrições em longas fitas perfuradas que outras máquinas depois remetiam via linha telefônica ou via satélite. Necessitava empacotar as pontas dos dedos com esparadrapo ou mesmo fita adesiva para que as minhas unhas não se descolassem. Conheci os elencos inscritos na competição, então dezesseis, através de um precário bloco de folhas mal mimeografadas.

Um telex/teletipo dos anos 70, com a fitinha perfurada
Um telex/teletipo dos anos 70, com a fitinha perfurada Um telex/teletipo dos anos 70, com a fitinha perfurada

Quando comecei a fazer os meus comentários do Calcio, na década de 80, necessitava assinar diários e semanários italianos que me custavam uma fortuna e que demoravam uma semana até chegar – isso, quando chegavam. Daí, na Copa de 90, um tiquinho mais moderna, eu podia escrever num micro do centro de imprensa de Roma, imprimia os textos e entregava a alguém do atendimento que enviava ao meu jornal por fax. Nos EUA/94 eu já dispunha de um celular transcontinental e de um laptop que colocava aqui no Brasil, imediatamente, cada artigo que eu perpetrava. Bastava teclar “Enter”. Não foi só a Mídia, porém, que se beneficiou da tecnologia. Também se favoreceu o fã que, agora, teoricamente sabe de tudo pelas “Redes Sociais”.

A recepção do Centro de Mídia de Dallas, na Copa de 94
A recepção do Centro de Mídia de Dallas, na Copa de 94 A recepção do Centro de Mídia de Dallas, na Copa de 94

De fato, não ocorressem a multiplicação e a disseminação, absurdas, das possibilidades da comunicação instantânea, até por um telefoninho de mão, e Neymar, o ex-garoto de ouro do Brasil, aquele que ama ter o nome escoltado pelo Jr. na sua camisa, talvez não desabasse do seu pedestal de ídolo autoimposto e não se transformasse num objeto da ironia universal meros minutos depois da eliminação da sua seleção na Copa da Rússia/2018. Até Philippe Close, o Prefeito de Bruxelas, na Bélgica, zoou o brasileiro em seu tweeter, Choca, impressiona e entristece testemunhar de como tanta fama é capaz de se inverter, num lampejo, a ponto de eu, sinceramente, temer que Neymar demore a recuperar o seu prestígio e a alegria com o Futebol.

O "Manneken Pis" de Bruxelas e Neymar, segundo o Prefeito da cidade
O "Manneken Pis" de Bruxelas e Neymar, segundo o Prefeito da cidade O "Manneken Pis" de Bruxelas e Neymar, segundo o Prefeito da cidade

Existe, no entanto, um outro lado nesse mundo virtual. Um lado excelente, precioso, Aquele que permite a um curioso saudável, o pesquisador correto de informações e também o seu divulgador irrepreensível, alinhavar fatos de interesse efetivamente coletivo. Fiquemos, apenas, nas duas nações finalistas da Copa. Quem saberia que, dos 23 convocados de Didier Deschamps, apenas quatro não são franceses naturalizados ou descendentes de imigrantes? E quem saberia, igualmente, que dos 23 pupilos de Zlatko Dalic só dois, e reservas, o arqueiro Livakovic e o volante Bradaric, jogam em times da Croácia e não recebem uma robusta dinheirama no Exterior?

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Deschamps e um dos seus filhos de imigrantes
Deschamps e um dos seus filhos de imigrantes Deschamps e um dos seus filhos de imigrantes

Da mesma forma, em relação às nações que brigam pelo consolo do bronze, o terceiro lugar. Sem o espalhamento de acessos que a Web propiciou, talvez até mesmo eu, um fanático pela investigação precisa, não atestasse com toda exatidão que, dentre os 23 rapazes de Roberto Martínez, treinador espanhol da Bélgica, dez (Batshuayi, Carrasco, Chadli, Dembelé, Fellaini, Januzaj, Kompany, Lukaku, Tielemans, Witsel) são imigrantes ou filhos de imigrantes do Congo, Marrocos, de Mali, da Martinica, de Portugal, de Kosovo e da Sérvia. E que todos os 23 comandados de Gareth Southgate jogam na Inglaterra.

Witsel e Lukaku, dois dos filhos de imigrantes da Bélgica
Witsel e Lukaku, dois dos filhos de imigrantes da Bélgica Witsel e Lukaku, dois dos filhos de imigrantes da Bélgica

Saiba quem me lê, porém, que a Internet não deve ser a única fonte de pesquisa e de investigação. E eu não me refiro meramente à proliferação abominável das tais "fake news". Abominável e criminosa. Na verdade, ao repórter nada vale tanto como o pé na rua, como o papo pessoal, como a extração, às vezes pelo saca-rolhas, de um dado que se esconde ou se camufla atrás do mistério. Afirmo isso porque me intrigou o fato de todos os 23 atletas dos “Três Leões” se aferrarem aos clubes da sua terra.

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Southgate e alguns dos seus pupilos fiéis à Premier League
Southgate e alguns dos seus pupilos fiéis à Premier League Southgate e alguns dos seus pupilos fiéis à Premier League

Patriotismo? Medo de perseguidores xenofóbicos? Bem, nada como uma clássica ligação a um colega de Londres para, numa longa troca de ideias, montar uma conclusão. Existe uma peculiaridade romântica na questão. O jovem craque britânico, quando viaja, por exemplo, em função da Champions League, não vê o momento de retornar ao seu pedaço, à comida familiar, à poltrona da sua casa, ao aconchego da própria cama. Paralelamente, porém, ele sabe que disputa os certames mais ricos do planeta, que os seus clubes são bem mais valorizados do que a imensa maioria dos rivais da Europa, à exceção de Barcelona, de Real Madrid, Bayern, PSV e Juventus. Sim, são cinco os times britânicos entre os dez primeiros do Velho Continente.

Uma imagem de divulgação da Premier League
Uma imagem de divulgação da Premier League Uma imagem de divulgação da Premier League

O jovem craque britânico tem inclusive mais mercado em suas plagas do que fora. A Premier League é, fartamente, muito mais abastada do que a ibérica, a tedesca, a gaulesa e a peninsular. Para esta temporada de 2018/19, montarão ao equivalente de R$ 10 bi as suas cotas de TV. Até 2021 os clubes de Sua Majestade auferirão uma renda anual de cerca de R$ 7 bi. Além de quase R$ 1,5 bi de patrocínios. E eis um belo segredo que o meu amigo me contou: caso um empresário qualquer ouse roubar um astro da Premier League, um fundo informal, estruturado com verbas da federação, dos investidores e dos patrocínios, se apressa a cobrir a oferenda. Até os adversários contribuem. Claro, sabem que, um dia, necessitarão de uma ajuda assemelhada.

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Pena que dificilmente tal conceito possa funcionar por aqui.

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