Em 2014, a paixão pelo futebol ultrapassou as barreiras da vida de Ana Paula Santos, jovem, moradora da zona leste, apaixonada por futebol e pelos Estados Unidos. Ela teve a oportunidade de jogar com atletas americanos pelo programa Estrelas do Futebol, iniciativa do consulado americano em parceria com o Sesc. Três anos depois, as barreiras deixaram de existir. Ana Paula é a mais nova atleta da universidade do Mississipi, nos Estados Unidos. Ela e a colega Thayla Grigorio, com quem conviveu durante os quatro anos do programa, estão no elenco do time universitário de duas grandes faculdades americanas.
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Ao conversar com o R7, a jovem de 19 anos não conseguiu conter a emoção: “É um mix de sentimentos: me sinto realizada, feliz, às vezes triste por ter que me separar da minha família. Sinto medo, já que agora estarei sozinha. Mas é meu sonho sendo realizado”.
Ana Paula e Thayla têm histórias diferentes, que se cruzaram em algum momento da vida: a distância entre os bairros onde vivem, São Mateus e Guaianazes, e o cotidiano dentro de casa não anulavam a sensação de abandono causada pelo machismo em todos os lugares em que tentavam jogar futebol. “No bairro, na escola, na rua... Sempre que eu tentava jogar com os meninos, era ignorada. Quando finalmente consegui um lugar no time, quem estava ao meu redor não se conformava e permanecia me insultando”, contou Ana Paula. “Isso quando não começavam a questionar minha sexualidade”, concluiu.
Para Thayla, a experiência de ser mulher e jogar futebol durante a infância também foi difícil: “Eu sempre joguei com os meninos na escola. Mas certa vez, teve um campeonato interclasses e meus colegas toparam que eu participasse. Quando saiu a lista do time, meu nome não estava lá. O professor havia tirado, e disse que, como eu era mulher, eu poderia me machucar. Como consolo, ele me colocou como mesária para que eu ficasse feliz”, disse. “E isso é pouco: da arquibancada, a gente sempre tem que ouvir gritos como “E a louça?”, “Lugar de mulher é no fogão”, completou.
A cultura enraizada do machismo foi um dos motivos que fizeram as jovens escolherem os Estados Unidos como porta de fuga: “Dizem que o Brasil é o país do futebol, mas é o país do futebol só para os homens. Nós, mulheres, não temos o mesmo espaço aqui. E lá é diferente: o time americano tem estrutura, é valorizado. As meninas desde pequenas frequentam escolinha de futebol. Lá, o esporte é para todos”, afirmou Ana Paula.
Projeto e inspirações
Durante os dois anos do projeto Estrelas do Futebol, as atletas passam por etapas: além de jogarem futebol, fazem aulas de inglês e de liderança. “Não foi de uma hora para outra que conquistamos isso”, disse Thayla. “Nossas famílias não têm condições financeiras para bancar uma faculdade lá fora, e a gente vai conseguir fazer isso jogando futebol. É um sonho poder conciliar essas duas vidas”.
Para Ana Paula, a inspiração na seleção americana é a atacante Alex Morgan: "Quando comecei a pesquisar o futebol americano, me apaixonei por ela. É uma atleta maravilhosa e uma pessoa incrível, que ajuda o próximo. Ela faz o que eu quero fazer um dia: não ser apenas atleta, mas ajudar meninas com sonhos em relação ao futebol".
Ana Paula embarca para os Estados Unidos no próximo dia 1º. Thayla viaja no dia 7 de agosto.